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Um hino à juventude e à alegria …

No momento em que o avião da TAP “Gonçalo Velho Cabral” prepara a sua partida do aeroporto Figo Maduro para levar de volta a Roma o Papa Francisco, penso cá para mim que, se me fosse possível soltar o Génio da Lâmpada de Aladino e este me concedesse a realização dum desejo, escolhia voltar a ser jovem durante um ano, tempo suficiente para me permitir participar na Jornada Mundial da Juventude 2023 que acaba de terminar, integrando o grupo de mais de 25.000 jovens voluntários, nacionais e internacionais, que ajudaram a pôr de pé e organizar o maior evento algum dia realizado em Portugal. Estaria lá na condição de peregrino à procura de um novo alento para a minha espiritualidade, sob a égide do Papa Francisco, o primeiro jesuíta a ocupar o lugar supremo da Igreja Católica, um missionário militante que faz dos mais desfavorecidos a sua bandeira, numa Igreja onde ninguém é excluído, mas também como jovem nesse encontro único de jovens de todo o mundo.  

Hoje invejo os jovens de agora por esta enorme oportunidade que a minha geração nunca teve, nem de perto nem de longe, de encontrar outros seres de todos os cantos do mundo no mesmo local, unidos no mesmo espírito de confraternização, para celebrar e aprender sobre a fé católica, construir pontes de amizade e esperança entre culturas e povos de continentes diferentes, mas imbuídos de espírito comum na procura de um mundo melhor.

A Jornada Mundial da Juventude (JMJ) foi instituída pelo Papa João Paulo II em 1985, ele que dizia: “A esperança de um mundo melhor está numa juventude sadia, com valores, responsável e, sobre tudo, voltada para Deus e para o próximo”. A primeira Jornada aconteceu em Roma e a realizada em Manila, nas Filipinas, foi a que reuniu o maior número de peregrinos com cerca de 4 milhões. Foi no Panamá que o Papa Francisco anunciou Lisboa como a cidade escolhida para a realização da Jornada que acaba de findar. Nunca houve em Portugal nenhum acontecimento desta envergadura e é certo que não voltará a acontecer em terras lusas durante o resto da minha “estadia” cá por este mundo.

A JMJ de maior visibilidade foi feita nas grandes concentrações dos peregrinos, em Lisboa, com a presença do Papa Francisco, o grande líder e mobilizador desta enorme multidão de jovens vindos de mais de cento e cinquenta países, do Norte ao Sul, do Oriente ao Ocidente, para quem o primeiro objetivo era ver, e se possível tocar as vestes do Papa Francisco, até porque ele é hoje o único líder global com uma grande dimensão ética e moral. O seu pontificado é marcado pela luta por uma vida melhor para o outro, o próximo e o distante, a luta pelas pessoas e as suas vidas nas suas violências, injustiças, fragilidades e incapacidades de assumir o seu destino e os seus sonhos, na missão de dar mais esperança, justiça e mais vida a quem vive no desespero. Por isso ele fala dos migrantes que arriscam a vida no “mar da morte”, por uma vida. E fala de exploração que mata. E luta pela paz, indo a sítios como o Sudão do Sul onde chegou ao ponto de beijar os pés dos “fazedores da guerra”, em nome da paz. E fala da urgência de proteger o planeta, de combater as desigualdades, da diversidade sexual e das mulheres na Igreja. Como dizia Miguel Romão, “a grande virtude de Francisco não é ser Papa, é ser um homem, que adora futebol, se irrita, usa o humor sem medo e dispensa os véus de santidade. Mesmo quem não tenha fé, quem não goste da Igreja, sente-se tocado por este homem que vive forçosamente fora dos homens, mas que quer ser homem e não um semideus”. Mas esta Jornada também foi os muitos eventos realizados pelas dioceses, preparatórios desta semana com o Papa em Lisboa. E, mais ainda, o acolhimento de milhares e milhares de peregrinos vindos dos quatro cantos do mundo no seio de outros muitos milhares de famílias no país, de norte a sul, totalmente solidárias com esta iniciativa e numa manifestação extraordinária de hospitalidade e partilha tão única na nossa história, que constitui, só por si, um legado para o futuro dos que acolheram e de quem foi acolhido, para o enriquecimento de uns e outros, uma lição de vida, integração e solidariedade que ficará na memória de cada um dos milhares e milhares de intervenientes e na nossa história coletiva como algo irrepetível. Para além de registar a presença em alguns momentos de elementos do grupo numeroso de jovens peregrinos que foram acolhidos pelas famílias de Lousada antes do começo da JMJ, também tive a felicidade de poder assistir ao concerto na Capela do Senhor dos Aflitos de um coro integrante da comunidade italiana acolhida, como um agradecimento pela forma extraordinária como foram recebidos e tratados. Confesso que me emocionei várias vezes.                                                                                       As imagens da Jornada Mundial da Juventude que nos chegaram pela televisão são impressionantes, não só pelo número de peregrinos que se deslocaram a Lisboa, mas mais ainda pelo hino à alegria que sai de forma espontânea de todos eles, quase sempre integrados em grupos que fazem questão de identificar as suas origens pelas bandeiras que carregam orgulhosamente, em comunhão e convívios interculturais extraordinários. O entusiasmo contagiante de toda aquela juventude foi desafiado pelo Papa Francisco ao dizer-lhes “não tenham medo”. Esta Jornada foi, seguramente, um desafio à nossa capacidade para organizar um evento de tão grande dimensão, seguramente o maior de todos os tempos que já tivemos em Portugal. E o grande retorno que o país teve e terá em termos mediáticos, de projeção do país em todo o mundo e mesmo em termos económicos, não só no imediato, mas em especial no futuro, transformará os montantes gastos neste evento num excelente investimento para o país, talvez mais do que o foram a Expo 98 e o Euro 2004.                                                                                                            Das palavras-chave desta Jornada Mundial da Juventude, um hino à juventude e à alegria, sobram-me, sobre tudo, as palavras repetidas várias vezes pelo Papa Francisco aos jovens “não tenham medo” e a reafirmação de que “a Igreja é para TODOS”.

Não te preocupes e sê Feliz …

Hoje andamos quase todos sob pressão e, por isso, a maioria vive com stress. Corremos de um lado para o outro porque a pressa faz parte da nossa vida. Queremos tudo para ontem. Além disso, esperam de nós que sejamos o melhor pai e mãe, melhor trabalhador, melhor aluno, o melhor professor, etc. e somos avaliados pelo resultado: se formos bons no que fazemos, seremos recompensados, mas se formos maus, a pressão aumenta sobre nós. Daí que muitas pessoas passam horas e horas preocupadas com o amanhã, temendo as consequências daquilo que fazem e das atitudes que terão de tomar. Na gíria popular, o povo diz que “sofremos por antecipação”, ficando muito apreensivos por causa de uma coisa que ainda nem sequer aconteceu.

“Será que o médico vai dizer que tenho uma coisa grave”? “Vai correr bem a entrevista de emprego”? “Vou passar no exame”? “Os pais dele irão gostar de mim”? “Como vou arranjar dinheiro esta semana para pagar aos empregados”? Ora, se a preocupação se torna excessiva, não conseguimos raciocinar, ficamos paralisados. Às vezes, nem sequer conseguimos viver saudavelmente. É verdade que uma preocupação pode ter certa utilidade e ser satisfatória quando nos permite antecipar a resolução de um determinado problema. No entanto, quando se torna exagerada, aumenta a sensação de mal-estar e a capacidade de reagir fica comprometida, podendo aparecer a ansiedade.

Dizem-nos que a preocupação excessiva é um produto da sociedade contemporânea. É o preço da vida muito atarefada, com pouco tempo para descontrair, acalmar e descomprimir. Queremos controlar tudo, mas é impossível controlar o comportamento dos outros. Aconselham-nos a relaxar, escutar o silêncio e meditarmos, pois não podemos estar sempre a galopar na vida. Muitas pessoas preocupam-se demais ou até desnecessariamente e as preocupações, em regra, privam-nas da paz de espírito, do entendimento claro e julgamento sensível. Nesse estado, exitamos fazer algo que, em situação normal, fazemos bem. É fácil dizerem-nos “não te preocupes” e até não falta quem nos ensine a tentar evitar fazê-lo, através do controle e treino, mas muitas vezes nada disso resulta.

Na Bíblia também encontramos palavras sobre as preocupações e o conselho é bem claro: “Quem de vós, por mais que se preocupe, pode acrescentar uma hora que seja à sua vida”? E a seguir: “Portanto, não se preocupem com o amanhã, pois o amanhã trará as suas próprias preocupações. Basta a cada dia o seu próprio mal”.

É verdade que cada dia nos traz as suas próprias preocupações, seja a falta de dinheiro, o aumento crescente da inflação, a doença do filho ou a necessidade de obras urgentes na casa que pode ser agravada com a falta “daquilo com que se compram os melões”. Por isso, há que relativizar as preocupações e não fazer a “antecipação do sofrimento” que só contribui para agravar o problema.

Barroes diz-nos: “Não te preocupes com o tempo que não chega, pois ele conhece a tua cidade e tem o teu endereço”. Também não te deves preocupar com quem mente nem com quem prejudica os outros. Não te preocupes com quem passa a vida a olhar para o próprio umbigo e muito menos para os que julgam os outros na praça pública. Esquece os “todo-poderosos”, os arrogantes e aquele que acha que tu és burro e ele é que é esperto. Ignora os que te humilham e magoam e não te preocupes com os oportunistas. E nunca te preocupes em ser melhor do que o teu vizinho, o teu irmão ou o teu inimigo, mas tenta sempre ser melhor hoje do que foste ontem. Convence o teu filho para não se preocupar porque um dia vai chegar a adulto. Aí, vai desejar ser outra vez criança. Já eu e os da minha idade não temos de nos preocupar com a velhice, pois continuaremos a fazer as mesmas asneiras, porém mais devagar …

A mente de muitas pessoas vive lá no futuro, apesar de, fisicamente, estarem aqui presentes. E, a verdade, é que o futuro quase nunca se realiza como esperamos. Por isso, as preocupações e medos parecem ser um desperdício de pensamentos e tempo, pois enquanto tiveres medo e te preocupares, nunca irás melhorar. Daí que o conselho do “Não te preocupes” seja a resposta às dúvidas e medos. Assim, se um problema não tem solução … não te preocupes! 

E se tiver solução, porque é que tens de estar preocupado?

Para concluir e seguindo o conselho de um autor anónimo, há apenas duas coisas com que tu te deves preocupar: 

     Se tu estás bem de saúde ou se estás doente.

     Se estás bem de saúde, não tens de te preocupar! 

     Se tu estás doente, há duas coisas com que tu te deves preocupar:

     Se tu te vais curar ou se vais morrer.

     Se tu te vais curar, não tens de te preocupar!

     Se tu vais morrer, há duas coisas com que tu te deves preocupar:

     Se tu vais para o céu ou se vais para o inferno.

     Se tu vais para o céu, não tens de te preocupar!

     Se tu vais para o inferno, estarás tão ocupado a cumprimentar os velhos amigos que nem terás tempo para te preocupares!

     ENTÃO, PARA QUE TENS DE TE PREOCUPAR?

Esquece as preocupações, vive e sê Feliz!!!

Que seria de nós sem solidariedade?

A vida passa tão depressa que, se demorarmos um pouco mais a pensar no dia de hoje, quando mal nos acordarmos já estamos a recordar o dia de ontem sem que tenha sobrado grande tempo para pensar no amanhã. Uma vida representa um momento muito breve, mas mesmo assim podemos fazer a diferença na vida de outros que vivem connosco neste mundo e que tantas vezes precisam de nós.

Por vezes, uma só palavra faz toda a diferença. E é aqui que entra a palavra “solidariedade”, com um enorme significado, embora cada um de nós o faça à sua maneira. Uma palavra tantas vezes esquecida num mundo impessoal, de egoísmo, ganância e individualismo, mas que faz tanta mais falta quanto mais é ignorada. Constata-se que os seres humanos são muito solidários e altruístas nas desgraças. No entanto, em estados de graça são sempre egoístas e exclusivistas. Em suma, até parece que precisamos de tragédias para nos dispormos a ser solidários. Felizmente, ainda há muita gente que a tem guardada no coração e vive para ela.

Como explicar o que é a solidariedade? Há muitas formas de o fazer, mas solidariedade significa identificar-se com o sofrimento do outro e, principalmente, dispor-se a ajudar a solucionar ou amenizar o seu problema. É ter interesse pelo próximo, é ajudá-lo a não se perder, a não ser enganado, a não ter a saúde e vida em risco. É oferecer ajuda a alguém que conhecemos ou não e que passa fome, sofre violência, discriminação, preconceito e qualquer outro tipo de diferença social.

A solidariedade é uma qualidade imprescindível para vivermos em sociedade e para tornar o mundo melhor. Quantas vezes pessoas que conhecemos passam por necessidades? Ajudá-las, é ser solidário. Mas se essas pessoas nos são desconhecidas, ajudá-las será um ato ainda maior. 

Ser solidário não é só dar bens materiais. Há muitas formas de o fazer. Umas vezes, por palavras, outras na presença silenciosa, pois há ocasiões em que a maior necessidade é de “colo”, para ser ouvido e desabafar. 

O sentido mais básico da solidariedade pressupõe que seja exercida sem discriminação de sexo, raça, religião ou outra e deverá ser feita no anonimato, sem alardear aos ventos o que se fez, sem que uma mão saiba o que a outra deu. Mas o termo tem sido desprestigiado pelo abuso do discurso político e do “marketing” solidário. É que a verdadeira solidariedade é “dar sem receber nada em troca e sem que se saiba”. É ser desinteressado, fazendo-o por convicção, justiça e igualdade.  É indispensável a reanimação da solidariedade social como virtude e denunciar o seu uso como instrumento político, usado e abusado à exaustão para colher dividendos pessoais e partidários. E há que desconfiar do entendimento da “solidariedade social” como coação sobre o dinheiro alheio, num saque brutal aos contribuintes porque, “é fácil ser solidário … se os outros estão sendo forçados a pagar os custos”. 

A solidariedade é a forma de tornar a vida das pessoas um pouco melhor e mais digna, daí que a solidariedade humana assenta no respeito pela dignidade individual. Pensamos sempre “quem somos nós para mudar o mundo”? A verdade é que o mundo só pode ser mudado por nós, por cada um de nós, em conjunto, pois podemos formar uma força capaz de provocar a mudança. 

A solidariedade é mais que um conceito a merecer atenção de todos. É algo a pôr em prática no dia a dia e que deve fazer parte do nosso crescimento pessoal, ao apoiar a construção de uma sociedade mais inclusiva, a auxiliar pessoas vulneráveis e a dar resposta a desafios sociais. Não se pede para salvar o mundo, mas todos temos um papel importante na comunidade e adotar hábitos e comportamentos mais solidários é uma boa forma de contribuir para um futuro melhor.

Apoie uma instituição de solidariedade social, procure um projeto social com que se identifique e dê um contributo. Doe sangue, faça voluntariado numa instituição, dê uma volta às suas tralhas e doe roupas, brinquedos e outros objetos que já não usa.

Comece a fazer solidariedade à sua volta, pela família, vizinhos e amigos em situação de necessidade. Preste atenção às dificuldades, descubra como ajudar e disponibilize o seu tempo para confortar, apoiar e escutar com atenção. Tente colocar-se no lugar do outro, compreenda qual a sua realidade e perceba de que forma poderá ser útil. Como dizia Rozilda E. Costa, “abrace como quem quer acolher, acolha como quem deseja ser solidário, ajude como quem se coloca no lugar do outro”.

Um conceito interessante de solidariedade está nestas palavras de um autor desconhecido, cujo título é: “Se fizerem o que peço, viverei para sempre”. E reza assim: “Em certo momento um médico vai dizer que o meu cérebro parou totalmente de funcionar e, para todos os efeitos, a minha vida acabou aí. Quando isso acontecer, não tentem inserir vida artificial no meu corpo através das máquinas. Mas não chamem isso de meu leito de morte. Chamem-lhe de Leito de Vida. E deixem o meu corpo ser retirado do invólucro para outros terem uma vida mais rica. Deem a minha vista a um homem que nunca viu o sol nascer, o sorriso de um bebé ou o amor nos olhos de uma mulher. Deem o meu coração a uma pessoa cujo coração nada provocou, além de dias de dor. Deem o meu sangue ao jovem retirado da amálgama de chapas do seu carro acidentado e que ele possa viver para ver os seus netos a brincar no parque.

Deem os meus rins a quem depende de uma máquina três vezes por semana para continuar a existir. Deem os meus ossos, cada músculo e cada nervo do meu corpo e descubram uma maneira de fazer andar uma criança aleijada. Examinem todos os cantos do meu cérebro. Peguem nas minhas células, se necessário for, e deixem-nas crescer para que, algum dia, um menino mudo possa gritar “GOLO” e uma menina surda possa ouvir o barulho da chuva na vidraça. Queimem o que restar de mim e espalhem as cinzas ao vento, para ajudar as flores a brotar. Se for preciso enterrar alguma coisa, que sejam as minhas faltas, as minhas fraquezas e todo o preconceito.

Deem os meus pecados ao diabo e deem a minha alma a Deus. Se por acaso quiserem lembrar-se de mim, que seja com uma boa ação ou uma palavra gentil a alguém que precise”.Num tempo de promoção do individualismo, do aumento do número de pessoas em risco de pobreza, do número crescente de idosos em situação de abandono, de inflação descontrolada e salários baixos, o que seria da comunidade sem a solidariedade?

A arte, e arma, do “desenrascando” …

Os portugueses julgam ter uma capacidade especial para resolver qualquer problema encravado, seja ele de que espécie for. Aliás, até pensamos que somos os campeões mundiais nessa nobre arte a que demos o nome artístico de “desenrascanso”. Assim, a capacidade de resolver um sarilho do pé para a mão, com uma perna às costas, em curto espaço de tempo e sem grandes meios, é um feito que, aos olhos dos portugueses, merece ser exaltado, ainda que o caso tenha sido resolvido em cima do joelho. Verdade seja dita, ainda está por demonstrar se essa suposta virtude não se trata mais de um defeito, quase sempre mal-escondido. É pena que Luís de Camões não esteja vivo para cantar em verso essa suposta qualidade dos lusitanos, mas pode ser que algum poeta do nosso tempo agarre no assunto e eleve bem alto tal “arte” nacional, que revela uma luta entre a inteligência e a esperteza. Porém, não sabemos se essa capacidade é genuinamente portuguesa, mas quem vive cá entre nós tem de reconhecer que a improvisação muitas vezes é a única forma de lidar com o que nos acontece. E, como o“desenrascanso” implica algo feito à pressa, pode dizer-se que nunca se sabe se a solução encontrada não vai acabar por gerar um problema maior. Ora a verdade é que, no momento do desenrasque, quando o “artista” proclama a palavra mágica “pronto”, pode gabar-se do seu feito, de ter resolvido o problema encravado, possivelmente há muito tempo, ainda que depois a coisa dê para o torto, algo vulgar quando ele “percebe pouco ou nada da poda”. Mas, como diz o povo, “enquanto o pau vai e vem, folgam as costas” e ele pode usufruir do sucesso, mesmo que seja temporário.

Desenrascar algo é conseguir o impossível. É encontrar uma solução como agulha num palheiro. É apelar à criatividade e safar-se contra todas as espectativas. É encontrar uma chave, sabe-se lá como nem onde. É sair do canto onde ninguém dá por si, dar o braço à Fortuna, virar o jogo e resolver o problema numa jogada impensável. É por não saber muito bem o que fazer que agimos de forma imprevista e conseguimos uma vantagem momentânea que pode ser explorada a nosso favor. O resto é sentido de oportunidade. Ou oportunismo, conforme o caso. Por exemplo, uma das características distintivas da gestão em Portugal parece ser o desenrasque. Um estudo feito com gestores portugueses e expatriados em Portugal assim o indicava, traduzindo de resto uma intuição corrente. 

Os portugueses parecem ser mestres na arte do desenrasque e, aparentemente, demonstram algum orgulho nisso. Aliás, não sei se é mais uma “arma” do que uma “arte”, tal a oportunidade de um “tiro certeiro”. 

Podíamos, como outros fazem, tentar mudar a situação, educar os incompetentes, punir os prevaricadores, pedir responsabilidades, criar padrões de conduta e processos claros de recompensa, mas aprendemos com o tempo que nada disso vale para a nossa maneira de ser. 

Que a estratégia, o planeamento e a capacidade de execução, combinados com mecanismos de avaliação e metodologias para a melhoria contínua são insubstituíveis. Mas, quando estas falham, o desenrascanço pode ser solução extrema, reservado para situações limite onde se torna então indispensável. O desenrascanço baseado em soluções de recurso tem o seu âmbito de aplicação. É importante quando o planeamento falha e a situação ameaça descontrolar-se. Mas, gerir pessoas, empresas, projetos e tarefas somente com base no desenrascanço, é um pouco como não arranjar os travões do carro porque ele tem airbag.

Pela Lei de Murphy, “se alguma coisa pode correr mal, vai mesmo correr mal”. Ora, diz-se que isto não tem aplicação em Portugal pois há sempre a possibilidade do “desenrascanço” para sair de situação difícil e, “entre mortos e feridos, alguém há de escapar”. Além disso, sabe-se que uma boa crise traz sempre oportunidades a quem tiver esta capacidade ou habilidade.

O horror ao desenrasque é muitíssimo maior junto dos profissionais oriundos de países com práticas de gestão mais desenvolvidas ao longo de décadas, de gestão moderna do Norte da Europa e não na que se difundiu no Sul da Europa, onde ainda persiste. Nos países do Norte, os planos são tomados a sério, pois as regras são universais e os desvios devem ser excecionais. Já cá no Sul, os planos terminam muitas vezes com a apresentação em “power point”, mas as regras admitem um sem número de exceções e o seguimento do plano é a exceção e não a regra. A planificação e, muito mais, o cumprimento das regras, não são connosco.                                                                                                                 Está mais que provado que, administrativamente, quando um projeto                                                                                                                      esbarra na burocracia, na cunha, no compadrio, na incompetência generalizada, na incapacidade de tomar decisões rápidas e assumir a sua responsabilidade, na falta de visão, na inveja e falta de liderança, o azar e o mau-olhado paralisam-nos e só nos resta mesmo apelar ao desenrascanço porque, o especialista no desenrasque, é alguém que sabe bem “mexer os cordelinhos” e como “olear a máquina”, além de conhecer “a porta onde há de bater”. E não adianta ficarmos a remoer por o nosso processo estar parado, não ser despachado nem sequer informado. O típico português sabe bem como arranjar maneira da coisa ser desenrascada e onde encontrar um “artista com arte”, ainda que isso tenha um preço que para um cidadão nórdico seria, de todo, inconcebível.                                                                                                         Na realidade, nós temos orgulho na nossa capacidade de resolver as situações imprevistas ou enrascadas, usando soluções nem sempre confiáveis ou “ortodoxas”. Daí que, no rol das anedotas europeias conta-se esta: “A fábrica ideal na Europa teria gestores holandeses e operários alemães. Mas, no centro da fábrica e dentro de uma redoma de vidro, estaria um português. No vidro haveria um autocolante com o aviso: “Em caso de emergência e necessidade de desenrasque, deve quebrar o vidro”.

Heróis do dia a dia. Uma lição de vida!

A pandemia e a Guerra da Ucrânia vieram alterar profundamente as nossas vidas, especialmente no que à economia familiar diz respeito, com a inflação a atingir valores que já havíamos esquecido há muito. E, nesse processo inflacionário atribuído às quebras na produção de bens e à falta de matérias-primas, sabe-se que a especulação também deu uma grande ajuda para que os preços chegassem tão alto, pois o oportunismo comercial não deixou de se intrometer para retirar mais alguns ganhos do que seriam devidos. E fomos sabendo, aqui e ali, da maneira como existências de artigos e produtos em armazém foram dadas como inexistentes para, de um dia para o outro, aparecerem no mercado com preços abusivamente superiores. 

Nestes casos, foi a ganância e a obsessão de ganhar muito e depressa quem comandou a decisão desses oportunistas, que se esqueceram do respeito pelas regras do jogo e da confiança que tem de existir entre fornecedores e consumidores para que na sociedade não impere a lei da selva. É verdade, toda a atividade comercial tem como principal objetivo a criação de uma mais-valia a que vulgarmente chamamos lucro. 

E eu, que tenho trabalhado na compra e venda de imobiliário, não escapei a essa regra pois ao comprar um património qualquer para revender tive como objetivo fazê-lo com algum ganho, o que nem sempre terá acontecido, mas isso são as exceções à regra. Por norma, todo o lucro reverte para o vendedor deduzido de eventual comissão a pagar a alguma mediadora imobiliária, se for caso disso e, posteriormente, dos devidos impostos. Ora, o que me leva hoje a escrever estas linhas é um caso raro que sai fora do habitual no que ao lucro diz respeito. E passo a contar: 

O senhor António chamou o filho mais novo com quem costumava conversar mais sobre os seus negócios e disse-lhe: “Conheces bem aquela propriedade que comprei à família Teixeira por duzentos mil euros. Quando fiz o negócio nem sequer discuti o preço e paguei-lhes o valor que me pediram. Pois acabei de a vender a uma empresa do centro do país por quinhentos e cinquenta mil euros e já assinamos o contrato promessa de compra e venda”. O filho ficou entusiasmado, felicitou o pai por ter feito um negócio excelente que lhe tinha gerado uma mais-valia superior a 150% e, mais ainda, porque a propriedade fora comprada há pouco mais de dois meses, pelo que era uma mais-valia extraordinária num prazo de tempo bem curto. Depois do filho acalmar um pouco, o pai continuou: “No entanto quero-te informar também que vou devolver há família Teixeira uma parte desse lucro, porque considero que aquilo que eu ganhei neste negócio é excessivo e não seria justo que ficasse com a mais-valia toda em desfavor do anterior proprietário que, por uma razão ou por outra, não soube vender a propriedade pelo seu valor real. Já lhes comuniquei a minha decisão”. O filho “passou-se dos carretos” e disse ao pai que não tinha nada que partilhar o lucro com os Teixeiras dado que o trabalho e habilidade comercial fora somente dele e não deles. E, em tom muito enervado, usou todos os argumentos possíveis para tentar demover o pai de fazer aquilo que ele considerava ser uma grande asneira que não fazia sentido. Mas, apesar da insistência e discordância do filho, o senhor António manteve a decisão como uma “questão de princípio” até porque, disse-lhe ele, “o dinheiro não é tudo na vida”. A história, verídica, foi-me relatada há dias pelo filho do senhor António, aquele que se opôs ao “esbanjamento”. E hoje, vários anos volvidos, o filho disse-me muito comovido: “Esta foi a maior e melhor lição de vida que recebi do meu pai, numa altura em que a minha juventude não me deixava ver para além do dinheiro que eu achava que ele estava a desperdiçar. Só o tempo me fez perceber a grandeza da sua atitude”. Disse ainda que a família Teixeira nem queria acreditar que alguém tivesse um gesto desses e se, antes o respeitavam, a partir de então passaram a ter por ele uma adoração enorme, diria mesmo devoção, que os levou a consultá-lo sempre que queriam vender alguma coisa por saberem ser alguém de confiança que não pensava só em si. 

Confesso que, para mim, este é um caso único. Nunca conheci nem ouvi falar de alguém que, sem compromisso algum com o anterior proprietário, voluntariamente se dispôs a dividir com ele os lucros colhidos na transação da propriedade que ele lhe vendera sem nada a obrigá-lo ao que quer que seja, mas somente por considerar que teve “ganhos excessivos” e que, por isso, moralmente se sentia obrigado a fazê-lo. É uma atitude duma nobreza invulgar de que muito poucos se podem gabar e o cidadão comum, ao saber que ele entregou parte do lucro a troco de nada e “à nossa maneira”, pensará: “Grande estúpido. Eu não lhe daria um “chavo””. 

Mas António revelou uma preocupação que vai para lá do benefício financeiro, demonstrando uma consciência social e ética rara, já que não é normal vermos alguém abdicar de uma boa fatia de dinheiro a troco de nada, a não ser da sua convicção de que era uma obrigação.

Mais do que tudo, a lição de António deve servir para meditarmos se “o dinheiro é tudo na vida” ou se há outros valores que, em muitos momentos, devem estar acima do “vil metal”. 

A rematar a conversa que tive com o filho do senhor António, ele disse-me que, a partir deste acontecimento e ao longo da sua vida, teve a felicidade de confirmar uma velha “máxima” que se ajusta perfeitamente ao que lhes foi acontecendo ao longo dos anos: “Na vida, quanto mais damos, mais recebemos”. 

“Uma luzinha ao fundo do túnel” …

Uma sondagem recente mostra a elevada descrença dos portugueses no Parlamento, governo e partidos e a altíssima insatisfação com os governantes pela situação a que chegamos, da habitação à justiça, da saúde à corrupção, de impostos muito elevados ao alto custo de vida, que os faz andar “com cara de enterro”. E não é para menos, pois já há “quem ande com uma mão à frente e outra atrás”, “passe a vida a contar os tostões” e esteja “entre a espada e a parede”, isto é, ou paga a renda ou compra comida. Era para arranjo de vida a rede de apanha ilegal de ameijoa no Montijo descoberta recentemente. Se fossem apanhadores de caranguejos, “viam a sua vida a andar para trás”, o que não era o caso. Nem sequer eram pescadores, pois “ficavam a ver navios” e muito menos vendedores de “jaquinzinhos”, porque se sabe que eles “andam tesos que nem carapaus”. Apesar dos imigrantes não serem peixes, viviam “como sardinhas em lata”, pelo que foram parar a um pavilhão com condições ainda piores, acabando por voltar ao local onde moravam.

Foi uma “descoberta” do que já muitas pessoas sabiam, mas “ficaram caladas que nem ratos” porque “o calado é o melhor”. É que, a vida em Portugal está muito difícil. Senão, vejamos: Os relojoeiros “andam com a barriga a dar horas”, os padres “já não comem como abades” e os talhantes, “estão feitos ao bife”. Mas ainda há gente que está bem pior, como os cabeleireiros que “arrancam os cabelos” e os cavaleiros, que “perderam as estribeiras”, enquanto às manicures já “estalou o verniz” há muito.

O presidente Marcelo diz que “os números da economia demoram a chegar ao bolso das famílias”, apesar do governo se vangloriar que ela “vai de vento em popa”. Talvez por isso, os padeiros “estejam com falta de massa”, aos cardiologistas foi detetado “um aperto”, os bebés “choram sobre o leite derramado” e os coveiros “vivem pela hora da morte” pelo que, o que encontram, são sempre e só, “ossos do ofício”. 

Ora, os governantes devem estar desfasados da realidade pois já nem veem que os jardineiros “engolem sapos”, os neurologistas “estão à beira dum ataque de nervos”, os picheleiros “têm ar na canalização” e, muito para além disso, “os criadores de galinhas estão depenados”.

As greves sucedem-se umas atrás das outras para reclamar contra o custo de vida, principalmente da inflação na alimentação e dos baixos salários. É por isso que os pedreiros “andam com duas pedras na mão” e “com uma pedra no sapato”, os eletricistas “têm os fusíveis queimados” e “estão ligados à corrente” e os mecânicos “griparam o motor”. Os farmacêuticos “não têm remédio”, os atores “já não sabem o que hão de dizer” e não se pode ver um concerto pois “as entradas custam os olhos da cara” só para ouvir os pianistas “bater sempre na mesma tecla”, enquanto os astrónomos “veem o céu por um canudo”. Os veterinários “já não aguentam uma gata pelo rabo” a dizer “cobras e lagartos”, os pneumologistas “estão com falta de ar”, os barbeiros “põem as barbas de molho” e os dentistas “andam a bater o dente”.

Mas há mais, porque as dificuldades chegam a todos. “Os madeireiros, arranjam lenha para se queimar” ao provar que “as árvores morrem de pé”, os empresários de espetáculos, “já não ganham para mandar cantar um cego”, os ginecologistas, “ficam com a criança nos braços”, e os funileiros “não têm lata”. E, nalguns casos, “é preciso ter muita lata” para “dar a cara”. No bar, os salva-vidas “afogam as mágoas” e os médicos “dão de beber à dor”. E, nesta vida difícil, são os caloteiros a dar esperança ao credor: “Deus lhe pague”!

Neste estado de coisas, não pense eliminar as pragas em casa porque os desinfestadores estão “piores que uma barata”. Ora, os sinaleiros, sendo profissão em vias de extinção, “andam de mãos a abanar”, o que é mais um sinal, não de trânsito, mas de que a vida está difícil para todos. Assim, os coxos “já não andam com a perna às costas”, os pastores “procuram um bode expiatório” que “não tenha culpas no cartório”, pois o custo de vida está ainda mais alto que as folhas a que não chega e os fabricantes de cerveja “perderam o seu ar imperial”. Agora, os domadores “estão maus como as cobras” e “a ferro e fogo” estão os ferreiros, que se recusam a “malhar em ferro frio”, enquanto os carpinteiros “fazem tábua rasa”. Só o matador diz que “é agora que a porca torce o rabo”. Ora, nesta paródia breve sobre o custo de vida, as cozinheiras “não têm papas na língua” e “põem tudo em pratos limpos”, fazendo com que os olivicultores “fiquem com os azeites” e os trefiladores “vão aos arames”, para além dos elefantes “ficarem de trombas” e os músicos “porem a boca no trombone”. No meio desta situação de crise grave, os criadores de gado só “pensam na morte da bezerra”, “os sobrinhos dizem “Ó tio, ó tio””, os aviadores “caem das nuvens que nem tordos” e os golfistas “não batem bem da bola”.

Só os governantes que “nos saíram na rifa”, parte deles “feitos às três pancadas” e que “não percebem nada da poda” “nem dão uma para a caixa”, “com ideias que não lembram ao diabo” e capazes de “mentir com quantos dentes têm na boca”, especialistas em “tirar o cavalinho da chuva”, “quando a coisa cheira a alho” e “lhes descobrem a careca”, andam para aí “armados em carapaus de corrida”, “nariz empinado” e “a viver à grande e à francesa”, “de mula cheia”, “gordos como chinos” de tanto “puxar a brasa à sua sardinha”. Mas “não encontram o fio à meada” e por isso deviam “meter o rabinho entre as pernas”, “a viola no saco”, “limpar as mãos à parede” e “ir pregar para outra freguesia” “onde não lhes conheçam o cu”. Para se safar, vêm com a “conversa para boi dormir” e “lágrimas de crocodilo”, fazendo até “chorar as pedras da calçada” enquanto o Zé “tem de comer o pão que o diabo amassou”. 

Ora, esses políticos “de carregar pela boca”, fartam-se de “vender banha da cobra” e “tapar o sol com a peneira” para depois “meter a pata na poça” e “a montanha parir um rato”. O que lhes vale é que o povo, “sendo o bombo da festa” e “estando de saco cheio”, “não sabe da missa a metade” e vai-se “aguentando nas canetas”, mas à rasca, até “dar o peido mestre” e “esticar o pernil”. Caso contrário, não faltava quem “lhes acertasse o passo” e dissesse para se “porem finos”, pois se forem “apanhados com a boca na botija” e “a meter a mão na massa”, vão ter de “assentar o cu no mocho” porque “a culpa não pode morrer solteira “e não adianta “armar-se ao pingarelho”, como se “isto aqui fosse da mãe Joana”, pois “podem bater com os costados na choldra”. 

É verdade que o povo “anda com a pulga atrás da orelha”, com “a mostarda a chegar ao nariz” e faz “cara de poucos amigos” ao ver que lhe “estão a comer as papas na cabeça”, estando na altura de dizer “alto e para o baile” que “isto nem lembra ao diabo” e “não andamos neste mundo por ver andar os outros”. Assim, como os governantes andam para aí “a “pintar um país cor-de-rosa” “só para enganar meninos”, é tempo de lhes “bater com a porta na cara”, “mandar dar uma volta ao bilhar grande” e dizer que “são uma carta fora do baralho!                                                                                                          Talvez assim se possa voltar a ver “uma luzinha ao fundo do túnel” … se o comboio que vier não trouxer mais “farinha do mesmo saco”!

Os malucos já tomaram conta deste manicómio

O manicómio em que se tornou este mundo ocidental em que vivo anda à deriva e, em muitas situações, os malucos já tomaram conta dele. E não há volta a dar. Eu pensava que a maioria dos homens que o habitam eram normais, racionais, conscientes do certo e do errado, com respeito pela história, pelo bem comum e pelos outros, pela sua liberdade e criatividade, vivendo em democracia, sem censura nem fingimentos. Mas aquilo que me parecia “normal” virou-se do avesso neste ocidente dominado pelo “politicamente correto” e por minorias que gritam mais alto que ninguém, com o absurdo no topo da agenda.                          Derrubaram-se monumentos, retiraram-se estátuas dos lugares onde estavam expostas por honrarem a memória de esclavagistas de eras passadas ou de descobridores de novos mundos, agora passados de “descobridores e heróis” a “colonialistas, racistas e bandidos”, como se faça algum sentido julgar atos de há mais de 500 anos com o olhar de hoje. Colocaram placas em museus a pedir perdão pela brancura das esculturas para não se entender por promoção da superioridade do povo europeu. Até uma exposição de Darwin, em Londres, teve de ser revista por algumas peças poderem ser tidas por ofensivas.

Por cá também chegou a imbecilidade com o que fizeram à estátua do Padre António Vieira e com os brasões do Jardim do Império em Lisboa, onde ainda querem mudar o nome para apagar a história. O que é isto e quem é esta gente? De que complexo sofrem os governantes que se submetem servilmente à vontade destas minorias tão (a)berrantes? Vamos agora demolir as pirâmides porque foram feitas com recurso a trabalho escravo?! Vamos derrubar todas as efígies de reis porque somos uma república?! Vamos riscar dos livros de História os nomes dos homens porque durante séculos consideraram que as mulheres eram propriedade sua, igualzinhas a uma colher de pau?! E serviria isso para impedir discriminações ou abusos futuros? Na mais recente vaga de estupidez, passaram a censurar as obras de Enid Blyton, como as aventuras dos Cinco, banidas das bibliotecas, e reescreveram livros de Agatha Christie, a rainha do crime, porque as descrições feitas então pelas escritoras, escritos com 100 anos ou mais, podem ofender os leitores de hoje. É a violação de legados que temos obrigação de preservar e que não se podem destruir. Novas edições surgiram, já revistas e reeditadas, com nomes, personagens e enredos adulterados para convertê-las em obras já “politicamente corretas”. Além da estupidez evidente, as tentativas de reescrever a História e todas as histórias, de apagar o passado para não ofender as novas gerações são ridículas e perigosas e nunca se sabe onde vão acabar. Quem ainda acredita que há bonomia nesta inenarrável escalada de imbecilidade, talvez devesse começar já a ponderar o que fazer a obras como Lolita (uma ode à pedofilia, supõe-se) ou o nosso Os Maias (um tratado ao incesto, adivinha-se) e até os Lusíadas, talvez tido por racista e uma ode à supremacia dos portugueses brancos. A que título na história Peter Pan, um personagem criado pelo escocês J. M. Barrie e que deu origem a um livro para crianças publicado em 1911, se mudaram os protagonistas que fizeram parte do original do livro e dos filmes, sendo quase todos substituídos por “não brancos”. O único branco que “sobreviveu” na história é o … “Capitão Gancho”, talvez por ser o “mau da fita”. O mesmo se passa em outras histórias infantis, fazendo com que esse monstro da indústria cinematográfica que é a Disney se tenha vergado aos protestos de algumas minorias em nome da tal “inclusão” e “não discriminação”.  Em vez de se fazer a promoção das histórias que cada raça ou povo tem, reescrevem-se as que tiveram sucesso apesar da “brancura” dos protagonistas e faz-se “integração”, adulterando aquilo que o autor criou e que não pode deixar de ser uma obra sua, que não pode nem deve ser alterada.                                    É impossível apagar aquilo que foi. E ainda bem. É conhecendo o passado que se pode criar um futuro melhor, não lhe subtraindo, amolgando e formatando aquilo que já passou à imagem da sociedade atual. Não é queimando livros e arrasando a memória que se evolui, (foi Hitler que o fez para apagar da história tudo o que fosse contrário à sua ideologia totalitária. Agora estão a querer fazer o mesmo) mas conservando-a para que todos conheçam os avanços e recuos que houve ao longo da história para chegar até aqui e qual foi o preço do que hoje se dá por adquirido e perceber quantas “montanhas” houve que transpor.                                                                                                       Numa escola de raparigas, em Inglaterra, a professora chegou à sala de aulas e disse: “Bom dia, meninas”. No final da aula um grupo de alunas protestou contra a professora por ter dito “bom dia, meninas” já que algumas delas não se “sentiam” do género feminino. E, veja-se, o protesto foi levado tão a sério, que a direção da escola, “feminina”, chamou a professora e exigiu que esta apresentasse um pedido de desculpas às “não meninas”! E ela teve de o fazer, apesar de estar a lecionar numa “escola de meninas”. Esta gente não está maluca? Ou será que os malucos já tomaram conta do “manicómio” e a maioria continua silenciosa, a dormir na forma?                                                   Stephanie Matto, ex-participante de um reality show americano, teve de parar o seu negócio inovador de venda de “peidos engarrafados” a 1.000 dólares o frasco por causa da dieta com ovos, feijões e proteína que fazia para produzir mais gases e que lhe causou complicações intestinais. A “Influencer digital” iniciou as vendas a pedido dos seus seguidores, que também lhe pediram para vender os seus sutiãs, as calcinhas, cabelo e até água usada no banho. Cada frasco, além dos gases, continha pedaços de fezes em forma de chouriço. Conseguira vender algumas centenas de milhares de dólares quando teve de parar por indicação médica, com muita pena dos clientes.                                                                            Com o corpo todo tatuado, o francês Anthony Loffredo é conhecido pelo “Projeto Alien Negro”. Tem muitos piercings e até já fez várias modificações corporais e cirurgias para conseguir a aparência do ET desejada. Removeu o nariz, orelhas e parte dos lábios. Até cortou 2 dedos da mão esquerda para se aproximar do modelo de “Alien” com que quer ser com a colaboração de médicos de deontologia duvidosa, mas ainda não está satisfeito com a sua imagem de um extraterrestre. Há cada uma!!!                                                                                                       Um deputado da Assembleia Legislativa do Brasil relatou o seguinte em plena reunião: “Aconteceu um assalto em S. Paulo. Um motorista da Uber apanhou três clientes e, no meio do caminho, os três homens, que eram os assaltantes, tentaram matar o motorista. No entanto, como ele era um antigo policial, mesmo pondo a vida em risco, reagiu e acabou por matar os três assaltantes”. A deputada Maria do Rosário, do Rio Grande do Sul, que não estava na reunião, quando soube do que aconteceu, reagiu com um comentário absurdo, que nos remete para as “tonterias” do nosso tempo e que merece ser divulgado para se ver qual o grau de loucura de alguém que está no poder e não sabe distinguir o certo do errado, ao dizer o seguinte: “Era bom que a sociedade parasse para pensar pois hoje temos três famílias a chorar por causa de um opressor. É que, no caso de ele (o motorista) não ter reagido, apenas uma família estaria a chorar. E assim, o prejuízo para a sociedade seria bem menor”.                                                                           Começo a pensar que o Hospital “Conde Ferreira” faz muita falta …

Zé do Telhado: (A)final, um homem bom?

Há um bom par de anos andei por terras de Angola durante alguns meses, tendo passado uma boa parte desse tempo em Malange. E a partir dali fazia incursões pela Baixa de Cassange para me dedicar ao estudo da cultura do algodão. Foi nessa região que me “cruzei” com o passado de um homem oriundo das nossas terras, onde se tornou figura mítica e ficou conhecido por Zé do Telhado. Depois de ter sido deportado para Angola na sequência de uma sentença do tribunal do Marco de Canaveses, estabeleceu-se em Malange como negociante de borracha, cera e marfim, sendo conhecido entre os angolanos como o “Kimuezo”, ou seja, o homem de barbas grandes, já que as deixara crescer desde que chegara a África. Viria a morrer em 1875 com 57 anos e uma enorme fama de homem bom, figura mítica e protetora dos mais desfavorecidos, de tal forma que ainda hoje, quase 150 anos após a sua morte, são feitas romagens à sua campa, um pequeno “mausoléu” erigido pelos naturais da longínqua aldeia de Xissa, onde morreu. 

Em 65 estive várias vezes diante do “mausoléu” e é impressionante como, passados que eram noventa anos sobre a sua morte, a sua fama de homem bom, de protetor dos mais necessitados e figura mítica, continuava viva no coração daquela gente de Angola, nessa terra onde acabou os seus dias. Ouvi-o de viva-voz da boca de alguns residentes da “sanzala”. E tanto o cuidado posto na conservação do mausoléu como o seu nome atribuído à escola local eram testemunho desse respeito e gratidão que a população local continuava a dedicar-lhe.

Zé do Telhado fora deportado para Angola, condenado pelos crimes que lhe foram imputados enquanto chefe duma quadrilha de ladrões, se bem que na mente (e talvez no coração) de uma grande parte das gentes da sua época, tenha permanecido como o “Robin dos Bosques português”, alguém que, à sua maneira e em época muito conturbada da História de Portugal, combateu as injustiças sociais e de quem, a senhora da Casa de Carrapatelo, onde levou a efeito um dos maiores assaltos, o que a torna insuspeita na sua afirmação, disse em tribunal: “Existem pessoas de bem que nunca deram às classes humildes um centésimo do que Zé do Telhado lhes deu”. 

Confesso que tenho uma atração muito grande por essa figura local, misto de bandido e benfeitor que ficou conhecida por Zé do Telhado, de que ainda ouvi falar muito na minha infância com admiração, até porque assaltou ou tentou assaltar algumas casas bem conhecidas na região. E ficou-me a curiosidade, porque não o respeito por alguém de quem ouvi muitas histórias, umas reais e outras de ficção, que o transformaram num herói aos olhos de uma criança e num mito para a sociedade.                                                                                                Aprendeu e trabalhou como capador e tratador de animais, tornou-se militar nos “Lanceiros da Rainha” em Lisboa, onde se distinguiu pela sua conduta e coragem, levando-o a tomar parte na luta pelos liberais contra os setembristas. Derrotado, fugiria para Espanha, regressando para aderir à Revolução da Maria da Fonte às ordens do general Sá da Bandeira. Nessa luta foi notável pela sua bravura, pelo que recebeu a mais alta condecoração de Portugal. 

Com a derrota da revolução, caiu em desgraça e foi expulso do exército, tendo regressado a casa pobre e marginalizado pelos vencedores, sem direito a um trabalho que lhe permitisse sustentar a família, sendo presa fácil para quem o tentava levar ao caminho dos assaltos como única saída para poder alimentar os filhos que lhe pediam pão. Foi sempre um homem com dignidade, não virando nunca a cara à luta, fosse como combatente ao serviço do reino e das causas que defendeu, quer fosse nos assaltos ou disputas nas feiras e romarias.

Como assaltante foi corajoso e cavalheiro, impondo alguns códigos de conduta ao bando com o respeito pelos mais fracos e pelas mulheres. Só roubava os ricos e fazia questão de distribuir parte do produto dos roubos pelos pobres. A benemerência do salteador ofendeu mais os poderes de então do que propriamente os roubos que fez e talvez por isso tenha sido perseguido sem tréguas. E a denúncia das injustiças sociais fizeram com que fosse tão louvado pelos pobres (e até pelos ricos), mas, sobretudo, um incómodo para o poder. 

Zé do Telhado teve assim três fases distintas na sua vida. A primeira, como capador de animais, homem casado e militar condecorado pela sua disciplina e coragem. A segunda, como chefe de uma quadrilha de ladrões, comprovadamente empurrado pelas circunstâncias de se ter colocado às ordens do General Sá da Bandeira, aderindo à Revolução da Maria da Fonte e saído derrotado, pobre e sem hipótese de algum trabalho. E a terceira, já em Angola, como negociante e homem bom que protegia os mais desfavorecidos ao ponto de se tornar uma lenda que continua viva um século e meio depois. 

Se Zé do Telhado pudesse voltar cá, sentir-se-ia injustiçado ao saber que um assaltante e ladrão de banco fora nomeado para secretário de estado e que muitos outros governantes de honestidade e ética muito duvidosa não deixaram de o ser por isso. E perante o panorama geral do que vem acontecendo, ele invocaria a poesia de António Aleixo e assumia como sua essa quadra extraordinária:

“Sei que pareço um ladrão …

Mas há muitos que eu conheço

Que não parecendo o que são

São aquilo que eu pareço”!!!

O lado bom de envelhecer …

Ao que parece, ninguém quer envelhecer, ficar velho. Ver crescer as peles e os pelos mais do que o habitual e encolher e mingar outras partes que bem gostaria que continuassem em alta, firmes, como … a saúde. Mas tal não deixa de ser um paradoxo porque ninguém prefere a alternativa, isto é, “bater a bota” antes de entrar na terceira idade, não ver crescer os filhos, muito menos os netos. Então, é caso para perguntar: “Em que ficamos? Mas é assim tão mau ser idoso”? Será porque se diz por aí que “os anos pesam muito” e não se aguenta esse peso?

Vamos lá ver o lado positivo da questão e conhecer as vantagens de ter muitos anos, tantos que a gente já não sabe bem quantos são. Pois é, já não temos a obrigação de nos lembrar de tudo e a idade é só um pormenor. O relógio já não comanda a nossa vida e temos liberdade de horários, tanto para ficar noite dentro a ver um daqueles filmes pornográficos que, afinal, já não ajudam nada, a não ser a recordar velhas memórias – se é que ainda nos lembra de alguma coisa – como para ficar a dormir até ao meio-dia … se nos deixarem em paz. Além disso, podemos jantar às 6 horas para estar a roncar quando chegar a hora da telenovela.                                                                                              Para um elevado número, ser velho é de grande utilidade … para os filhos, quando estes precisam de alguém para tomar conta dos netos. Daí, é-se tanto mais útil quantos mais netos se tiver para tomar conta. Mas ainda é mais importante a utilidade quanto maior for o valor da sua pensão de reformado, para “reforçar” o orçamento familiar … dos filhos. Também tem grande importância para alimentar pombas e outras aves nos parques e jardins públicos, além de prestar ali um excelente serviço ao limpar os bancos com as calças sempre que se senta ou levanta …

Ser idoso tem, pelo menos, duas grandes vantagens sobre os jovens: Enquanto eles só têm uma dentadura em regra ele tem sempre duas. E quando está a ouvir uma palestra ou participar numa conversa de grupo que seja maçadora, como ouve mal, tem a possibilidade de “desligar” com facilidade e de se “ausentar” sem sair do lugar para não ter de escutar a conversa de “chacha”.

Ser velho é ter experiência, conhecimentos e sabedoria, algo que é muito respeitado e tem muito valor no Oriente, mas que cá entre nós, regra geral, não interessa nada a ninguém. É ter a certeza que as suas articulações fazem uma previsão do tempo muito mais exata do que o Serviço Nacional de Meteorologia. É poder viver sem sexo, mas não sem óculos. É descobrir que o investimento na apólice de despesas médicas começa a valer a pena. É estar seguro que os amigos já não revelam os seus segredos, por uma razão simples: não os conseguem recordar. É aprender que a hora de ir para a cama é três horas depois de ter adormecido no sofá a ver televisão. É saber que é conveniente adiar o mais possível a arrumação e limpeza do sótão ou da garagem porque, assim que o fizer, os filhos adultos vão querer lá colocar as suas tralhas.

Para um idoso e reformado, receber um valor mensal sem ter de ir ao trabalho é como passar de empregado a patrão, com uma semana de seis sábados e um domingo e por isso com a chatice de não ter tempo suficiente para fazer qualquer coisa, ainda que seja trocar a lâmpada que se fundiu. 

Porque, durante a semana, de segunda a sexta, não faz nada e ao sábado e domingo, descansa do trabalho da semana. Além disso, tem filas próprias, prioritárias, em muitas repartições públicas, que não usa para não o olharem como velho ou ficarem a resmungar por ter “passado à frente” dos outros que já lá estavam há horas. Mas bom, bom, são os descontos nos transportes públicos, museus e em muitos outros locais, quase sempre de cinquenta por cento, melhor do que os descontos nos supermercados do Pingo Doce no Dia do Trabalhador.

Está provado que o idoso devia voltar à escola e ter aulas para saber como ser um velho feliz. Na maior parte dos casos tinha um bem: já não havia a mãe para lhe puxar as orelhas se se portasse mal. Mas ia aprender a não se meter na vida dos filhos nem a dar palpites sobre o casamento deles, muito menos a tomar partido ou a querer interferir na educação dos netos. A conviver com a nora ou genro, pois foi uma escolha do filho ou filha. A não ser um velho rabugento, porque se já não querem um velho, quanto mais se for um chato que vive a falar do “seu tempo” e das suas doenças, de que ninguém quer saber nada. A desligar-se dos telejornais e das notícias chocantes que só o vão incomodar quando, afinal, não conseguirá resolver mesmo nada e a ver só o que o diverte e anima. E, sobretudo, a nunca deixar nenhum “problema” para os seus filhos, a ser alegre e agradecido por ter chegado a idoso, pois muitos outros ficaram pelo caminho e a deixar saudades quando partir, em vez de alívio por ter demorado tanto …

Sorria, faça sorrir, não deixe para ninguém “aquele vinho bom” que tem guardado para uma ocasião especial, pois ocasião especial é o dia que está a viver. Lembre-se que o cabelo grisalho já não se respeita. Pinta-se. E que andar de mota e beber umas cervejinhas com idade avançada dá a oportunidade de conhecer mulheres atraentes e muito inteligentes. Um amigo meu já conheceu assim duas médicas, quatro enfermeiras e várias socorristas do INEM …

Pois eu, que vivi em oito décadas diferentes, dois séculos diferentes e dois milénios diferentes, só tenho de estar grato a Deus e àqueles que me ajudaram nesta caminhada, apesar dos altos e baixos da estrada, por ter envelhecido. Foi uma dádiva que não rejeito, apesar de ter nascido numa sociedade rural, pobre e difícil, mas rica em valores. Sim, passei por muita coisa, mas tive uma vida maravilhosa. Pertenço a uma geração que viveu uma infância analógica e uma idade adulta digital. Pertenço a uma geração que viveu e testemunhou muito mais coisas que qualquer outra geração viveu em todas as dimensões da vida. E isso só foi possível por ter envelhecido, por ser idoso e chegar àquilo que sou, com orgulho e sem o estigma da palavra: Velho.

Há gente resolvida. Bem ou mal …

Há gente que, perante o vislumbre de uma oportunidade ainda que se possa dizer absurda, a agarra com as duas mãos. Aliás, é costume dizer-se que “o difícil faz-se e o impossível, embora com um pouco mais de dificuldade, também se faz”. E a prová-lo está esta história mirabolante que mais parece uma invenção fantástica do que uma história passada na Inglaterra, um país tido por bem organizado. Oh se é: “No exterior do England’s Bristol Zoo, dos Jardins Zoológicos mais velhos do mundo, existe um parque de estacionamento próximo com capacidade para 150 automóveis e 8 autocarros. Ora, durante 25 anos a cobrança dos estacionamentos foi efetuada por um cobrador só, mas muito simpático. As taxas, pagas em libras, correspondiam a 1,40 euros para os automóveis e a 7,00 euros para os autocarros.

Um dia, após 25 anos consecutivos e regulares sem nenhuma falta ao trabalho, o cobrador simplesmente não apareceu. Perante a ausência, a administração daquele Jardim Zoológico telefonou para a Câmara Municipal e solicitou que enviassem outro cobrador. Aí, a Câmara fez uma pequena pesquisa e respondeu que o estacionamento do Zoo era da responsabilidade do próprio Zoo, não dela. Então, a administração do Zoo reafirmou dizendo que aquele cobrador era um empregado da Câmara. E em resposta a Câmara escreveu-lhes que o cobrador desse estacionamento jamais fizera parte dos seus quadros e que nunca lhe tinham pagado qualquer ordenado …

Enquanto decorria esta troca de comunicações entre a Câmara e os responsáveis do Zoológico, descansando na sua bonita residência num lugar qualquer da costa do sul de Espanha, existia um homem que, ao que tudo indica, instalou no parque de estacionamento do Zoo uma máquina de cobrança por sua conta e então, com toda a naturalidade, começou a aparecer todos os dias, fazendo a cobrança e guardando as taxas de estacionamento, estimadas em 560 euros por dia … durante 25 anos!!! Considerando que ele fazia a cobrança todos os dias da semana, deve ter arrecadado algo como um pouco mais de 5 milhões de euros, isentos de impostos ou taxas. E o interessante de toda a história é que ninguém sabe o seu nome, nem quem é e nem sequer onde vive” …!!!

Se a história se tivesse passado num país africano, provavelmente os leitores teriam um pensamento comum: “Só em África”. Mas, não, isto passou-se no nosso Ocidente civilizado. Eu diria: “Chico-esperto” …

Da mesma forma, perante uma situação inesperada, há quem tenha boa capacidade de “desenrascanço” sem avaliar as consequências do meio usado para a resolver. E lembrei-me da história que aconteceu com um médico amigo aqui mesmo na nossa região e no improviso impensável para resolver uma “situação de urgência”:                                                                  No tempo em que a saúde pública fazia muita medicina ao domicílio, um médico local, na altura ainda jovem, antes de sair do Centro de Saúde onde trabalhava para fazer a sua ronda de consultas, mandou carimbar as receitas que entendeu necessárias para que os doentes, depois de consultados, não tivessem de lá ir fazê-lo e assim poderem aviá-las diretamente na farmácia. Nesse dia, como tinha um amigo mais velho já reformado sem nada para se ocupar e sabendo que ele gostava de dar uma volta, convidou-o para o acompanhar e também conversarem, o que fez com prazer. Numa das primeiras paragens, enquanto o médico entrou em casa do doente para fazer a consulta, o amigo ficou no carro à espera. Depois de acabada a visita, o médico regressou ao carro e encontrou o seu amigo meio constrangido e com uma novidade para lhe contar: “Doutor, o senhor desculpe, mas já não tem nenhuma receita carimbada”. “Mas o que é que aconteceu já que eu ainda só gastei 2 receitas”, perguntou o médico admirado. “Ó doutor, enquanto foi ver o seu doente o meu intestino deu-me sinal e eu não tive outro remédio senão ir ali atrás daquela árvore fazer o “serviço”. Como o único papel que havia aqui eram precisamente as suas receitas, tive de as gastar todas para conseguir limpar o rabo”. Incrédulo com a forma como as receitas tinham sido “aviadas”, ao médico (e amigo do aflito), não restou outro remédio senão voltar ao Centro de Saúde carimbar mais algumas porque as outras “já haviam sido duplamente carimbadas” e tinham perdido a “validade” para ser aviadas na farmácia” … Ainda hoje vejo o brilho nos olhos do médico sempre que falamos neste episódio caricato e absurdo com o amigo que, em “situação” apertada, soube desenrascar-se e que ele recorda como um acontecimento hilariante.                                                                         Se há pessoas que numa situação anormal bloqueiam e ficam sem capacidade de reação, há outras que veem logo uma oportunidade ou encontram de imediato uma saída ainda que não seja muito ortodoxa e são capazes de improvisar com um sentido de responsabilidade que deixa muito a desejar, embora consigam resolver os imbróglios que criaram com alguma despreocupação. É o caso do protagonista desta história incrível, ocorrida em terras africanas:

No Zimbabué, o motorista de um autocarro que transportava vinte doentes mentais parou no caminho para tomar uma bebida num bar ilegal. Ao regressar ao autocarro, descobriu que os doentes que era suposto levar de Harare para Beltway, tinham fugido. Não querendo admitir a sua negligência, o condutor foi até à paragem de autocarro mais próxima e ofereceu a todos aqueles que lá se encontravam uma viagem grátis. Assim, com o autocarro cheio, levou-os diretamente ao hospital psiquiátrico para onde devia ter transportado os 20 doentes com problemas mentais, agora fugitivos, informando os médicos logo à chegada que os doentes eram muito instáveis, com tendências para fantasias bizarras. 

Esta “cortina de fumo” lançada para encobrir a realidade, levaria a que a verdade só viesse a ser descoberta três dias depois” …