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Por muito que faças… nunca agradarás a todos

Quando andava na escola primária tinha sonhos e desejos como qualquer criança. Um deles, era o de poder agradar a toda a gente, de fazer um amigo em cada ser humano que viesse a conhecer ao longo da vida. Um sonho que não passou disso…

No mundo sempre existirão pessoas que nos vão amar pelo que somos, outras que vão nos odiar pelo que somos, outras ainda que terão horas em que nos vão amar e horas em que vão nos odiar pelo que somos e, por fim, gente para quem somos indiferentes. Quem agrada a todos? Sendo o que somos, seremos anjos para uns e demónios para outros… Se nem Deus conseguiu agradar a todos, acabei por concluir que não sou eu que vou tentar essa façanha…

Os seres humanos têm opiniões diversas, que se entranham em nós com base em aprendizagens passadas, cultura, religião, nível de escolaridade, etc.. Há quem carregue a ilusão de que, agradar a todos é o caminho para o sucesso profissional ou pessoal. Ser escolhido não é mau, mas o que é preciso é fazer escolhas. Até porque não é possível viver, ao mesmo tempo, em todos os lugares, jogar em todas as equipas e, muito menos, seguir diversos caminhos…

Andava a “matutar” nestas coisas quando, por acaso, recebi um email do meu cunhado que se encaixava nisto e que transcrevo:

“O dono de um talho foi surpreendido pela entrada de um cão na loja. Ele enxotou-o, mas o cão regressou.

Quando voltou a entrar, ia tentar espantá-lo novamente mas reparou que o cão trazia um bilhete na boca. Pegou no bilhete e leu: “Mande-me 12 salsichas e uma perna de carneiro”. O cão também trazia dinheiro na boca, uma nota de cinquenta euros.

Ele pegou no dinheiro, pôs as salsichas e a perna de carneiro num saco e colocou-o na boca do cão.

O talhante ficou muito impressionado. Como já estava na hora, decidiu fechar a loja e seguir o cão. Este começou a descer a rua e, quando chegou ao cruzamento depositou o saco no chão, pulou e carregou no botão para o sinal ficar verde. Esperou pacientemente com o saco na boca que o sinal fechasse para poder atravessar.

Atravessou a rua na passadeira e caminhou até uma paragem de autocarro, sempre com o talhante a segui-lo. Na paragem olhou para o painel dos horários e sentou-se no banco à espera do autocarro.

Quando o autocarro chegou, o cão chegou-se à frente para conferir o número, e voltou para o seu lugar.

Chegou outro autocarro e ele voltou a olhar. Viu que era o número certo e entrou. O talhante, boquiaberto, seguiu o cão.

Mais adiante, o cão levantou-se, pôs-se em pé nas patas traseiras e carregou no botão para mandar parar o autocarro, sempre com o saco das compras na boca.

O cão, com o talhante atrás, foi caminhando pela rua até parar junto de uma casa e pôr as compras no passeio. Então, virou-se um pouco, correu e atirou-se contra a porta. Tornou a fazer o mesmo mas ninguém respondeu. Contornou a casa, pulou um muro baixo, foi até à janela e começou a bater com a cabeça no vidro, várias vezes.

Voltou para a entrada e, de repente, um tipo enorme abriu a porta e começou a espancar o bicho.

O talhante correu até ao homem e impediu-o de continuar a bater, dizendo: “Deus do céu, homem, o que é que você está a fazer??? O seu cão é um génio!”

O homem respondeu: “Um génio??? Esta já é a segunda vez, esta semana, que este cão estúpido se esquece da chave!”

Moral da história???

Podes continuar a exceder as expectativas mas… a tua avaliação depende sempre da (in) competência de quem avalia. Quanto a isso… nada podes fazer”.

Eu acrescentaria que também depende de quem: Se é dos que te ama, dos que te odeia ou daqueles para quem lhe és indiferente.

Há pessoas a quem nunca vamos agradar, nunca. Da mesma maneira que gostamos mais de umas pessoas do que de outras, também existem pessoas que não gostam de nós, mesmo que não lhes tenhamos feito nada de mal. Só que, as pessoas são simplesmente assim… E se alguém não gosta de ti, o que podes fazer? Mudar-te? Deixares de ser quem és só para agradar? Tornar-te alguém de mil personalidades para te ajustares a todos? Nem pensar… Deixa-te estar e preocupa-te com os que gostam de ti, sendo tu o que és….

É que, do lado de lá, está muitas vezes alguém que te julga em função de múltiplos interesses, pessoais ou institucionais, visando ocupar o teu lugar, o teu espaço, com objetivos inconfessáveis. E se, ao fazeres aquilo que julgas certo em prol do que defendes, mexeres com interesses instalados, não tenhas ilusões, pois não estarás a agradar-lhes. Mas, por isso, vais deixar de fazer o que deves fazer?

Importante, importante, é estares de bem contigo, feliz contigo, fazeres aquilo que achas ser correto, importante para ti e para os outros e não aquilo que alguns querem impor que tu faças, que tu sejas. Por isso, meu caro,… não deixes de ser tu mesmo.

Os segredos escondidos nas gavetas

A gaveta tradicional, de madeira ou chapa, tem um simbolismo rico e variado, que utilizamos nas mais diversas expressões do dia a dia.

“Os da Fuseta, comem na gaveta” era uma expressão algarvia para criticar a “forretice” dos habitantes daquela localidade, frase essa que assentava na ideia de que os habitantes da Fuseta colocavam o prato na gaveta enquanto comiam. Se durante a refeição alguém batesse à porta, fechavam-na imediatamente e iam atender com a desculpa: “Eu convidava-o para jantar, mas já acabei”…

Na memória de miúdo vejo-me a tentar abrir umas grandes gavetas de madeira, sempre muito “perras” e “desconchavadas” porque se prendiam de um ou outro lado, sobretudo no inverno quando a madeira inchava com a humidade. Às vezes puxava, puxava e só vinha o… puxador. Em contrapartida, embora mantendo o essencial, hoje as gavetas têm calhas metálicas e deslizam suavemente, sendo o melhor exemplo as de cozinha que até têm amortecedor, pelo que se lhes dá um toque com a perna ou com a anca para fecharem e lá vão elas, docemente e sem ruído. Até dá gosto.

Nos gavetões (e nas arcas) guardavam-se as colchas de linho trabalhadas à mão, que passavam de mães para filhas, de filhas para netas e assim sucessivamente, como um tesouro hereditário, mas quando colocadas na cama pesavam tanto que se tornava difícil “dar uma cambalhota” entre os lençóis. Com a chegada das colchas de algodão e de seda passaram só a ser usadas na passagem das procissões, penduradas nas janelas e varandas, agora joias perdidas dum tempo distante.

Na gaveta (e no colchão) entre a roupa, guardava-se o dinheiro das economias de uma vida. Hoje já não há dinheiro para guardar e as gavetas também já não são usadas para tal pois os (poucos) que o têm, vão ao banco… levantá-lo, para o enterrarem no quintal metido numa lata… por segurança. É que as gavetas dos bancos já não são o que eram…

“Engavetados” estão alguns milhares de portugueses, muitos deles por serem apanhados a… “meter a mão na gaveta”, se bem que a grande maioria dos que fazem tal habilidade continua cá fora. Até estrangeiros lá estão, por se distraírem a apanhar sol ou a comer marisco cá para estas bandas sem terem meios para tal e, lá está, também meteram a mão na dita cuja.

Também “engavetado” foi Isaltino Morais, um político que até já foi ministro, por “branquear capitais” (pensava que só se branqueava a roupa) e outras habilidades que lhe permitiram ter uma conta choruda lá fora. Depois de um longo processo que andou anos e anos de gaveta em gaveta (nunca mais saía da gaveta) dizem que, para servir de exemplo, começaram por o mandar “engavetar” dez anos (para envelhecer como o vinho do Porto?). Mas o homem “tirou da gaveta” umas dúzias de recursos, uns atrás dos outros, e até parecia que nunca mais ia “engavetado”, conseguindo reduzir o tempo de “envelhecimento” para dois anos, que pode vir a encolher com a “lavagem”. O resto das “férias”, deverá gozá-las em casa, entre jantaradas e charutos, com a tal “massa” numa “gaveta” na Suíça.

Mas, dizem para aí as más línguas que, se a justiça funcionasse e passasse os políticos a “pente fino”, iriam “engavetados” um sim um não, se fosse a descer porque, se fosse a subir, era tudo a eito (escapavam os dedos de uma mão).

Noutros tempos, na gaveta da mesinha de cabeceira, por debaixo dos lenços e meias rotas, guardava-se a fisga e as cartas de amor atadas com um cordel, para ler à luz da vela na “calada da noite”, entre lágrimas de saudade. Agora, nessas mesmas gavetas, há jogos de computador, telemóveis e consolas, misturados com preservativos e pílulas para o efeito. As gavetas são as mesmas, só mudou o recheio…

Nos escritórios, as fichas e contas correntes dos clientes saíram das gavetas reais para “gavetas virtuais” no computador, diminuindo o papel e… os empregos.

A gaveta tem servido para guardar (e esconder) muitas coisas, até ideais e ideologias. Alguns dos nossos políticos até já conseguiram “meter o socialismo na gaveta”… para poderem “pescar” votantes noutras águas que não as suas (mais ou menos o que os homens casados fazem quanto deixam a aliança na gaveta ou no bolso, para tentar arranjar outro “cabide onde pendurar as calças”). Melhor que isso, talvez até extraordinário, foi o que F. Hollande fez em França, ao conseguir as duas coisas ao mesmo tempo – em relação ao socialismo, para “ver se segura o poder” e em relação à aliança, para “ver se segura os apetites”. Alguns curiosos das coisas dos espíritos dizem que, às tantas da noite, é costume ouvir-se uma voz, como que vinda de lá do fundo: “Sou o socialismo amordaçado. Deixem-me sair da gaveta…”

A mais recente funcionalidade dessa caixa está nalguns hospitais alemães (e já de outros países): Têm uma “gaveta” para as mães que querem abandonar os bebés poderem, anonimamente, aí depositá-los entre cobertores e almofadas, uma ideia louvável para substituir a “roda dos expostos” em S. Paulo e os caixotes do lixo ou os tubos de esgoto por esse mundo fora.

E, no fundo da gaveta, há projetos e processos que de lá não saem (uns por falta de coragem e outros por malandragem), promessas não cumpridas dos políticos, ideias e sonhos não apresentados por medo ou vergonha, antigas lembranças e velhas recordações, coleções começadas, a moeda da sorte, um rapa, um peão, berlindes, o primeiro canivete, um caderno de poemas com um trevo seco entre as páginas, às vezes até um “fundo falso”.

Bem no fundo da gaveta é possível encontrar de tudo, até mesmo um sonho esquecido por uma criança, quando saiu para crescer e ser adulto…

Os caminhos do (in) sucesso…

O general Colin L. Power dizia que “não há nenhum segredo para o sucesso. Que é o resultado de preparação, trabalho duro e aprender com o fracasso”. Para além disso, é uma questão de continuarmos sempre, mesmo depois de todos os outros terem desistido. Mas será mesmo só isso?

Há alguns anos atrás uma pessoa da minha família veio ter comigo porque queria comprar um loja. Conhecendo a sua juventude e interesses bem diferentes do comércio, perguntei-lhe o que é que tinha em vista com a compra da loja. “É para montar um negócio” respondeu-me. “Posso saber que negócio é?”, insisti eu. Disse que ainda não sabia, mas andava a pensar. “Talvez uma livraria ou uma loja de roupa de senhora”, respondeu na sua ingenuidade.

Como nunca a soube ligada a qualquer destas atividades, quis saber se tinha prática ou conhecimentos sobre estas áreas de negócio. “Não, mas arranjo uma empregada e eu sou a gerente”. “E tens dinheiro para comprar a loja?” questionei–a, já com os cabelos em pé. “Não, vou ao banco e peço um empréstimo” diz-me com cara de inocente.

Perante tanta insensatez, foi difícil convencê-la que não ia a lado nenhum: Não sabia que negócio montar, não percebia do negócio, não tinha dinheiro para a loja, o desastre seria total. Não foi fácil mas… evitei um insucesso.

Muitas vezes um negócio dirigido por uma determinada pessoa é um fracasso mas, quando muda de mãos, torna-se um sucesso, mesmo mantendo o ramo de atividade. Onde está a razão do êxito? Na diferente capacidade e preparação dos intervenientes? Em razões inatas num e noutro não? Há pessoas que nunca deveriam estar à frente do que quer que seja pois não têm capacidades para tal, servindo somente para… servir. Pelo contrário, outros há que parecem ter nascido para o negócio, tal a sua habilidade, capacidade, organização e inteligência. É certo que muito se pode aprender pela prática, mas há tendências inatas que ajudam ao sucesso.

Houve um tempo, não muito distante, em que muitos empresários bem instalados se viram confrontados com a vontade das esposas saírem de casa, trabalharem com eles ou terem uma atividade própria. Para as “não terem à perna” e as manterem ocupadas, havia que comprar uma loja e montar-lhes um negócio, fosse ele qual fosse. O importante era que não “chateassem”. Resultado: Prejuízos atrás de prejuízos mês após mês, ano após ano, uma “portagem” cara, às vezes demasiado cara, para pagar o sossego dele e o contentamento da cara-metade, que só terminava com o fecho da loja. E houve tantos insucessos…

Ter sucesso é uma questão de vontade, de aptidão natural ou capacidade adquirida? Descartes defendia a teoria de que já nascemos com determinadas habilidades e aptidões, mas havia quem preferisse a ideia contrária. Já Kant utilizou o melhor das duas teorias, afirmando que o conhecimento é resultado da experiência, mas assenta em capacidades que existem naturalmente em cada um de nós, sendo fazer o que se gosta meio caminho andado para o êxito.

O senhor António é comerciante há muitos anos em vários concelhos da região do Vale do Sousa, e nomeadamente em Lousada. Quando o conheci, depressa me apercebi de que estava perante alguém que nasceu “para o negócio”.

Com quatro anos de idade ia para as feiras com o pai e ganhava mais do que ele. Como era possível? Enquanto o pai montava a tenda e ia vendendo “qualquer coisita”, ele enchia uma bacia com água onde colocava um pequeno prato a boiar. Com uma garrafa de cerveja numa mão e outra de laranjada na outra, desafiava as pessoas a atirar uma coroa (moeda de cinco tostões): Se a moeda ficasse em cima do prato, recebiam uma das garrafas, se caísse na água, não ganhavam nada. Ora, as moedas batiam no prato e caíam todas na água. Ao fim do dia eram muitas, muitas, no fundo da bacia…

Já adolescente, bem sucedido e com banca própria de ferramentas, um dia estava na feira do Marco de Canaveses. À sua frente um feirante conhecido saldava camisolas a mil escudos mas, depois de vender duas ou três, vieram devolver-lhas porque a cabeça não entrava no buraco da camisola por ser muito apertado.

Desanimado, disse ao António: “E agora, que vou fazer às camisolas pois estão a devolvê-las todas”? “Se as venderes a 500 escudos ainda é negócio?”, perguntou-lhe. “Quem me dera”, respondeu o amigo. Então, arranjou um placard onde escreveu várias palavras e afixou-o em frente à banca do amigo. Rapidamente foram vendidas umas quantas mas os compradores não demoraram a vir reclamar pelo mesmo defeito. Já com um ar tranquilo, o vendedor limitava-se a apontar para o cartaz escrito pelo António, onde se podia ler em letras garrafais: “A 500 ESCUDOS – NÃO CABE NA CABEÇA DE NINGUÉM”.

O senhor António nasceu comerciante e, para tal, alia preparação, conhecimento e intuição natural ao ponto de “vender de tudo, mesmo aquilo de que as pessoas não precisam”. Este sim, é um homem que conhece os caminhos do sucesso.

O valor do pão, nosso em cada dia…

O pão, com toda a sua história e simbolismo, é o alimento base de toda a alimentação humana. É o símbolo da comida em todo o mundo, o alimento dos alimentos. Por alguma razão foi abençoado por Cristo e continua a ser consagrado na Eucaristia.

Nasci quando as gentes da minha terra eram alimentadas a pão e “caldo” (hoje pomposamente chamado de sopa), sendo poucas as famílias que comiam  “presigo”.

Ainda me lembro da minha avó debruçada sobre a masseira a enfiar as mãos na massa, feita com a farinha de milho que o moleiro levava lá a casa, a preparar as broas e metê-las no forno. A broa cozida e quente era, e continua a ser, um prazer para os sentidos, quer pelo paladar quer pelo cheiro. Cozia-se uma vez por semana mas havia quem o fizesse quinzenalmente ou com mais intervalo, chegando a comer-se broa já com bolor. Poucos eram os felizardos que comiam “molete”, o pão de trigo.

Quanto ao “caldo”, era feito com aquilo que cada um tinha, couves, feijões, batata, etc., e “adubado” com um pedaço de carne gorda da “caluba”, que em muitas casas dava para “adubar” o “caldo” a semana inteira. Como na maior parte das casas só havia “caldo” para comer, era servido em grandes “malgas”  bem cheias, acompanhado de um naco de broa.

Ninguém dizia em caso algum “não gosto”, nem sequer as crianças faziam perrices para comer. Tudo era bem vindo.

O meu colega João contou-me que, a primeira vez que foi jantar a casa do seu futuro sogro numa aldeia do interior da Beira Alta, serviram um prato de bacalhau. Não estando habituado a dispor de azeite à discrição, serviu-se copiosamente, de tal forma que, quando acabou de comer, o fundo do prato ainda estava coberto desse precioso alimento. Da ponta da mesa o pai da namorada deu ordens à empregada para o servir novamente mas o João agradeceu e disse que não queria mais. Então, o futuro sogro insistiu com a empregada em voz firme: “Serve-lhe mais porque, quem deita tanto azeite no prato é porque quer comer mais…”

Mas, a partir dos anos sessenta as coisas foram melhorando e, com a industrialização, criou-se e distribuiu-se riqueza, surgindo uma classe média que quase não existia.

Com isso, passamos a assistir à rejeição da herança e das lições de vida que o passado nos dera. A comida, que antes minguava na maioria das mesas, passou a sobrar, a falta rapidamente deu lugar ao desperdício, usando-se, abusando-se e dando aso a exibicionismos e competições entre vizinhos e familiares para ver quem servia mais, em quantidade, em qualidade e em extravagância. Perdeu-se a noção e o respeito pelo “pão”, um bem essencial à humanidade e não só a cada um, e até atingimos um ponto em que “qualquer operário deitava mais comida no lixo do que os ricos tinham antigamente para comer”.

Um húngaro radicado em Portugal dizia-me que não compreendia porque é que os pais se sujeitavam à chantagem das crianças com as birras que faziam para não comer, querendo outra coisa, quando não uma guloseima. Se o seu filho se recusasse a comer, guardava-lhe o prato no frigorífico e era isso que lhe dava quando tivesse fome.

Vivemos um período de grande desperdício de comida e de alimentos para a confecionar, sem sequer pensarmos que que aquilo que desperdiçamos faz tanta falta a outros seres humanos que nada têm para se alimentarem.

Impõe-se uma ética especial face aos alimentos, um respeito pelo seu uso, porque fazemos todos parte deste planeta onde a sua produção é limitada. Tem de se acabar com o desperdício para que haja mais para distribuir por quem nada tem. O desperdício não aproveita a ninguém e, regra geral, só alimenta estúpidas vaidades e exibicionismos patéticos.

Mas continuamos a esbanjar alimentos das mais variadas formas, agora até institucionalmente ao aceitarmos os prazos de validade inscritos nas embalagens como limite quando, na maioria dos casos, a sua durabilidade vai muito para além dessas datas.

Ainda há dias estive numa pequena festa de aniversário, onde a comida que se serviu dava para o triplo dos convidados. Dei comigo a pensar que, mesmo em plena crise, não interiorizamos que temos de começar por nós, por sermos capazes de moderar os excessos, acabar com o aparato das grandes mesas só para que se diga “que grande jantar”, “aquilo é que foi um casamento” ou “nunca vi um serviço tão bom”. Todos assistimos a esses exageros, com esbanjamentos desregrados que só nos diminuem e menorizam.

E que não seja necessário sentirmos na pele, ou melhor, no estômago, a verdadeira falta de alimentos, coisa a que não estamos habituados. É que, para mal dos nossos pecados, já há entre nós quem viva esse drama… Em muitos casos, pessoas que num passado recente também fizeram parte dessa legião que promoveu o desperdício.

Todos têm o direito ao “pão nosso de cada dia”, independentemente da raça, credo ou religião, mas temos de saber dar-lhe o seu verdadeiro valor e rejeitar o poder de estragar e esbanjar. Saibamos parti-lo e reparti-lo como um bem que não é nosso… mas que é de todos, mesmo daqueles que não conhecemos…

Orgulhosos de nós, não dos “chefes”…

Sabe-se que o ser humano é um produto dos genes e do meio em que é criado e eu reconheço-me como tal. Entre outras coisas, sou português, para o bem e para o mal, com tudo o que isso implica.

Entre as características de um (bom?) português, está o gostar de bacalhau, vinho e futebol, de ser refilão e derrotista, aquele hábito de dizer mal de tudo o que é nacional e, especialmente, de dar destaque a coisas menos boas como se elas fossem tudo o que nos identifica e não tivéssemos nada digno de realce. Houve momentos em que que não consegui libertar-me dessa influência e afinei pelo mesmo diapasão, erradamente.

Seja em que sector for, da justiça ao futebol, da agricultura à saúde, da cultura à cidadania, perante algo que não correu bem, lá vem o velho refrão: “Vê-se bem, é português” ou “já estamos em Portugal”, para não falar de outros bem menos simpáticos. E esta cultura do “bota abaixo” acaba por se virar contra nós próprios porque, ao dizermos mal do país e de tudo o que é português, estamos a dizer mal de nós próprios.

Nós somos nós e não outros. Somos pobres, quase tão pobres como antes de deixarmos a nossa “pegada” cultural e civilizacional pelo mundo, em povo, cultura, monumentos, língua, missão civilizadora. Mas temos imensas riquezas que tantas vezes não sabemos ver nem valorizar e de que só damos por elas, normalmente, quando estamos lá fora, longe, bem longe, tão longe que só a memória e o coração conseguem alcançar. Que o digam os emigrantes…

A modéstia e a humanidade, tão rara nos dias de hoje, o saber receber e dar atenção ao outro, o sol, a segurança e a paz, a fé num estado de direito, na liberdade, na igualdade.

Olhemos a floresta e não a árvore para nos apercebermos como é valioso e raro este cantinho à beira mar plantado, uma varanda privilegiada, tão privilegiada que até tem vistas para o mar, apesar de tudo, um canto sossegado neste mundo em guerras e convulsões permanentes, um oásis de sol, de paisagens, de produtos, de gastronomia e folclore, uma imensa praia com quase mil quilómetros de comprimento.

Ao que parece, há uma coisa que não temos: Dinheiro. Esses papelinhos mágicos que dão importância a países e a pessoas, que elevam a moral e a arrogância, alimentam o sonho e a ilusão, pelos quais se esquecem princípios e valores, se trai e se mata. Mas serão mais “paraísos” os que têm muito, como os países árabes (só pelo facto de, por acidente, nascerem sentados sobre “barris de petróleo”), onde as mulheres são “coisas”, onde a política é comandada pela religião, onde se criaram autênticas legiões de novos escravos sem quaisquer direitos e onde o fanatismo escraviza mentes?

Por alguma razão somos um dos cinco países mais antigos do mundo – estamos quase a completar novecentos anos de existência – e somos o país que tem a mesma fronteira há mais tempo, tempo esse feito de história, de uma grande história escrita com sangue, suor e lágrimas de homens corajoso, aventureiros, destemidos, reais, que fizeram coisas só comparáveis às histórias de ficção ou dos super heróis dos livros de banda desenhada.

O que é que tem de corajoso a ida ao espaço ou à Lua, depois de enviar lá várias naves não tripuladas e até uma cadela, testando máquinas, procurando soluções técnicas antes de enviar pessoas, em comparação com encher uma “casca de noz” feita nau, com  homens de verdade, dar-lhes mantimentos básicos para uns quantos dias e lançá-los a um mar desconhecido rumo ao imprevisto e à aventura, sem telefones, telemóveis ou qualquer outro meio de comunicação, sem mapas nem GPS, sem apoios de espécie alguma, sem qualquer noção daquilo que poderiam encontrar?

Se pararmos um pouco para refletir sobre a dimensão da aventura desses portugueses ficaremos muito aquém da realidade tal é o nosso distanciamento em meios de transporte e tecnológicos, em condições alimentares, higiénicas, sanitárias e de cuidados de saúde, em relação aos que existiam naquele tempo.

Mas a verdade é que “ELES” chegaram à Madeira, aos Açores, à Guiné, a Angola, a Moçambique, ao Brasil, à Índia e a Timor, para além de milhares de outros lugares de que a história nem fala, e fizeram de Portugal um país grandioso que passou a ser motivo de glória e muito mais… de inveja. Só faltou a este país encontrar dirigentes que fossem dignos continuadores da obra que “ELES” nos legaram… mas não tivemos, nem na monarquia nem na república.

Seria bom que deixássemos de nos lamentar como sempre o fazemos e usássemos tais energias para seguir em frente, valorizando tudo aquilo que pode e deve ser valorizado, em nós enquanto país.

Se na realidade não temos aquelas coisas que fazem com que os povos sejam (quase sempre) ricos, como o petróleo, o gás e outras matérias primas, em contrapartida tivemos uma grande abundância de políticos que nos prometeram “colocar o país no pelotão da frente”, fazer de Portugal “um país cor de rosa”, “um mundo de maravilhas” e “que íamos viver muito bem”. E não é que tinham razão!!!???

Os que prometeram isso, praticamente todos, ficaram mesmo a viver maravilhosamente bem… desde que se meteram na política. Só se esqueceram de um pequeno pormenor: De nos porem a viver tão bem como eles…