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São precisos dentes para ferrar … e sorrir

Dizem que o rosto, para além de ser o espelho da alma, é o nosso cartão de visita. Mas, sem uns dentes saudáveis e sorriso bonito, não há um bom cartão. Por isso, temos de ter diariamente uma boa saúde oral para manter o “corta-palha” saudável e bonito. Caso contrário, a saúde dentária pode complicar-se e podemos ter de “botar fora” uns dentes que tanta falta nos fazem. Antigamente, era em casa que se tirava o dente, amarrado a uma porta que se fechava com força. Hoje, já são os especialistas com técnicas avançadas para os arrancar sem dor, às vezes um a um até se ficar totalmente desdentado. Depois, é preciso dar resposta à necessidade funcional, estética, psicológica e de saúde, o que tem solução nas chamadas próteses dentárias, a que normalmente chamamos dentaduras.  

Sabe-se que o uso de dentaduras já vem desde há cerca de 3.000 anos segundo os historiadores, sendo feitas de uma grande variedade de materiais, a começar por dentes roubados de cadáveres. Ao longo da história usou-se a madeira, o marfim, a porcelana, o ouro e diversos materiais sintéticos. Os egípcios ficaram para a história como os precursores no uso de dentaduras, que eram feitas amarrando um dente ao outro ou nas gengivas com ouro ou arames. Já os maias esculpiam dentes em pedra, conchas ou ossos e colocavam-nos no vazio dos dentes. No Japão, esculpiam as dentaduras em madeira e na Europa Central usavam dentes de animais. E em França, começaram por as fazer com marfim de hipopótamos, elefantes e morsas e mais tarde em porcelana. Foi em 1820 que um ourives, para evitar que as dentaduras apodrecessem, fez a primeira em ouro. 

É óbvio que as dentaduras mais famosas da história foram as utilizadas por George Washington, o primeiro presidente americano. Perdeu cedo todos os seus dentes e a partir dos 49 anos de idade passou a usar dentaduras feitas de latão e ouro, de marfim de hipopótamos, elefantes e até dentes humanos, chegando a ter mais de meia dúzia de dentaduras. Mas também ficaram célebres os “dentes de Waterloo”, uma célebre batalha em 1815 onde morreram mais de 50.000 soldados, quase todos jovens e com dentes excelentes. Ora, os “catadores de dentes” que seguiam os exércitos e avançavam sobre os cadáveres para lhes arrancar os dentes saudáveis, tiveram ali muita “matéria-prima” que despacharam em barris para a Europa e Estados Unidos. 

Mas os materiais para o fabrico das próteses dentárias (dentaduras) e a tecnologia de fabrico evoluíram muito, para além da qualidade técnica dos especialistas e é por isso que hoje temos uma variedade grande que permite a alguém que não tenha um único dente poder recuperar o visual. Para isso existe a dentadura total, parcial fixa, parcial removível, semiflexível, implante dentário e outras mais.

Mas as dentaduras têm proporcionado histórias muito diversas, que vale a pena explorar neste pequeno artigo. 

E começo por o advogado conceituado cá da terra que discursava em plena campanha eleitoral para umas eleições autárquicas, quando viu a placa dentária saltar-lhe da boca e voar até junto da primeira fila daqueles que assistiam à sessão de esclarecimento. Sem se atrapalhar, interrompeu o discurso, apanhou a placa, limpou-a e, exibindo-a perante a plateia, disse com um sorriso nos lábios: “Terceira dentição”!

Também são muitos os casos de pessoas que ao tomarem banho no mar, quando atingidas por uma onda, caem e engolem água e ao abrir a boca para respirar, a placa dentária escapa-se e cai na água do mar sem hipóteses de recuperação, deixando-as expostas com a ausência total ou parcial da dentição, um incómodo para quem acontece, uma cena cómica para quem assiste pois é a dentadura dos outros. Maria ficou sem a dentadura assim, numa onda inesperada e ficou a chorar com a mão a tapar a boca. A amiga animou-a e fez com que fossem ao longo da praia para ver se o mar lhe devolvia o que lhe roubara. Foi com um certo entusiasmo que ouviram dois jovens dizer: “Olha uma dentadura”! Disfarçando, desviaram a atenção dos jovens, agarraram a dentadura e saíram dali. Quando já no autocarro, ao tentar colocá-la na boca, Maria descobriu que não era a sua. Afinal fora um idoso que a deixara na praia de prevenção para o mar não lha roubar, coisa que elas fizeram …

Um casal de idosos pobres entrou num café e pediu um cachorro, que dividiu ao meio quando chegou. Enquanto o velhinho comia, a mulher só olhava. O empregado condoído com a cena, foi junto deles e disse: “Se quiser, eu trago outra sanduiche para a senhora”. E ela respondeu logo: “Não, obrigado, não se incomode. Eu só estou à espera que ele acabe para comer a minha metade, mas preciso da dentadura dele. Nós usamos tudo a meias”!

Mas a história mais complexa por causa de uma dentadura aconteceu em Israel. Em 1948 Israel tornou-se independente, mas os árabes moveram-lhe uma guerra que acabaria anos mais tarde com a divisão de Jerusalém. Porém, ao fazerem a divisão no mapa, houve alguns metros que ficaram como terra de ninguém, onde nem os israelitas, nem os jordanos podiam entrar. No limite do lado de Israel havia um mosteiro e um dia quando uma freira estava à janela, começou a tossir. Num acesso mais forte de tosse, acabou por cuspir a placa para a “terra de ninguém”. Querendo recuperá-la pela falta que lhe fazia, foi ao ministério e disseram-lhe ser impossível entrar lá. Mas, depois de muita insistência, comovidos com o caso, entraram em contacto com os representantes da ONU e estes com a Jordânia. Só depois de muitas conversações acabaram por chegar a acordo, tendo-se reunido junto ao local um representante da ONU, outro de Israel e mais um da Jordânia, para entrar na “terra de ninguém” e conseguir recuperar a dentadura da freira, num registo fotográfico histórico. Dizem que as dentaduras são falsidades expostas sempre que saem do lugar, mas a verdade é que em grande parte dos casos resolvem com eficácia um problema múltiplo. E, não conseguindo ser o mesmo que a dentadura natural, conseguem recuperar o visual da pessoa e o lado psicológico de quem está parcial ou totalmente desdentado, o que às vezes é muito mais importante que tudo o resto …

E, se pensarmos bem, o uso de dentadura tem a grande vantagem de podermos escovar os dentes e cantar ao mesmo tempo!!!  

A barba dá um sinal de respeito?

Se eu usasse barbas, em certas ocasiões bem as podia “pôr de molho”, por questões de precaução. Mas não é o caso porque, desde que estes pelos que trago no queixo e face começaram a crescer, tive sempre por princípio não lhes dar tréguas e cortá-los em um ou dois dias. Só em três ocasiões tiveram possibilidades de aumentar um pouco mais, mas o máximo foram cinco dias para logo serem rapados rente. 

E isso deve-se à época em que vivi a minha adolescência, quando vigorava o visual do homem barbeado e higiénico surgido no princípio do século passado com a invenção das lâminas de barbear descartáveis, pela Gillette. Até então, e ainda vi muito disso, a barba era “desfeita” com “navalha de barbear” e era precisa uma certa arte para o fazer. Eu já comecei a fazer a barba com as tais lâminas descartáveis, muito finas e em aço, de dupla face, mas os mais velhos continuaram a manter a navalha tradicional. Já havia alguns homens que deixavam crescer a barba, mas nem todos tinham os cuidados higiénicos devidos pelo que de vez em quando, viam-se algumas “secreções” ou até restos de comida embrulhados no emaranhado de pelos e não era bonito de se ver. Nessas ocasiões lembrava-me de um provérbio árabe: “Se cuspo para baixo, cai na barba, se cuspo para cima, cai no bigode”.                                                                                         Ao longo da história e em diferentes culturas no mundo, aos homens com barba mais ou menos comprida, atribuíram-se qualidades como sabedoria, potência sexual e importância. Mas em determinadas eras e culturas, atribuiu-se a ela muita falta de higiene e ser própria dos excêntricos e preguiçosos. Mas, fisiologicamente, a função da barba é aquecer e proteger o rosto e filtrar o ar quando respiramos.                                                                                  São muitos os apelos ao uso de barba, tais como honra, sofisticação, independência, poder, afirmação e até para esconder a timidez. De artistas a ditadores, muitas foram as grandes personalidades que construíram a sua imagem com a ajuda dos pelos faciais. Daí que muitos tipos de barba foram batizados com o nome daqueles que tornaram um certo estilo popular. O cavanhaque longo é conhecido até hoje como barba à Van Dyck, em homenagem ao pintor holandês, tal como o bigode volumoso conhecido por Kaiser, em homenagem ao último imperador da Alemanha.                                                                                                              As barbas sempre foram usadas pelos povos árabes e religiões como o islamismo e o judaísmo ortodoxo, havendo alguns homens que envelheceram sem nunca as terem cortado sequer uma vez. Alguns (poucos), exibem-se levantando pesos pendurados nos pelos da barba. Como curiosidade, Charles Darwin acreditava que a barba evoluiu como um ornamento para atrair as fêmeas, como aconteceu com a plumagem dos pavões, o que me permite perguntar: “Será que os homens com barba atraem mais mulheres que os de cara rapada”? Há quem apresente estudos afirmando ser verdade, embora também existe quem defende o contrário. Certo é que a tradição espelhou a sua “sabedoria das barbas” nalguns ditados populares como: “Se a barba fosse sinal de sabedoria, o bode era profeta” ou até “homem barbado, homem honrado”. Como conselho avisado, ouvia eu: “Na barba do tolo aprende o barbeiro novo”. Enquanto o provérbio árabe previne: “Não apares a barba diante de duas pessoas, pois uma dirá que ainda está comprida, enquanto para a outra ficou curta demais”. As teorias sobre as barbas conferirem dotes especiais àqueles que as usam assentam em meras questões psicológicas ao argumentar que os homens com barba são considerados mais masculinos e saudáveis do que os totalmente barbeados. E até há quem seja mais específico e diga que “as barbas de 10 dias fazem com que os homens se tornem mais atraentes para as mulheres”, enquanto outros defendem que “as pessoas barbeadas têm menos atributos de masculinidade e são mais dóceis”. Além disso, os defensores dos barbados atribuem-lhes um ar de “respeito e poder”, de lhes conferir “maturidade” e até um sinal de “boa saúde”, dado que, historicamente, o pelo facial era terreno fértil para os parasitas e as consequentes infeções, pelo que, desafiar esses perigos usando barba era uma forma de demonstrar força e saúde, o que não deixa de ser estranhamente curioso. Claro que os opositores dizem que o uso de barba é a forma de disfarçar as imperfeições da pele, as marcas de acne, um rosto feio. Pessoalmente, nunca, mas mesmo nunca, senti necessidade de deixar crescer a barba para ser respeitado (nem nunca ouvi dizer que o tamanho do respeito era proporcional ao tamanho das barbas) ou afirmar a masculinidade e até gosto de ver certo tipo de barbas ou não as tivesse cá por casa …                       Historicamente, se houve civilizações, como no Império Romano, em que deixavam crescer longas barbas, também houve outras como os egípcios que consideravam os pelos do corpo e rosto desagradáveis. As barbas completas fizeram parte do homem na sua versão inicial e primitiva, pois nem tinha meios para rapar pelos e as preocupações eram outras. E nos últimos tempos, como tantas coisas na sociedade, estão em uso ou não em função dos “ditadores da moda”, em geral figuras mediáticas que, neste caso, resolvem ou não deixar crescer os pelos da cara e aos quais conferem um estilo e tipo de barba que será copiada rapidamente por milhões de “seguidores”. 

A partir de 2008, depois da crise financeira, notou-se uma mudança significativa na aparência do homem. As incertezas na ordem mundial pediam um homem com H maiúsculo. Essa volta trouxe consigo o uso das barbas como afirmação de masculinidade. A evidência mais óbvia viu-se nas celebridades de Hollywood, “mãe” de muitos modismos. De 2009 em diante assistiu-se a uma parada de atores usando barbas grandes e volumosas, como aconteceu com os tão badalados George Clooney e Brad Pitt, não demorando a virar moda graças ao fenómeno viral da internet. O rosto adolescente dos modelos depressa foi substituído por homens mais peludos e viris. Daí assistirmos hoje a um regresso das barbas, expressas numa enorme multiplicidade de estilos e tipos em função do gosto pessoal ou do seguidismo incondicional, até que as marcas de lâminas de barbear voltem à carga com a promoção da “cara lavada” e invertam o sentido da moda em prol do negócio…

Jô Soares diz que “um gordo, quando está a fazer dieta, faz sempre a barba antes de se pesar”, como se fizesse a diferença, enquanto Millôr Fernandes questiona: “Em 50 anos de vida, os homens gastam 80 a 100 dias a fazer a barba. Ignora-se o que as mulheres fazem com esse tempo” … Mas uma coisa diz o povo que nunca devemos esquecer, se não queremos ser apanhados “à falsa fé”: “Quando vires as barbas do teu vizinho a arder, bota as tuas de molho”. 

Já agora, coitado daquele que impõe respeito só porque tem barbas grandes …                                                                                    

A Luísa, para lá dos seus silêncios …

Quase sempre escrevo esta crónica com a Luísa a meu lado de olhos fixos na televisão, qual hipnótico, sem dizer uma só palavra a não ser que “puxe” por ela. E mesmo assim, a muitas perguntas a resposta é dada pelo acenar da cabeça, numa espécie de “preguiça mental” que certa medicação induziu e que só melhorou quando reduzida a dose. Mas, em muitas ocasiões sai do seu silêncio para nos surpreender. 

Na televisão decorria um desses concursos com perguntas de cultura geral. Para “puxar” por ela, nas respostas com escolha múltipla fazia questão de lhe perguntar qual delas achava que era. Como na maior parte das vezes nunca se decidia, eu ia respondendo a algumas. Para insistir na conversação, e como acertei nalgumas respostas seguidas, a senhora que a cuida depois do jantar, sugeriu que eu concorresse e que elas as duas iriam comigo ao concurso. Apesar de dar um ar de distraída, a Luísa encerrou a conversa: “Só que eu não sei assobiar”!!! 

Já lá vão quase catorze anos sobre o dia em que sofreu o primeiro AVC, que se viria a repetir quinze dias depois de forma mais violenta e com consequências graves na sua saúde futura. Apesar das grandes limitações, tem vindo a manter uma certa estabilidade nas rotinas às quais já há muito estamos adaptados. Mas, na perda da memória de curto prazo, na desorientação no espaço e no tempo e de uma quase ausência da realidade, não deixa de ser curioso, agradável e muito animador a conservação da capacidade de resposta pronta, mesmo quando aparenta estar recolhida nos seus silêncios, uma qualidade que sempre foi “uma das suas imagens de marca”. 

A Becas, a nossa cadela, estava deitada no ninho na posição em que costuma dormir, isto é, de barriga para o ar e com as patas dobradas, que é um sinal de que se sente em segurança no dizer de entendidos. A Alice quando a viu, disse: “Olá Becas. Tu estás muito à vontade …” E a Luísa acrescentou: “É a sua posição pornográfica” … Uns dias depois a Alice chegou junto de nós a queixar-se da garganta. “É catarro”, digo eu. E a Luísa, num sorriso: “Dou-lhe um conselho: não a deite fora” … 

Até de noite, quando tenho a certeza de que está a dormir, responde e não percebo como: Acordei e senti a Luísa a dormir profundamente a meu lado. Como precisava de um lenço de papel que estava no lado mais distante da mesinha de cabeceira e não querendo acender a luz do candeeiro para não a acordar, mesmo às escuras estiquei o braço com o intuito de chegar à caixa quando senti que toquei noutra coisa. Logo de seguida ouvi o barulho de um objeto a cair no chão. Era a garrafa de água que se encontrava no local errado. Mal ela caiu no chão com estrondo, a Luísa perguntou-me: “Estás a ver se consegues deitar a casa abaixo”? E no momento seguinte retomou a respiração ritmada e profunda, sinal de quem está a dormir muito bem … Ainda fiquei à espera para ver se dizia mais alguma coisa, mas continuou a dormir como se nada fosse.

Já num amanhecer, ao sentir que ela tinha acordado, acendi a luz do candeeiro, levantei-me e abri a persiana para deixar entrar a luz do dia. Sem mais nem menos, ouvi-a interrogar: “Vais sair pela janela”?

A minha cunhada Teresa vem cá a casa diariamente e é também uma das suas “cuidadoras informais”. Um dia cheguei a casa e soube que ela tinha levado a Luísa a passear durante a tarde, indo até Paredes. Para me meter com a Luísa, perguntei: “E viste muitas paredes”? Com resposta imediata, calou-me num instante: “Vi as que lá havia”!!!

Há ocasiões em que parece até que nem está a dar atenção nenhuma ao que se passa à sua volta nem ao que se diz, mas no momento certo intervém. Foi assim que ao mudar de canal, vi que o F. C. Porto estava a jogar com o Benfica para a Taça de Portugal. A Teresa apercebeu-se disso e perguntou qual era o resultado. Respondi-lhe: “Ao intervalo, o Porto está a ganhar por três a zero, mas vai jogar na segunda parte com menos um jogador”. E ela quis saber: “O que lhe aconteceu”? A Luísa, que se encontrava ao nosso lado e aparentando estar ausente da conversa, antecipou-se na resposta: “Foi à casa de banho” …

Uma cuidadora que nos ajuda em função das suas disponibilidades é a Alice e que tem por hábito tentar estimular a Luísa falando bastante com ela para a motivar e fazer sair do mutismo que lhe é habitual. No momento falava-lhe dum primo, bebé com dois meses e dele passar as noites a berrar. “E berra assim tanto?”, perguntou-lhe a Luísa. “Ai berra, berra”, respondeu-lhe ela, que mora a alguns quilómetros da nossa casa. E a Luísa não hesitou: “É que eu não o ouço” …

Numa dessas ocasiões, já cansada de a ouvir falar e sem vontade de participar na conversa, a Luísa mandou-a calar. No entanto, a Alice insistiu em provocá-la, mas ela voltou a dizer-lhe: “Cale-se”. Perante esta nova ordem a Alice perguntou: “Então quando é que eu posso falar”? E recebeu a resposta: “Quando se for deitar”!

Às vezes interrogo-me sobre esta sua capacidade de responder muito assertivamente quando nem sequer se esperava que estivesse a ouvir e fica-me a dúvida se o faz por instinto, num ato reflexo ou é mesmo o dom de ter sempre uma boa resposta na ponta da língua. Ainda hoje, enquanto falava com uma pessoa amiga junto da Luísa, usei o ditado “porque o seguro morreu de velho” e logo ela rematou: “mas morreu na mesma”. E desligou.

A meio da noite despertei ao ouvir a Luísa a perguntar-me: “Oh Zé, estás acordado”? Ainda bem ensonado respondi que sim. E veio nova pergunta: “E estás bem”? Respondi-lhe dizendo que sim e perguntei se ela também estava. Respondeu-me com um “sim, também estou”. Mas acrescentou: “Como dizia o meu pai, se não for mais, que seja sempre assim”. E em menos de um minuto a sua respiração voltou a ser o sinal de que já estava “virada para o lado que dorme melhor” …

Seis horas da manhã. Sinto a Luísa mexer-se e depois começa a falar: “Estão a doer-me os pés”. Levanto-me, acendo a luz e vou massajar-lhe os pés depois de aliviar a pressão da roupa naquela zona. E então ela concluiu: “Se calhar andei a correr à noite e não me lembro”! 

Para mim é surpreendente esta forma espontânea de dar respostas que eu não conseguiria, nem na forma nem no conteúdo, de alguém que permanece a maior parte do dia alheada do que se passa à sua volta. E mais ainda, quando está literalmente a dormir e é capaz de dizer algo ajustado ao momento, sem acordar, como um sonâmbulo. Mas sobretudo uma lição de que não podemos nem devemos desistir de ninguém na doença, por mais grave que seja a situação. Muitos médicos acham que os doentes em estado de ausência ou mesmo de coma, podem ouvir e perceber o mundo ao seu redor. Por isso é tão importante que haja alguém a cuidar, comunicar ainda que sem ter respostas, decifrar e interpretar as sensações e reações. Porque por mais “distantes” que estejam, as palavras sentidas de uma pessoa querida são um estímulo para continuar e um sinal de que não estão sozinhos nesta jornada terrena … 

Os homens já não engravidam como dantes …

Não tenham dúvidas e nem sequer fiquem chocados quando digo que “os homens já não engravidam como dantes” … Não estejam, pois é uma verdade comprovada, não por mim que sou um leigo na matéria, mas por reputados especialistas de diversos países. Todos eles são unânimes ao afirmarem que os homens têm vindo a perder, pouco a pouco, a capacidade de engravidar, tendo esse potencial caído para níveis preocupantes no mundo ocidental por razões que estão muito bem identificadas. (Faço aqui parênteses para clarificar aquilo que pode ser um mal-entendido pois, ao mostrar o rascunho do artigo a uma pessoa amiga, mal leu o título e o primeiro parágrafo, disparou logo: “Mas quando é que houve homens grávidos”? Tive de lhe dizer que o título ficou incompleto intencionalmente, pois falta-lhe a parte final: “Os homens já não engravidam como dantes … as mulheres”).

Presumo estarem a pensar que iria defender uma teoria mirabolante de que outrora havia muitos homens “grávidos” e que agora seriam casos raros. Ora não é o caso até porque, quando era adolescente, já corria o boato ou mito que o primeiro homem a ficar “grávido” iria ganhar “mil contos” por ser caso único – só não se dizia nem sabia quem pagaria tal importância ao primeiro “homem-mãe”. 

Mas voltando à questão, os especialistas dizem que há necessidade urgente de enfrentar o problema da quebra de fertilidade masculina e de se questionar a prática, cada vez mais comum, de submeter as mulheres a tratamentos caros e invasivos para tentar contornar a eventual falta de espermatozoides do homem. É um problema que nem sempre é fácil de encarar, dentro (e fora) de casa. É que, para o homem, descobrir que não é fértil pode ser uma revelação arrasadora ao fazer sentir a sua masculinidade abalada. Temos de concordar que há falta de sensibilização junto da população masculina para serem educados sobre a sua saúde reprodutiva, pois podem, por equívoco, considerá-la como um dado adquirido. E, homem com problema de fertilidade, é tabu, algo que fica encoberto pois põe em causa a sua virilidade. E é muito difícil para ele conseguir aceitar que não é capaz de dar um filho à sua esposa, isto é, engravidar … a mulher, mesmo nos tempos que correm, quanto mais quando o lema era “homem que é homem, é macho”. Estava fora de questão que a culpa de não terem filhos fosse dele. Era só o que faltava!!! Ainda hoje, quando o médico diz a um homem “você não está a produzir espermatozoides e não pode ter filhos”, é um choque brutal que pode até pôr em causa a relação.  

Nos Estados Unidos considera-se que um casal não é fértil depois de andar um ano a tentar sem uso de nenhum método anticoncecional e não conseguir engravidar. Estimam eles que, no país, 30% dos casos de infertilidade são apenas por fatores relacionados com o homem, outros 30% com fatores da mulher e os restantes dos dois. No mundo ocidental a qualidade e quantidade do esperma masculino estão num crescente declínio e pouco se sabe como melhorá-las.

Mas, afinal, quais são as causas principais desta considerável quebra tanto na qualidade como na quantidade do sémen humano sobretudo no ocidente, razão para os especialistas dizerem que, se não houver uma mudança nos hábitos, não entraremos em extinção, mas teremos cada vez mais “homens a não engravidar … as suas mulheres”? Todas as doenças sexualmente transmissíveis, o peso excessivo, a radiação celular provocada pelo contacto diário do telemóvel no bolso, alguns produtos químicos que se usam no dia a dia como detergentes, sabão e tantos outros, o consumo de umas quantas drogas como a cocaína, heroína e maconha, os efeitos maléficos do cigarro, do álcool ou ainda uma ou outra pancada mais violenta nos genitais, são fatores de peso responsáveis pela considerável diminuição dos espermatozoides no sémen, em número e qualidade.

No entanto, há mais, algo que nunca me passaria pela cabeça. Hoje, sabe-se que os órgãos produtores de espermatozoides necessitam de estar 3 a 4 graus centígrados abaixo da temperatura do corpo. Ora, enquanto o corpo se encontra a 36 graus numa situação normal, os testículos deverão manter-se nos 32. Assim, usar cuecas justas por razões de moda, sejam elas do tipo slip, boxer, sunga, samba canção ou outra ou permanecer longos períodos sentado, faz com que a temperatura dessa zona seja mais alta do que o recomendável, fazendo com que a produção dos espermatozoides seja afetada de forma irreversível. Ao que parece, sábios ou fruto das circunstâncias, eram os homens na minha infância e de antes, porque usavam cuecas largas de popelina, que permitiam um extraordinário arejamento da zona genital com o abaixamento da temperatura nas duas “unidades fabris”, permitindo que elas cumprissem a sua função de produzir espermatozoides, em quantidade e qualidade. Nos dias de hoje, este problema pode ser uma oportunidade de negócio para a indústria, se conseguir criar um “equipamento de climatização” capaz de conciliar a temperatura ideal para as duas “unidades fabris” com as exigências da moda no que diz respeito à sensualidade do visual das cuecas “justinhas”.

Será bom lembrar que, quando um casal tenta ter filhos e a “cegonha” não vem, ano após ano, chegou a altura de ouvir um especialista. E não existe culpa de ninguém quando o assunto é fertilidade. Se antes as atenções se viravam logo para a esposa, hoje a procura das causas centra-se no casal, pois cada vez mais o homem é afetado por várias condicionantes que o impedem de engravidar a sua mulher. Seria errado e injusto submeter a mulher a exames e tratamentos inúteis caso o problema esteja do lado do homem.

Claro que existem outros problemas a começar pelo adiamento para cada vez mais tarde da encomenda do serviço à “cegonha”, mas não vou aqui levar o assunto à exaustão, nem tenho pretensões para tal. E em jeito de remate, deixo o alerta aos homens que queiram ir para lá da “diversão” e passar à “fase reprodutiva”: Tenham atenção especial à temperatura do saco onde têm guardadas as “joias da família“. Não se esqueçam que deve ser bem arejado permanentemente – e não se pede para as pendurar à vista de todos – evitando roupa demasiado justa imposta pela moda. Caso contrário, podem correr o risco de ir parar à lista dos “homens que já não engravidam como dantes … as suas mulheres”!!!