Monthly Archives: December 2015

Transportados no bico da cegonha…

Outrora, quando as crianças faziam a pergunta incómoda “de onde vêm os bebés?”, a resposta era quase sempre a mesma: “De França, no bico de uma cegonha”. As crianças viam satisfeita a sua curiosidade e estes ficavam aliviados torneando a questão. Ora, como ainda não deixei de ser criança e mantenho a curiosidade própria delas, resolvi fazer uma “visita” a essa “França” virtual, local de “origem de todos os bebés do mundo”, terra imaginária como aquela onde vive o Pai Natal. Para tal, “peguei na trouxa e zarpei…”, não a voar no trenó mas a “surfar” nas asas do pensamento.

Depois de uma longa viagem ao chegar, a primeira visão que tive foi de um cenário aterrador com imensas “unidades fabris” fechadas e abandonadas, muitas delas já cobertas por silvas e todo o tipo de vegetação que se foi apoderando do local, fazendo lembrar a zona do Vale do Ave e outras regiões do país na era pós industrial. Pelas ruas esburacadas vagueavam bandos de cegonhas “escanzeladas”, com as penas sujas e a cair, num sinal evidente da crise e do desemprego. Dirigi-me ao “posto de turismo” implantado na praça principal, também ele revelador da situação que a cidade vivia, onde me aconselharam a falar com o presidente da Associação Industrial de Bebés para colher informações. E assim fiz.

Começou por me dizer: “Aqui só fabricamos bebés “por encomenda”, sendo o prazo de entrega normal de nove meses. Só em caso de acidente ou percalço é que a entrega é antecipada. O bebé entra na linha de produção no momento em que o casal “sela” o pedido, sendo que muitas vezes o fazem sem saber, perdidos nos “preliminares”.

Longe vai o tempo em que todas as unidades estavam a produzir em pleno, quando a maioria dos casais encomendava um bebé por ano, chegando com facilidade à dúzia e mais. Mas, à medida que as sociedades foram evoluindo, as encomendas caíram e com ela a nossa produção, ano após ano, o que levou ao encerramento de inúmeras instalações, hoje votadas ao abandono. Tivemos de mandar para o desemprego mais de metade das cegonhas.

Sabe, noutros tempos, quando um qualquer casal de “clientes” se “envolvia em jogos sexuais”, havia fortes possibilidades de se concretizar a encomenda mesmo sem o desejarem, pois “trabalhavam sem rede” e, diz o ditado que “quem anda à chuva, molha-se”. Daí que “não tínhamos mãos a medir” para aviar tanta “solicitação” e, por isso, as unidades fabris estavam a funcionar dia e noite e todas as cegonhas eram poucas para as entregas. Só que, a partir do momento em que alguém descobriu a forma de transformar o “trabalho da encomenda” em “entretenimento puro” com vários tipos de “seguro contra imprevistos”, o negócio “foi à vida”. E, mesmo com a “encomenda” feita e já depois de nos ser “remetida”, vocês também arranjaram maneira de a poder suspender “no dia seguinte”, quando não mesmo uns dias ou semanas depois. Com tudo isso, o “negócio foi à vida”. Olhe, o vosso país passou a ser um dos piores clientes. Será por causa da crise, por falta de “caneta” para assinar o pedido ou pelos “custos que o produto acarreta depois”? Já não sei que lhe diga… Mas a grande quebra desta “indústria” deu-se quando os chineses foram proibidos de fazer só uma por casal. Está a ver o filme? Sempre que enviávamos um bebé para lá, “fechava-se” a capacidade daquele casal “assinar” novo pedido. E foram milhões e milhões de bebés que deixaram de ser produzidos, uma quebra brutal na “carteira de encomendas” que precipitou a “crise” já sentida nos países mais ricos – o que é um contrassenso. Com a “descoberta” das diversas “fórmulas” de impedir que pudesse resultar em “encomenda” o simples “molhar da pena no tinteiro”, os casais estabeleceram novas prioridades, que colocam o emprego, a carreira e o desejo de uma vida mais despreocupada à frente da paternidade, deixando esta para mais tarde e, quase sempre, reduzida ao filho único, quando não abdicam por completo. O inverso do que acontecia antigamente. E até os pedidos “acidentais” caíram muito comparados com os de outrora. Só para perceber como é que os “acidentais” aconteciam, deixe-me contar-lhe o que se passou há décadas numa aldeia de Lousada: Uma moçoila que ficara órfã vivia com a avó numa casa térrea e pobre, com “estrumeira” à porta da cozinha, onde se despejava tudo e “faziam as necessidades” na falta de WC. Em idade de namorar, a avó não lhe dava espaço e controlava-a totalmente, deixando-a falar com o namorado só da janela, enquanto ela vigiava noutra. Um dia a avó descobriu que a neta nos tinha enviado uma “encomenda” já há alguns meses… C’os diabos, “caiu o Carmo e a Trindade” e a avó só perguntava “como foi possível”? Mas foi, de forma simples e um tanto estranha. À noite, as duas rezavam o terço. Quando a avó dizia uma oração, a neta respondia com outra. Às tantas, a neta fez sinal à anciã que ia lá fora “fazer as necessidades”, mas a reza continuou. Enquanto da cozinha a avó dizia “Avé Maria…”, do lado de fora, na “estrumeira”, a neta respondia “Santa Maria…”. Só que, a “oração” da neta era outra… e, talvez por isso, foi “abençoada” com um bebé meses depois, para espanto da avó…

De “regresso” a casa, senti que o “tempo” das cegonhas trazerem os bebés de França, chegara ao fim. Como chegou o fim de muitos outros “tempos”…

O velho palito (um, só um…)

Os historiadores do palito (sim, também há destes historiadores…) dizem que o uso deste instrumento remonta ao tempo dos nossos antepassados mais “distantes”, segundo achados arqueológicos. Ora, o que nós sabemos hoje é que o nosso amigo palito (não o Manuel “Palito”, esse tem outra história…) é um pequeno pedaço de madeira, fino e afiado nas pontas, usado para retirar o “lixo” dos dentes. É certo que também os há de plástico – mas “valem poucas nozes”- para além de materiais nobres como prata e ouro, muito raros como se compreende… E, há alguns anos, até a unha comprida servia… Apesar da concorrência, por cá subsiste o hábito do seu uso regular, com preferência (quase) total para o palito de madeira. Se a madeira for macia, ajusta-se bastante bem aos intervalos entre dentes, molda-se, é menos agressiva mas, frequentemente parte e depois é uma “chatice” para retirar a ponta que ficou “entalada”. Já quando a madeira é rija, não se parte nem se molda mas, de vez em quando, juntamente com os detritos, “limpa” o “chumbo” de um ou outro dente, quando não o parte. É por isso que os dentistas desaconselham o seu uso mas, “cá para nós que ninguém nos ouve”, no seu íntimo até agradecem que o usemos regularmente porque é a forma de terem mais clientela pois, como dizem os “cangalheiros, “não quero que ninguém morra, mas quero que a minha vida corra”.

Foi o americano C. Forster o primeiro grande fabricante mundial desse pequeno instrumento- Depois de descobrir o encantador sorriso das mulheres brasileiras, descobriu também que isso se devia à higiene bucal que faziam com palitos de salgueiro. Foi aí que “viu” o negócio pelo que mandou fazer uma máquina para os produzir industrialmente, o que lhe valeu fama e fortuna. Para além disso, soube “vendê-lo” ao mercado ao ponto de se tornar moda palitar os dentes depois da refeição. Havia até quem se encostasse à entrada de restaurantes conceituados de palito no canto da boca, dando a entender que comera ali. O negócio deste pequeno “pauzinho” começou a cair quando se descobriu e tornou barato o fio de nylon (fio dental) e mais tarde, quando o hábito de palitar os dentes à mesa deixou de estar na moda e passou mesmo a ser considerado um gesto de mau gosto.

Uma das anedotas da minha juventude dizia que, “no tempo da outra senhora”, Churchill veio a Portugal a convite de Salazar e, no final do almoço, pediu um palito. Depois de o usar, embrulhou-o e meteu-o no bolso do casaco, para surpresa do nosso primeiro ministro. Ao jantar pediu outra vez um palito que voltou a meter no bolso depois de o utilizar. Salazar não comentou mas, quando estava nas despedidas no aeroporto a curiosidade venceu-o, acabando por lhe perguntar o porquê de guardar os palitos usados. E Churchill respondeu: “Sabe, quando chegar a Inglaterra, os palitos vão para as nossas fábricas, são lavados, esterilizados, embalados e vendidos para Portugal para voltarem a ser usados”. Salazar acenou com a cabeça, mas calou-se. Quando meses mais tarde retribuiu a visita a Churchill, depois da reunião e do jantar, às “tantas da noite” foram “às meninas” a convite do anfitrião. À saída, Salazar trazia o preservativo que usara, deu-lhe um nó, meteu-o num saco e guardou-o no bolso do casaco. O primeiro ministro inglês não se conteve e perguntou-lhe logo porque razão guardara o preservativo. Salazar também foi pronto na resposta: “Sabe, quando eu chegar a Portugal, isto vai para as nossas fábricas, será lavado, esterilizado, reciclado e embalado para ser vendido em Inglaterra como… “pastilha elástica”.

Apesar da modernidade nos ter trazido a escova de dentes, o fio dental (não, não é o “fio dental que alguns estão a imaginar…) e, mais recentemente, os pequenos escovilhões de limpeza que mais parecem miniaturas das escovas de desentupir canos, o palito continua a ser o instrumento preferido dos portugueses para cuidar do “corta palha” depois das refeições, mesmo contra as recomendações do “manual das boas maneiras”. Mas, “como é bonito” ver um homem a sair do restaurante com o palito na boca a dançar dum canto ao outro, enquanto fala ou ri!!! Deve pensar que é “decorativo”… No entanto, dizem que só o é se for aos pares e um pouco mais acima…

Nunca fui um folião nem usei qualquer máscara no Carnaval (já me basta a minha…), mas recomendo a todos aqueles que se queiram divertir no próximo ano, que se “disfarcem de croquete”. É uma máscara muito económica, perfeitamente ajustada aos tempos de crise que vivemos. Nem sequer precisam de ir às lojas da especialidade, pois podem prepará-la em casa de forma fácil e barata. Como é o disfarce de croquete? Muito simples: Nu e com um palito no rabo… E cada um pode escolher o tamanho do “palito”…

E isto do palito veio à baila porque, como já tenho um certo intervalo entre “as teclas”, no final das refeições retiro o “lixo” com o tal escovilhão. Mas hoje, quando comia um dióspiro, ao mastigar senti uma lasca entre a fruta. Quando fui ver o que era, deparei-me com um bocado de massa dentária, o vulgar “chumbo”. Recordei-me então que tinha usado um palito rijo numa limpeza de emergência. E limpei também o “chumbo” dum dente… Foi quando me veio à memória o conselho do dentista… mas já era tarde. Azar o meu … sorte a dele!!!

Estamos a enterrar a cabeça na areia?

Em 1902 o Príncipe Henrique da Prússia chegou a Nova Iorque, para receber o iate construído para o seu irmão que reinava na Alemanha, o Kaiser Guilherme II. À sua espera estava um batalhão de jornalistas com as perguntas mais estúpidas, como é da praxe. Às tantas, alguém perguntou: “O que mais gostaria de visitar”? Quando esperavam ouvi-lo dizer “as Cataratas do Niagara”, “o Grande Canyon” ou outra das grandes atrações do país, disse: “Gostaria de visitar o Everleigh Club de Chicago”. A resposta foi como uma bomba, deixando os jornalistas de “boca aberta”. É que, o Everleigh Club era ”o maior bordel da América”, talvez mesmo, do mundo. E na verdade, depois de cumprir todos os compromissos oficiais, o Príncipe foi presenteado com uma “noitada” na famosa “Casa de Passe”, sendo o convidado de honra de uma grande festa (a imprensa local chamou-lhe “orgia”) oferecida pelas duas proprietárias e irmãs. Para o Príncipe, foi uma data memorável mas, para as irmãs, a visita real não passou de um acontecimento agradável… mas vulgar. É que, durante os doze anos em que aquela “Casa de Alterne” esteve aberta, raras foram as semanas em que não recebeu todo o tipo de celebridades, desde atores, cantores, atletas das mais diversas modalidades, políticos e até bandidos. E lá estavam as “duas patroas” mais famosas da história da América para os receber. Como dizia I. Wallace, “para cada cavalheiro desejoso de se evadir através dos prazeres da carne, este clube não representava apenas uma casa de má fama. Uma vez lá dentro, o cliente libertava-se imediatamente de quaisquer preconceitos que pudesse alimentar acerca dos baixos intuitos comerciais das proprietárias. O ambiente, algo de intermédio entre um clube masculino e uma residência de damas de alta roda, proporcionava-lhe cultura, beleza, intimidade doméstica, bem estar… e havia ainda o prazer sensual, tudo estreitamente envolvido no véu do mais exótico romance. Desde o momento em que o freguês entrava no Everleigh Club, nenhum esforço era poupado para lhe cativar os sentidos”. No apogeu da fama e do negócio, a casa viria a fechar por pressão das reformistas, da chantagem desmedida de polícias e políticos corruptos (também os havia por lá…) e do cansaço das proprietárias na luta inglória contra forças tão poderosas.

Apesar de haver quem não a considere como tal, diz-se que a prostituição é “a mais velha profissão do mundo” e é exercida tanto em casas com todos os luxos, como era o caso, como nos casebres mais pobres ou nos lugares mais deprimentes. Atravessou os tempos, resistiu a leis severas, movimentos contrários, ataques policiais, prisões, “chulos”, à concorrência das “amadoras”, daquelas que dizem “que o não são”, aos chantagistas e todo o tipo de “intempéries”, sendo sempre “usada” por todos os que a combatiam. As leis que a regem foram mudando, com avanços e recuos em função da “ordem moral do momento” e do “poder reinante”, como agora nas chamadas “questões fraturantes”. Até 1962 havia regulamentos sanitários para a prostituição que impunham a obrigatoriedade de matrícula e porte de um livrete individual de registo de inspeções periódicas. A partir daí, a proibição não fez melhorar as condições sanitárias, muito menos as morais. Despenalizada em 1983, a prostituição não é legal nem ilegal, não existe na lei, está no limbo. Não é crime nem deixa de ser, está no vazio. O único criminoso é o “chulo”. Apesar das mudanças da lei, dos moralismos, do estigma, da intolerância e do controle social – e policial – continua a existir com a mesma força. E nem os defensores das “questões fraturantes” a aproveitaram como bandeira eleitoral… Pois, é um tema “sensível” em que os políticos não querem “tocar”, apesar de “consumirem à socapa” como os outros. Os defensores da legalização das “trabalhadoras de sexo” dizem que reduziria o tráfico de mulheres, combatia a violência, punha-as a pagar impostos e a ter direitos sociais, criava casas próprias para “prestar o serviço” (sugiro uma publicidade sugestiva como – “venha dar uma rapidinha low cost”) com controle sanitário que impedisse a disseminação de certas doenças, hoje “sem controle”. Mas os do contra, alguns que só usam enquanto for “fruto proibido”, dizem que só beneficiaria proxenetas, traficantes de seres humanos, exploradores de mulheres e até aumentaria a procura.

Certo, certo, é que a grande maioria dos homens, de todas as classes sociais, usa ou usou os “serviços” das “trabalhadoras de sexo para satisfação das suas “insatisfações”, num sinal de que “a democracia funciona” em pleno.

MAS FINGIMOS QUE NÃO VEMOS. Como nos abusos do poder, no assédio sexual, na exploração do homem pelo homem à conta da crise, na corrupção, em novas formas de escravidão e muitas outras indignidades e injustiças que se passam à nossa volta, fingimos que não vemos, fingimos que é normal e que não é necessário fazer nada.

Por isso, vamos continuar a fingir que não vemos aquelas mulheres e os seus problemas, assumidas “trabalhadoras de sexo”, mais ou menos “boas profissionais”, sem horário de trabalho e com “alojamento ambulante instalado” serra de Lustosa acima, como se não estivessem lá todos os dias faça chuva ou faça sol.

E fingimos igualmente que não vemos os seus inúmeros clientes incapazes de controlar os “apelos da carne”, gente que conhecemos bem e que vive no meio de nós…

Quem sou eu para saber por onde ir… O que sei, é que não podemos eternamente continuar a fingir que não vemos, feitos hipócritas, e continuemos a “enterrar a cabeça na areia, como a avestruz, à espera que a tempestade passe”. MAS NÃO PASSA…

A crise, a explicação e os “burros”…

Uma consultora financeira prestigiada explicou, de uma forma muito simples, a crise:

“Um homem apareceu numa aldeia do interior esquecido e ofereceu aos seus habitantes cem euros por cada burro, tendo boa parte da população vendido os seus animais.

No dia seguinte, voltou e ofereceu cento e cinquenta euros por cada burro, tendo outra parte da população vendido os seus.

Voltou um dia depois e, dessa vez, ofereceu trezentos euros por cada animal. O resto do povo vendeu os últimos burros que tinha.

Vendo que já não existiam mais burros na aldeia, o homem ofereceu quinhentos euros por cada um mais, dando a entender que viria na próxima semana.

No dia seguinte enviou à aldeia um cúmplice com os burros que tinha comprado, oferecendo-os a quatrocentos euros cada. Com a ganância de os vender a quinhentos euros na semana seguinte, todos os aldeões compraram burros a quatrocentos euros. Quem não tinha dinheiro, pediu emprestado. Como os burros não chegaram para a procura, foram comprar outros na região, endividando-se.

Como era de esperar, o fulano e o seu cúmplice desapareceram para gozarem o dinheiro que ganharam no esquema e nunca mais se ouviu falar deles.

Resultado: A aldeia ficou cheia de burros e de gente endividada.

E depois?

Os que tinham pedido dinheiro emprestado não puderam pagar os empréstimos por não conseguirem vender os burros, muito menos aos preços que tinham comprado.

Os que tinham emprestado o dinheiro queixaram-se à junta de freguesia de que, se não recebessem o dinheiro emprestado, não podiam continuar a financiar e a economia da aldeia ficaria arruinada.

Para que os prestamistas não falissem, o presidente da junta, em vez de emprestar o dinheiro aos aldeões para pagarem o que deviam, emprestou-lhes dinheiro a eles. Mas estes, continuaram a exigir os débitos aos aldeões a quem não perdoaram as dívidas, continuando assim endividados.

A junta de freguesia ficou endividada e, apesar de tentar empréstimos na região, não conseguiu com medo que ela não pagasse.

Os chico-espertos ficaram de papo cheio.

Os prestamistas continuaram a cobrar as dívidas e juros aos devedores e até ficaram com os burros já desvalorizados, que não foram suficientes para pagar as dívidas.

Muita gente ficou arruinada para a vida e sem burros. E a autarquia também.”

Esta explicação, apesar de se referir a outra realidade, não deixa de caricaturar a nossa história recente e, se quisermos ser honestos, podemos rever-nos em uma ou outra situação análoga. A inflação especulativa do preço dos burros traz-nos à memória outras inflações, outras valorizações rápidas que convidavam a comprar, comprar, comprar “outros burros”, fosse com o nosso dinheiro ou com dinheiro emprestado por privados ou pelos bancos, porque o “lucro” era “garantido, fácil e rápido” e seria uma “burrice” não se aproveitar a “maré de sorte”. E fizemo-lo com uma multiplicidade de bens móveis e imóveis, de bens reais e virtuais, ações e muitos outros “burros”, com os acostumados períodos de euforia e ilusão. Ah, e até se “investiu” dinheiro em “empréstimos” com rendimento “assegurado” de dez por cento ao mês, algo só suplantado em termos de velocidade do enriquecimento pelo euromilhões – só que é mais fácil sermos atingidos por um raio do que ser o sortudo da semana… E os resultados foram aqueles que todos nós conhecemos, que acabaram por “atropelar” uma grande maioria de nós, deixando-nos sem “burros”, sem os euros investidos, mas “carregados como burros” só que, de …dívidas.

No entanto, não fomos só nós, pessoas anónimas, que ficamos enterrados neste “negócio”. A lama “salpicou”, ou antes, “sujou” por completo a nossa “junta de freguesia”, apostada em “dar um passo maior que a perna” ao patrocinar “burros” que não eram necessários com dinheiro que não tinha, o que a deixou de cofres vazios, arruinada e em “falência técnica”, alguém em quem os “mercados” deixaram de confiar e de emprestar, rotulada pelos “donos disto tudo” com uma classificação que nos deveria envergonhar a todos: LIXO.

E os “prestamistas”? Na nossa história recente foram a cópia fiel da explicação da crise dada pela consultora, mas com um final que esta não previu: Os próprios “prestamistas” acabaram metidos no grande “atoleiro dos devedores”, como resultado de “negociatas”, desvios de fundos, créditos tão “mal parados” que dizem “não saber a quem” (mas sabe-se…), “buracos negros” que a “junta de freguesia”, já em falência técnica, teve de “tapar”, alegadamente para o “barco” em que navegamos não “ir ao fundo”. E é caso para perguntar: E os “burros”?