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Com esta burocracia, não vamos lá…

Há anos comprei um automóvel em Espanha e, para o legalizar, tive de ir aos serviços aduaneiros perto do aeroporto, numa sexta feira à tarde. Quando perguntei a um funcionário onde poderia tratar desse processo, informou-me que voltasse às nove horas de segunda feira e fosse a um guichet que me indicou. E eu voltei na segunda-feira e, às nove, já esperava que abrisse o tal “buraco”. Mas, nada. Nove e meia e continuava fechado. Quando vi um homem perto, perguntei-lhe se o postigo não abria. Ao saber para quê, respondeu: “Ah, uma guia de circulação? Vá àquele balcão”, apontando para o extremo da sala. E lá fui eu ao balcão onde me atendeu um indivíduo com cara de poucos amigos. Expliquei-lhe o que pretendia e tive logo a resposta: “Ah, uma guia de circulação!!! Tem de comprar o impresso naquele guichet”. E apontou-o. E lá fui eu parar onde não estava ninguém e esperei até aparecer uma senhora que ainda vinha a comer. “Ah, quer uma guia de circulação? Preciso dos seus dados”. E sentou-se ao computador. Enquanto escrevia, foi-me perguntando o nome, morada, bilhete de identidade, contribuinte e muitas outras coisas. Esteve tanto tempo agarrada ao teclado que até fiquei com medo de não ter dinheiro que chegasse para pagar impresso tão “importante”. Por isso, fui verificar quanto tinha na carteira pois, “pela aragem”, imaginei que fosse caro. Quando ela parou de escrever, ordenou-me: “Vá pagar àquele guichet e traga-me a guia de pagamento”, enquanto apontava para o seu lado direito. Lá fui, à espera que me saísse uma “conta calada”. Esperava-me um funcionário já entrado na idade que, muito educadamente, me informou: “São vinte cêntimos”. “Vinte cêntimos” perguntei muito chocado? “Não era mais económico ao Estado colocarem impressos em cima do balcão, de graça”? ”Não podemos fazer isso. Têm que ser vendidos. São as normas”, respondeu conformado com o sistema. E, de impresso na mão, tive de fazer novamente a rota das “capelinhas”, em sentido contrário …

Estes são os caminhos da burocracia estatal com que me deparei (quase) sempre ao longo da vida, quer a nível central, regional ou local, que complicaram tudo aquilo que deveria ser simples, fazendo (quase) sempre das instituições públicas um empecilho, quando deveriam ser uma ajuda. Não se pode negar que ao longo dos anos houve alguma evolução – e mau seria se a não houvesse com todas as novas tecnologias ao seu serviço. Mas a verdade é que, mesmo com o “Simplex”, a nossa vida ficou mais “Complex”. Cada dia há mais e mais exigências, novas exigências, os processos são mais volumosos, agora “alegadamente” por se tratarem de normas impostas pela UE (leia-se, Um Empecilho). Para tudo são precisas documentações, informações, autorizações, inspeções, certificações e muitos outros “ões”, cada vez mais caros, cada vez mais demorados, que fazem da vida um suplício. E nem adianta ter os “ões” no sítio ,.. 

Na época em que se fala tanto de descentralização, nunca vi na minha vida um estado tão centralista. De tal forma que, recentemente, tive de submeter um processo a uma entidade estatal no Porto. Apesar de terem técnicos qualificados, o processo foi enviado a Lisboa. Depois de registado, para minha surpresa, foi remetido para informação aos técnicos do …  Porto. Quando estes o informaram, o processo voltou a viajar até à capital, provavelmente porque se esqueceram “de lhe dar uma volta pela cidade”. E então, quando começou a estorvar em cima de alguma secretária, “fizeram o favor” de o remeter ao Porto, para a resposta vir a ser entregue ao interessado. Só foram nove meses de espera, o tempo habitual para uma gestação normal. E no que deu o “parto”? Uma informação igualzinha a … zero. Nove meses de tempo perdido nos longos caminhos de um estado enrolado em burocracia e de que nenhum partido, governo ou entidade se consegue livrar, para mal dos nossos pecados. 

Parece-me que, esta gente que nos tem governado, nem sequer tem a perceção dos enormes prejuízos que causa às pessoas, às empresas, à economia deste país e a quem precisa de trabalhar. Ou, se calhar, tem. Mas, como diz o ditado, “pimenta no c. dos outros é refresco…”. Por isso, estão-se borrifando. 

Quando me dizem que um processo meu tem de ir para uma entidade no Porto ou, especialmente, para Lisboa, vem-me sempre à memória a minha infância. Nessa época distante em que as comunicações e os transportes eram escassos e demorados, quando alguém dizia que ia a Espanha, toda a família se despedia dele porque não se sabia ao fim de quanto tempo se voltaria a vê-lo. E é isso que imagino quando um processo tem de ir a uma entidade no Porto. Mas, quando alguém ia para o Brasil, como o Zé da tia Quina, não era só a família, mas toda a aldeia a despedir-se dele, num “adeus até sempre” (verdade seja dita, nunca mais o vi), como se fosse a enterrar. Ora, é algo semelhante ao que acontece quando um processo tem de ir para Lisboa, essa Lisboa que para estas coisas parece estar mais distante do que o Brasil, esse Brasil para onde o Zé da tia Quina foi e nunca mais o vi. E então, se resolvem enviar o processo de uma entidade para outra e dessa para outra e assim sucessivamente, num carrocel sem fim onde ninguém decide coisa nenhuma, é perder a esperança de conseguir que algum dia lhe deem despacho. Fico com a sensação que é uma chatice muito grande o ter de assumir a responsabilidade de tomar uma decisão. 

Conta-se numa velha história militar que dois coronéis tinham o seu gabinete voltado um para o outro, apesar de estarem em edifícios separados e, como os gabinetes eram envidraçados, de um via-se o que se passava no outro. Um dos coronéis tinha a secretária coberta com rimas e rimas de processos, que se amontoavam também nas estantes à volta do gabinete. Pelo contrário, outro coronel tinha o seu gabinete sempre arrumado e livre de processos pois, em poucos minutos, despachava-os todos, independentemente da quantidade. Como não se conheciam pessoalmente, aquele que tinha o gabinete atulhado de papelada andava intrigado como é que o outro resolvia tudo tão depressa. Um dia ocorreu uma reunião militar no quartel e os dois coronéis acabaram por se conhecer. Então, o primeiro coronel aproveitou para perguntar ao seu camarada de armas como é que ele fazia para aviar a papelada e ter a secretária limpa e tempo para ler o jornal e sair antes da hora, enquanto ele fazia horas extraordinárias e nem assim se via livre dos processos. O outro coronel respondeu-lhe: “É simples. Em todos os processos que me chegam, eu despacho logo “ao cuidado do coronel Silva”. “Ah, agora percebo qual a razão porque me estão sempre a chegar montes de processos. É que, o coronel Silva, sou eu” …

Os governantes pedem aos portugueses aumento da produtividade para ajudar o país a sair da crise. Mas, um dos maiores empecilhos para se atingir a produtividade desejável é o próprio estado, apesar do anúncio de todas as reformas da administração pública de que já ouvimos falar há décadas e que nos trouxeram até aqui. Se o estado não é capaz de simplificar os procedimentos e ser uma ajuda para atingir tal objetivo em vez der ser um obstáculo, dá-me ganas de me tornar anarquista e pedir para nos libertarem desse fardo que é o controle estatal e assim acabar com as “burro…cracias”. Que saia do caminho e “nos deixe trabalhar”. Porque, na sua sabedoria, o povo diz que “não há nada mais prejudicial a quem trabalha do que aqueles que nada fazem” …

Só o miúdo diz a verdade: o rei vai nu…

Sendo uma noite em que punha um olho no computador e o outro na televisão, não pude deixar de ver o visual excêntrico de Conan Osiris, o nome artístico de Tiago Miranda, mais marcante pela originalidade do artefacto dourado que trazia na cara e que lhe conferia um ar de extraterrestre, no apuramento da canção que representará Portugal no Festival da Eurovisão. E ainda, aquela canção “estranha”, para não lhe chamar algum nome “estranho”, que veio a arrebatar, quase por unanimidade, os votos do júri e do público. Perante essa vitória esmagadora dos “telemóveis” e o entusiasmo gerado com a canção, que já acreditam ser das candidatas a vencer em Israel, confesso-me estupidificado, insensível e ultrapassado no que à música diz respeito e aos intérpretes. Ainda sou dos que pensam que a primeira coisa que uma música deve ter é “melodia”. E, como a não vi, provavelmente, confirma-se que estou mesmo surdo. Mas eu devo ser a exceção, pois todo o mundo achou que a canção “é o máximo”. Um comentador da ocasião diz que “é música do mundo, fruto da globalização acasalada com despudor em falar do que lhe vai na alma”. E mais: “é Bollyood, canto cigano, pimba, metal em simulador de instrumentos musicais para PC, é fado, quizomba e funaná”. É obra, conseguir ver tudo isto quando o autor diz “vou partir o telemóvel”. Radicalmente inovador. Acho muito curioso que a Simone Oliveira nem se quis pronunciar sobre a música. Só conseguiu dizer, muito diplomaticamente, isto: “Gostava de dizer que gostei, mas não posso falar de algo que não entendo”. Para ela, como para mim, esta canção “está muito à frente”. É preciso estar noutro “nível sensorial” para a entender. E, como é “diferente”, dizem ser “futurista”. Se é disto que o futuro nos reserva, eu quero ficar no presente …

Ouvi também alguns intelectuais da nossa praça “com credenciais”, a dizerem que “sentem coisas” que mais ninguém consegue sentir ao ouvir a música. Fico na dúvida quanto ao “sentir coisas”. A música, ou se gosta ou não gosta, ou fica no ouvido ou não fica. Um comentador mais tradicional, não se coibiu de dizer que, “se a música não for do gosto dos velhos, dizem que é boa; se é diferente (seja isso o que for) do resto do panorama da música pop, é boa; e se causa polémica, é perfeita”. Estamos a resvalar na escala do superficial e considera-se que tudo é “artisticamente justificável”, por mais absurdo que seja.

 Não sei se o Tiago vem de Israel com uma surpresa estampada no rosto, tal como a surpresa que teve ao ganhar na final lisboeta. Disse que era a coisa mais improvável que ele esperava que acontecesse. Tal como eu. Provavelmente, só os inteligentes a compreendem. Mas, na verdade, toda a gente (ou, pelo menos, muita gente) “diz” que a adorou. Ou se traz de lá uma mão cheia de nada com uma música que, a meu ver, depressa será varrida para o caixote do esquecimento.

É um sinal dos tempos, onde o que importa, é ser diferente. Gosto de ler um bom livro, com uma história, um enredo, um objetivo. Bem escrito. Já li uns quantos, sendo que há alguns de que gostei mais que outros. É natural, é o meu gosto pessoal a funcionar. Mas agora, tenho dado comigo a deixar livros a meio, por não contarem uma história ou não dizerem nada. Assim como um monte pedras nem sempre é uma casa, um amontoado de palavras também não é garantia de ser um bom livro. E isso também se passa no cinema, pois já se fazem filmes sem enredo, sendo o filme negro de João César Monteiro o exemplo máximo que conheço do “não filme”. Curiosamente, até foi financiado pelo Ministério da Cultura … será isso cinema?

Na pintura aprecio um quadro figurativo, que tenha como referencial a realidade. Não sendo um especialista na matéria, permite-me dizer se está bem ou mal pintado ao compará-lo com a realidade que pretende mostrar. Mas hoje, a maioria dos quadros são um jogo de cores, quando não pretos e brancos, onde cada um “vê” o que quer ver. Às vezes, parecem trabalhos de crianças em jardim escola. Não sei dizer se são bons ou não. Nem quero. São novas experiências, a rejeição do tradicional a favor do experimental, só porque sim.

Hoje as sociedades ditas civilizadas chegaram a um ponto em que já é difícil descobrir algo de novo, capaz de despertar interesse. Por isso, usa-se o absurdo para chocar, o ridículo para entreter, o anormal para atrair atenções. Basta ver os novos programas de televisão para percebermos até onde se caiu só para conquistar audiências. Verdade seja dita, há sempre quem alinhe, quem se submeta a ser exposto qual macaco em jaula, sem privacidade, dignidade e muito mais, em nome do mediatismo instantâneo e das audiências. É o vale tudo.

A história é antiga, mas adapta-se bem à realidade de hoje. Havia um rei muito vaidoso, que gostava de andar sempre bem arranjado e com vestimentas únicas e tidas como maravilhosas. Sabendo disso, dois aldrabões foram ter com ele e disseram-lhe: “Majestade, sabemos que gostais de andar vestido como ninguém e bem o mereceis! Por acaso, descobrimos um tecido muito belo, tão belo, que os tolos não são capazes de o ver. Com um fato desse tecido, Vossa Majestade saberá distinguir os inteligentes dos tolos, dos parvos e dos estúpidos que não servem para a vossa corte”. “Oh, tragam lá esse tecido e façam-me um fato, para eu saber quem me serve”, responde-lhes o rei. Os dois aldrabões tiraram-lhe de imediato as medidas e semanas depois apresentaram-se ao rei: “Aqui está o fato de Vossa Majestade”. O rei não via nada, mas como não queria passar por estúpido, respondeu: “Como é belo!!!”. Então, os aldrabões fizeram de conta que vestiam o rei e elogiaram a sua beleza: “Oh que elegante. Sereis invejados por todos”. A notícia correu pela cidade: o rei tinha um fato que só os inteligentes eram capazes de ver. 

Um dia o rei resolveu sair para se mostrar ao povo com o novo fato e toda a gente admirava a vestimenta, porque ninguém queria passar por estúpido. Até que, uma criança que estava pendurada na árvore, gritou: “O rei vai nu! O rei vai nu!”. 

Foi o espanto e a gargalhada geral …

Ao ouvir a canção de Conan Osiris e escutar cada palavra, fico com a sensação de que só pessoas muito inteligentes a conseguem “sentir” e compreender. Porque eu, estou como aquela criança pendurada na árvore. E também só me apetece gritar: “o rei vai nu”!!!

Gases com som e odor. Só falta a cor…

Pré-aviso: se é sensível a gases mal cheirosos, que é o mesmo que falar de flatulência, pare de ler e mude de página. É que este é um artigo de m. (para quem ainda não sabe, o m. é a forma recatada de dizer merda). Vire para as páginas da política ou do futebol, embora não seja garantido que o cheiro seja melhor …

Gosto de caminhar e faço-o por prazer, sem me sentir obrigado pelos benefícios que traz à saúde física e mental. E hoje, ao fazer o caminho do costume, dei comigo a observar-me e a sentir um alívio da pressão intestinal pela saída de gases através do “tubo de escape”, ao mexer o corpo à medida que caminhava. É que, como cada um de nós, carrego dia e noite uma “fossa séptica e uma rede de esgotos” de que não me consigo separar, nem a dormir. Assim, todos os homens ou mulheres, ricos ou pobres, feios e bonitos, pretos e brancos, altos e baixos, não conseguem fugir e cada um transporta a sua fossa para todo o lado, onde processa os alimentos que come, com muito ar à mistura, além de produzir outros gases através do metabolismo bacteriano desses alimentos no intestino. É por essa razão que temos necessidade de “largar umas farpas” diariamente, para aliviar a “pressão na tripa”. Faz parte da natureza humana e do animal que não deixamos de ser. Os “puns”, popularmente chamados de “peidos”, “farpas”, “traques”, “ameixas”, “bombas”, “tiros” e outros nomes mais ou menos ousados, são a “manifestação pública” do estado do nosso corpo. E, embora não sejam tidos por convenientes, são normais e necessários, um sinal do bom funcionamento do nosso organismo. 

Consideram os entendidos que cada pessoa dá em média vinte “disparos” por dia. Por isso, não se sinta mal e “dispare” também. É natural. Sabemos que é um tabu e a sociedade reprime aqueles que “soltam o escape” e deixam sair livremente os gases. Não é bonito e as mais elementares regras de educação mandam conter o “aperto” e fazer com que se dissipe no interior do intestino ou sorrateiramente se escape sem ruido e, se possível, sem odor. Por isso, na caminhada estamos à vontade para soltar o “foguetório” livremente, sem ter de olhar para o lado. Somos livres para nos vermos livres do “ar a mais”.

No Malawi, o parlamento criminalizou as manifestações públicas de flatulência através do “traque”, com o argumento de que “o governo tem a obrigação de garantir a decência pública e introduzir ordem no país”, tendo “as pessoas de controlar a natureza. Foi um hábito que só apareceu com a democracia, quando sentiram que podiam libertar gases em qualquer lugar”. Será que noutro regime não se podiam “peidar”? Assim, a flatulência virou ilegalidade e passou a ser crime. Só se pratica na “clandestinidade” … Vá lá. Aqui ainda não é crime!!!

Para quem é mais velho e tem algumas complicações, a produção de gases é maior e a dificuldade de “contenção” um problema acrescido. Um homem que sofria de flatulência e tinha de a “descarregar” com frequência, teve de fazer uma viagem de comboio. Para se precaver, escolheu uma carruagem vazia. No entanto, já com o comboio em andamento, entrou outro passageiro, que o deixou preocupado. Foi a medo que, quando lhe chegou a vontade, deixou escapar um “traque” silencioso e depois um outro em “tom baixo”. Como o tal passageiro não reagiu, ele apercebeu-se que devia ser surdo. Assim, à vontade, foi dando liberdade aos gases, contendo-se na intensidade sonora sem que o companheiro de viagem reagisse. Às tantas, o “traque” saiu qual “tiro de canhão”. O passageiro estremeceu e perguntou: “O que foi isto”? O autor do “morteiro” levantou-se de imediato, foi até à janela para disfarçar e respondeu: “Há trovoada. Foi um raio”. Muito intrigado, o passageiro levantou a cabeça, fez sinal de quem estava a cheirar o ar e retorquiu: “Então, deve ter caído em m. …

Se alguma universidade fizesse um estudo sobre os “peidos”, dividia-os em várias categorias e classes, a começar pelos “p. silenciosos” e os “p. sonoros”. Nos “p. silenciosos” consideram-se os “p. clandestinos”, de que ninguém se apercebe por saírem “à socapa” e sem qualquer odor para dizer “estou aqui” e os “p. anónimos”, também largados sub-repticiamente, sem aviso prévio, mas que descobrimos estarem à nossa volta pelo cheiro que nos invade o nariz. Nos “p. sonoros” há uma variedade maior. Começando pelos “p. musicais” que, conforme o maior ou menor aperto da “boca de saída” e do grau de intensidade na pressão interior do ar, podem ser mais agudos – daí os toques a “flauta” ou “clarinete” – ou mais graves, podendo ir do “saxofone”, ao “trombone” e à “tuba”, aquele som profundo que faz tremer a sala. Seguem-se depois os “p. militares”, que não passam de uma imitação barata do disparo de armas. O mais simples é o “p. tiro”, uma cópia do disparo de uma arma. Outro, é o “p. canhão”, fácil de reconhecer pelo estrondo. Além do “Bum” do “p. morteiro”, há o “p. metralhadora”, uma reprodução perfeita da rajada desta arma. Há ainda outros como os “motorizados”, pois o ruído que fazem quando “saem à rua” mais parece o de uma “moto” potente ou uma “motorizada” de 50cc …

Há ainda outros sem categoria definida, começando por aquele som que mais parece o “rasgar de calças”. Aliás, é a desculpa comum de quem deixa fugir um destes e é apanhado em flagrante. Agarra as calças pelo traseiro e, fingindo que se rasgaram, sai a correr da sala. Temos também o “p. fole”, aquele som que se assemelha ao soprar da forja e o “p. às prestações”, porque vai saindo aos bocados. Entre os “sentimentais” quero dar grande realce aos “sofredores”. Ao ouvi-los, sentimos o sofrimento e a dor, como quem está a parir … um “peido” doloroso. As lágrimas até ameaçam chegar-lhe aos olhos, se bem que os gases se escapam por outro “olho” …

Na disputa entre homens e mulheres para ver quem “fabrica” mais “gases”, ninguém pode dizer que ganha. Há um “empate técnico”. Uns e outros produzem o mesmo, embora as mulheres têm mais recato quando toca a pô-los cá fora. Aqui, devo fazer um ponto de ordem e recomendar que tenham cuidado com a utilização de qualquer chama quando está para se soltar um “traque”. É que, na sua composição há metano, esse gás poluente com elevado efeito de estufa e que é muito inflamável. Se a chama estiver na “saída do tubo de escape”, funciona como “lança chamas”, podendo o traseiro acabar tostado.

Lembro-me do Tónio acender um fósforo quando quis espreitar para dentro de uma fossa séptica. Tirou a tampa e ao meter o fósforo aceso dentro, incendiou o metano e deu-se uma explosão. Com o cabelo queimado, além da cara e pescoço, parecia saído da guerra. É o mesmo gás que a “fossa séptica” individual de cada um de nós produz …

Segundo o estudo de uma universidade inglesa, cheirar o sulfureto de hidrogénio, o gás que dá o cheiro a ovos podres nos “puns”, tem um efeito benéfico na nossa saúde, especialmente na prevenção de AVCs, artrite, doenças cardíacas e outras. A ser assim, em breve deveremos ver milhares de cabines espalhadas pelo país, alimentadas por gases de pessoas idosas. Ao comerem feijoada e dose reforçada de cebola, produzem gás suficiente para “inundar” as cabines onde o povo vai com regularidade cheirar os seus “puns”, em quinze sessões de vinte minutos, como quem vai à fisioterapia. E podem ir descansados para casa, porque não haverá AVC que lhes pegue. É um negócio de futuro … Será que a moda pega e vamos todos passar a cheirar os “traques” uns dos outros? Será que podem ser coloridos?  

“Estou contra. Mas quero ser um …”

Um velho amigo, dotado de uma filosofia muito própria, dizia-me que “por mais rico que fosse, a sua capacidade de comer estava sempre condicionada ao tamanho do seu estômago e não da conta bancária”. Queria ele dizer que não lhe adiantava ser muito rico, porque não era por isso que conseguia comer mais. E tinha razão. Com mais dinheiro come-se menos, mas paga-se mais. E alimenta-se muitos “comensais”. No entanto, assistimos a uma aceleração da concentração da riqueza de ano para ano e nada a parece travar. Os sistemas políticos em vigor são incapazes de implementar medidas sérias para evitar que os ricos sejam cada vez mais ricos e os pobres cada vez mais pobres, até porque não se entendem na tributação, são “manipuláveis” e acabam por concorrer entre si para captar capitais, concedendo-lhes mais e maiores facilidades. Veja-se o que acontece na União Europeia, onde a fiscalidade deveria ser igual para todos os países que dela fazem parte. No entanto, cada país aplica benefícios fiscais melhores que os seus companheiros de UE, para lhes “apanhar a clientela”. E, não satisfeitos com isso, até têm dentro das suas fronteiras paraísos fiscais onde não cobram qualquer imposto ou somente uma taxa ridícula. Em contrapartida, oferecem garantias de sigilo absoluto a todo aquele que pretenda ficar anónimo, protegido dos sistemas fiscais nacionais. Não há hipóteses! A economia vai ter sempre uma “saída de emergência” por onde os tubarões escapam ao fisco.

Vi as pequenas mercearias da minha infância serem “engolidas” pelas cadeias de supermercados, algumas feitas multinacionais de muitos milhões, que controlam o mercado da distribuição e esmagam bem os produtores. Vi as alfaiatarias de outrora virarem fábricas de confeção para depois passarem a depender de grandes empórios comerciais que nada fabricam, mas tudo vendem sob a capa de uma marca feita a peso de ouro. E pagando quando, como e o que querem, submetendo a legião de fabricantes que para si trabalha. Vi falirem bancos e deles nascerem golpistas milionários. Vi colapsar sistemas políticos que diziam defender as classes trabalhadoras e surgir “empresários” de ocasião que tomaram de assalto empresas estatais que se diziam “ao serviço do proletariado”. E fizeram-se novos ricos à pressa. E, tal como acontece no mar onde os tubarões “engolem” todos os peixes pequenos, em múltiplos setores de atividade as grandes empresas fizeram o mesmo. E “secaram” tudo à sua volta com base no poderio económico, na golpada, quando não no domínio sobre governos de países ditos soberanos. E assim foi acontecendo a concentração da riqueza, atingindo números absurdos. 

Quando lemos que no Brasil, cinco milionários têm tanta riqueza como mais de cem milhões de brasileiros, é sinal de que está muita coisa errada no país do “pica pau amarelo”. Mas pior está a nível mundial quando as estatísticas dizem que menos de trinta multimilionários têm tanto como 3,8 mil milhões de pessoas. Como é possível? Está tudo louco …

Após a crise, o crescimento económico foi parar ao bolso dos mais ricos. Houve mais concentração de riqueza e menos distribuição. O paradoxo é que nunca se produziu tanta riqueza e, ao mesmo tempo, nunca houve tantos pobres. E cada cidadão bem formado só pode estar contra esta aberração da sociedade que ajudamos a criar.

Perante esta realidade, a grande maioria das pessoas considera esta situação absurda e nem compreende como foi possível chegarmos lá, apesar dos políticos, de governos ditos democráticos, de reguladores e outros controladores que nada controlam. Somos todos do contra. É um escândalo mundial que ninguém devia ignorar, mas ignoramos.

Se calhar, apesar de não concordarmos por a riqueza estar tão mal distribuída (Francis Bacon durante o Renascimento, já dizia entre outras coisas, que …  “o dinheiro é como o adubo. Não é bom a não ser que seja espalhado …”), também não estamos muito preocupados com isso. Estamos nós empenhados em impedir que estes absurdos se tornem cada vez maiores ou, melhor ainda, vão diminuindo para números de razoabilidade e bom senso? Penso que não. Aliás, diria mesmo que a nossa preocupação é outra e isso pude observá-lo há alguns dias atrás. Ia a passar numa rua do Porto quando me deparei com uma longa fila de pessoas no passeio, à espera para entrarem numa determinada casa comercial. Como ia distraído, “feito parolo a olhar p’ró boneco”, não me apercebi do que se passava. Mas depressa percebi a razão daquela espera de pacientes para entrar na loja. E foi então que me veio à cabeça um pensamento revelador de que estava perante um contrassenso. É que, se perguntasse a todos as pessoas da fila se concordavam com a concentração de tanta riqueza em tão pouca população, de certeza que estariam radicalmente contra. Mas, todos eles estavam ali, naquela fila, para arriscar uns “euritos” com a esperança de que o “Jackpot” de mais de 160 milhões de euros desse prémio especial do “Euromilhões” pudesse vir a engordar a sua conta bancária e fazer deles mais um dos “nababos” que agora criticam, mas que, lá bem no fundo, anseiam ser. E alguém acredita que se essa “pipa de massa” saísse a qualquer um deles, iria ficar somente com o aceitável para ser remediado e distribuía o resto do bolo irmãmente entre os familiares e amigos, instituições sociais e humanitárias? Balelas. Basta vê-los quando sai um prémio taludo. O dinheiro faz com que briguem homens, mulheres, noivos e namorados. Escondem a identidade para que se não saiba a quem saiu, pagam para guardar segredo e até vão diretamente a Lisboa movimentar o “cacau” para conta privativa. Assim, fogem aos pedidos de esmola, empréstimos ou doações, pois tudo é pouco para a ganância que há em cada um de nós. 

Bem vistas as coisas, todos queremos ser um desses acumuladores de riqueza, que quase sempre só criticamos. Por … inveja. Tudo o resto, é conversa …