Monthly Archives: September 2015

As voltas que a “moral” deu…

A senhora estava escandalizada e desabafava com amigas da sua idade, falando sem parar do que vira nas noitadas e manhãs de rescaldo das Festas Grandes de Lousada. Indignou-se com o elevado número de jovens bêbados a arrastarem-se pelos cantos, estendidos atrás de sua casa e a fazerem “tristes figuras”, muitos deles que “ainda nem teriam quinze anos de idade”, que a levava a questionar “como é que os pais o permitiam” e porque seria que as autoridades não intervieram para “impedir o atropelo da lei, fechando os olhos à venda de bebidas alcoólicas a menores”. Contou ainda dos olhos vidrados dos fumadores de “charros” mas, a sua maior revolta, era pelas “poucas vergonhas” daqueles (e eram muitos) que não se inibiram de fazer sexo “à descarada”, tendo mesmo “esbarrado” com um casal em pleno “ato” na entrada de sua casa, sem que a sua presença os incomodasse ou fizesse deixar “o serviço a meio”. “Já não há moralidade nenhuma”, rematou.

Moralidade significa a adesão aos costumes considerados essenciais para a saúde e preservação da sociedade. Uns, não passam de convenções (mais praticados do que pregados) mas outros são vitais para o bem comum (mais pregados do que praticados), uma espécie de obrigações que reclamamos dos nossos vizinhos, mas às quais não nos subordinamos. A história diz-nos que as alterações económicas da vida das pessoas determinaram também mudanças no código moral. Acompanhei essa evolução com a passagem da “sociedade agrícola” para a “sociedade industrial” e “pos-industrial”. Nestas mudanças, a moral, que tinha uma variação lenta, foi sacudida pela tempestade dos tempos e alterou-se profundamente.

Quando nasci, a agricultura ainda era o suporte da economia e da vida da maioria das pessoas e a moral impunha a castidade, a monogamia sem divórcio, o casamento indissolúvel, a proibição de relações sexuais antes do casamento e o ter muitos filhos (que eram sinónimo de mão de obra gratuita). Com o aparecimento das fábricas, homens e mulheres foram “enfiados” em barracões onde passaram a travar lutas diárias com máquinas cada vez mais complexas, tantas vezes em espaços mal iluminados e sem condições, mas onde se exigia mais e mais produção em processos repetitivos e penosos, que afetaram a conduta humana. E, com a saída das mulheres de casa para as fábricas, ter filhos deixou de ser uma riqueza e passou a ser um problema. A necessidade de reduzir a prole fez surgir os contraceptivos e o sexo deixou de implicar reprodução para se tornar entretenimento e prazer, com alteração profunda do código moral.

A industrialização provocou o crescimento dos centros urbanos, que criaram todas as dificuldades para o casamento e todas as facilidades para o sexo. A repressão do desejo, possível na sociedade agrícola, tornou-se difícil numa sociedade que retarda o casamento e, inevitavelmente, a carne rebela-se e o controle de si próprio fraqueja. O cavalheirismo e a galanteria da minha infância não sobreviveram à emancipação feminina. A castidade, que era virtude, passou a motivo de zombaria e o pudor desapareceu. O homem passou a gabar-se da variedade dos seus pecados e a mulher reclamou um padrão de vida igual, sendo-lhe permitido um rosário de aventuras que tornaram comuns as relações sexuais antes do casamento. Foi assim que o velho código moral caiu aos pedaços e o mundo urbano alterou os seus julgamentos.

Leibnitz dizia que “casar-se é um ato que requer uma vida inteira de ponderação”. E os rapazes acabam por concordar com ele, de tal forma que muitos ponderam tanto, que morrem solteirões. O “dar o nó”, que antes era a forma de contentar a carne e estabilizar a conduta humana, perdeu interesse entre os candidatos, ao verem que as suas vantagens podiam ser conseguidas sem o seu ónus.. Assim, o casamento não só encurtou no início, com o atraso na idade de casar, como no fim, com a simplificação do divórcio.

O surto fabril aglomerou milhões de criaturas no anonimato protetor da vida citadina, emancipou a mulher com experiências (e práticas) sexuais antes do casamento abertamente aceites, com a benesse do avanço nos métodos contraceptivos. A riqueza afrouxou a rigidez do código moral (é que a pobreza facilita a virtude e de muitas tentações se livra o homem pelo facto de serem caras). Se antigamente se discutia se era pecado segurar a mão de uma rapariga, o pecado, hoje, é deixar fugir a oportunidade de a segurar…

Do ponto de vista moral, a visão é feita em função da idade pois condescendemos (e praticamos) enquanto jovens e pregamos quando velhos. Apesar dessas alterações profundas, os que, como eu, já perderam a mocidade mas ainda não enquistaram na velhice, devem tentar compreender os jovens e aceitar a mutação permanente da moral – cada vício já foi uma virtude e pode voltar a sê-lo, como o ódio se torna respeitável na guerra. Aceito com naturalidade a evolução dos códigos morais (não querendo com isso dizer que são melhores ou piores) mas já fico preocupado com os sinais de “amoralidade”, de ausência de moral que vamos encontrando aqui e ali, um caminho perigoso para a saúde de qualquer sociedade.

Entre muitas outras razões, admiro a minha mãe por ter uma capacidade invulgar de tolerância e aceitação das alterações a que assistiu ao longo de noventa e dois anos. Encara sempre uma nova situação, por mais insólita que seja, com naturalidade, e acha que a nossa consciência é o melhor livro de moral… e o menos consultado.

As semelhanças entre (des)iguais…

Vem aí o dia quatro de Outubro. Ao que parece, vamos ter dois grandes eventos nacionais no mesmo dia (há defensores dos dois lados de que um é mais importante do que o outro): Eleições e jogos da Liga ou seja, Política e Futebol. Ora estava para aqui “a pensar com os meus botões” que estas duas coisas, aparentemente muito diferentes, na prática têm tanto em comum que até parecem ser “farinha do mesmo saco”. Vamos colocar-nos de fora, à distância, para observar e ver estes dois “gêmeos” que arrastam multidões, suscitam paixões, movimentam milhões, se pintam de cores, incitam sentimentos díspares e geram vencidos e vencedores.

Encontramos nos estádios (e na rua) os adeptos do futebol vestidos com as camisolas e cores do clube, fazendo uma algazarra danada com buzinas, apitos, bombos e todo o tipo de instrumentos ruidosos e, com o mesmo aparato, os militantes dos partidos nos comícios (e na rua) produzem o mesmo “folclore”, cada um deles com as suas frases de incitamento, as suas bandeiras, os seus slogans, os seus insultos, os seus cânticos e hinos de glorificação que reproduzem nas redes sociais, a sua “diarreia verbal”. Uns e outros, transformam homens simples, jogadores e políticos, em ídolos, heróis e santos, que idolatram e, se lhes for dada oportunidade, carregam às costas como se de deuses se tratasse. Andam em rebanhos como carneiros, incitando-se e protegendo-se mutuamente porque a força do “grito” ou do insulto é sempre mais violenta “à molhada”, em claques organizadas. É certo que a paixão do adepto de futebol ajuda e incentiva os jogadores e, consequentemente, o clube, mas não tem poder sobre o resultado final, enquanto nas eleições, a paixão dos militantes, as ações e manifestações, exercem influência no campeonato eleitoral…

Já alguém comparou os três partidos do “Arco do Poder”, PS, PSD e CDS, aos três “grandes” do futebol em Portugal, Benfica, Porto e Sporting, sendo este comparado ao CDS nas reduzidas possibilidades de chegar ao poder, o mesmo é dizer, a campeão.

Comum à política e ao futebol é aquilo de que tanto se fala “à boca pequena”, que todos sabem que existe: CORRUPÇÃO. Um tema em destaque nos últimos tempos num e noutro “campo” e que não dá sinais de abrandamento. Mas também existe uma palavra que repassa pelos dois lados com frequência, aliás, demasiada frequência: LADRÃO… Ora, se as palavras corrupção e ladrão são comuns tanto na política como no futebol, há a certeza que em seu redor existe um “lubrificante” especial que circula em grande quantidade, na casa dos milhões (não, não são milhões de adeptos ou de militantes), daquilo que o povo diz ser “com que se compra os melões”: DINHEIRO… E a chatice é que o dinheiro é uma tentação para “o mais pintado”…

No futebol é vulgar os dirigentes contratarem jogadores “à revelia” do treinador, tantas vezes por razões inexplicáveis, ficando este com a obrigação de os “encaixar” na equipa. Ora na política, quantos governantes não têm de “engolir” a contragosto inúmeras “avécolas” que não passam de “zeros à esquerda”, mas que lhes são “impostos” pela “máquina” do partido a que devem obediência? Também é sabido que os políticos gastam demasiado dinheiro no curto prazo, pondo em causa a sustentabilidade da freguesia, da cidade ou do país, só para ajudar a ganhar as eleições (é por essa razão que hoje estamos como estamos), não sendo muito diferente nos clubes da bola pois os dirigentes dos clubes, para serem eleitos, gastam o que não podem e o que não devem só para agradar aos adeptos, pois estes só aplaudem se houver resultados positivos. Faz-se a analogia entre os dois ao dizer que “os políticos são como os treinadores de futebol, sempre apaixonados pelo lugar que ocupam e sempre de malas feitas”. Por alguma razão, à medida que um primeiro ministro promete “crescimento económico”, o povo é levado à zona de “descida”.

No futebol os jogadores atacam, defendem, fintam, tentam enganar, querem protagonismo, falam e não dizem nada, acenam, batem palmas, agradecem, abraçam, insultam, cantam, são vencedores ou vencidos mas o dinheiro continua a “correr-lhes nos bolsos”, nalguns casos em “quantidade escandalosa”. Ora, não será que todas estas “virtudes” se adaptam textualmente aos políticos, de tal forma que, às tantas, nem sabemos dizer se estamos a falar de uns ou de outros?

Bom, não me vou alargar mais nas coisas comuns entre “as partes” para não ter de as equiparar às “nádegas”: Tão iguais que, se não fosse um sinal aqui ou um pelo ali, teríamos dificuldades em distingui-las…

Como estamos a dias de ter de escolher entre “ir à bola” ou ir votar (e podemos até ir às duas), será bom que falemos de paixão, emoção e racionalidade. O futebol, dizem os “filósofos da bola”, é paixão e emoção no essencial, com uma grande dose de irracionalidade. Ora no dia quatro de Outubro, quando tratarmos de eleições, estamos a falar de “contratar funcionários” para nos prestarem determinados serviços durante quatro anos. Os serviços são bem remunerados, têm mordomias e eles ficam com uma “procuração” nossa para fazerem “o que bem entenderem” com o país. Será que o devemos fazer com base na emoção e na paixão “clubística”, lutando e torcendo pelo clube, aliás, pelo partido? Ou devemos fazer a escolha racionalmente, com base na qualificação, no conhecimento, na capacidade e na seriedade do trabalho e das propostas? Uma “procuração” destas não deve ser dada por paixão mas por ideias. Votar é ser responsável por quem se quer “contratar” para exercer o poder. Por isso, vamos lá deixar a paixão para o futebol… E, como diz o povo, “o que é preciso é ter confiança, fé em Deus e estupidez natural”…

Abaixo as dietas, viva a “barriguinha”…

Assumo que, desde que deixei de fazer exercício com regularidade, naquele lugar onde devia estar a minha cintura tenho aquilo a que vulgarmente chamamos “pneu”. É por isso que o meu filho costuma pôr-me a mão na “barriguinha” e dizer com ar de gozo: “Dá a bola aos miúdos”. Não é a maior provocação que já ouvi sobre as “saliências abdominais”. Há dias entre amigos, a “boca” foi para um deles, de barriga mais dilatada: “No cemitério, a árvore faz sombra ao morto”… Também se conta que um homem com barriga muito “respeitável”, semelhante ao protagonista de uma das crónicas anteriores, estava a fazer o seu “chichi” encostado a uma parede. Um garotinho inocente que ia a passar olhou e gritou: “Eu vi a “coisa” daquele senhor”. O homem com toda a calma, fechou as calças, tirou uma nota de cinquenta euros e disse ao garoto: “Rapaz, pega lá esta nota pois viste algo que eu já não vejo há anos”…

Depois do “metrossexual” e do “lambersexual”, a nova moda masculina que, dizem, está a fazer sucesso na terra do Tio Sam (para satisfação delas), é a dos “dad bod” e o mesmo é dizer que a gordura voltou a ser sinónimo de formosura. Acabaram-se os arrependimentos por ter comido uma piza ou um “Big Mac”, um daqueles hambúrgueres com maionese, molho de tomate e muita batata frita. Chega de ficar de consciência pesada por ter bebido umas “cervejolas” e comer uns petiscos apimentados. Elas dizem que os “dad bod” com as suas “barriguinhas”, são homens mais normais, mais naturais, muito melhores a abraçar, que não enganam e nas fotografias fazem com que as mulheres pareçam ainda mais bonitas, para além de… terem “melhor desempenho”. Se isto não é o suficiente para “cultivar a barriguinha”, do que é que precisamos mais?

Claro que hoje a sociedade “persegue-nos” e “combate” de forma persistente esta “cultura física”. Os profissionais da saúde e todos os organismos que os superintendem fazem imensas campanhas contra, aconselhando-nos a beber muita água e não bebidas alcoólicas, a comer menos carne, mais peixe e fazer exercício. Ora, afinal a baleia só bebe água, só come peixe e faz natação o dia inteiro e o que é ? GORDAAAA!!! Também nos aconselham a comer menos pão e batata e comer legumes, muitos legumes verdes. Ora, o elefante também só come verduras e o que é? GORDOOOO!!!

Já não podemos escolher o que queremos ser pois, em todo o lado, somos “violentados” pela nossa opção. Todos têm uma dieta para promover o nosso bem estar, melhorar a nossa condição física, que nos querem vender a toda a força. São os médicos, os nutricionistas, os herbanários, a rádio, a televisão, as revistas da especialidade e todas as publicações dedicadas às mulheres a “impingir-nos” a dieta ideal, com as frases mais estúpidas como “emagreça comendo de tudo” (que é como quem diz, passando fome), “emagreça dez quilos em sete dias” ou “perca a barriga em cinco dias”. Também fazem questão de nos convencer a fazer exercício, muito exercício e com regularidade, como caminhar, que é muito importante para a nossa saúde. Ora, “se caminhar fosse saudável, os carteiros seriam imortais”…

Uma sexóloga brasileira publicou um artigo aconselhando as leitoras a namorarem com “barrigudinhos”. Diz ela que tem muitas vantagens como “nunca pedirão um sumo mas sim uma cerveja ou um copo de vinho”, “não tiram a camisa para dançar feitos idiotas, querendo agradar à garotada da plateia”, “nem ficarão preocupados com as calorias das refeições que elas fazem”. Ter barriguinha quer dizer que gosta de cerveja e vinho, de confraternizar, de fazer festas (e mulher faz parte) e gosta de ver televisão enrolado no sofá… Para além do mais, homem com “barriguinha” é mais confortável. A barriguinha oferece um conforto especial, pois é uma almofada que pode ser moldada conforme a cabeça dela…

Um estudo efetuado numa das universidades da Turquia revelou que os homens com barriga têm uma melhor “performance sexual”. E esta? Já estou a ver esses atletas que “malham” forte para terem uma “tábua” a fazer de barriga, a diminuírem os treinos e começarem a comer “fast-food” para fazerem crescer a “curva da felicidade”.

Para os homens que fazem questão de “cultivar” a barriga, o maior ídolo é o … Homer Simpson. Ele tem o estilo “pai de família”, uma barriguinha peluda, fofa e macia muito agradável para abraçar, aquilo a que as mulheres chamam “a almofada do amor”, que esconde um pedaço de felicidade.

Já o humorista brasileiro Chico Anísio dizia que “o exercício é o primeiro passo para a morte. Sai dessa enquanto tem saúde”. E “raramente se conhece um atleta que tenha chegado aos oitenta anos”. Fazia uma comparação interessante ao dizer que “a tartaruga, com toda aquela lentidão, vive trezentos anos, mas não se conhece um só coelho que chegue aos quinze”.

Homem com barriguinha é alguém que gosta de comer e beber, não perde um bom prato de rojões, feijoada ou cozido à portuguesa. Aprecia o presunto e o salpicão e faz questão de promover a gastronomia nacional. Com isso, dá um contributo generoso ao desenvolvimento do país. Não dizem para aí que estamos a precisar de crescimento (e não me refiro à barriga)?

Ah, e não fique chateado se passar a vida inteira gordo. Vai ter toda a eternidade para ser só osso!!!…

Do tamanho da vaidade ou da realidade?

O meu carro vai a caminho dos quinze anos, uma idade muito bonita para quem tem a missão de me carregar quase todos os dias. Mas não tem sido fácil continuar a conduzir um carro que “está ultrapassado”, “fora de moda” e “não condiz com o meu estatuto”, na versão de um vendedor mais aguerrido. Geralmente não seguem a via de me quererem vender um meio de transporte mas antes um “estilo de vida” adequado ao “nível social”, daí usarem os argumentos mais incríveis dentro desta linha de pensamento. E, porque alguém conhecido tem carro novo, estimulam-me a comprar uma “máquina” igual ou mesmo superior, para lhes “fazer ver”. Lembro-me até de uma pessoa amiga me dizer: “Você anda para aí num carro que qualquer trolha tem…”

Confesso que ao longo destes quase quinze anos de relação com o meu automóvel, de que só me afastei temporariamente quando um encapuzado me encostou uma arma à cabeça e “convidou” a entregar-lhe as chaves, tendo mesmo disparado uma “bojarda” para o ar no sentido de me “apressar” a satisfazer tão “delicado” pedido, estive algumas vezes tentado a trocá-lo e comprar outro mais atual, não por que me tenha dado problemas de maior mas “levado” pelos “tais” argumentos e alimentado por uma “vozinha” interior que não é mais do que a vaidade que existe (também) dentro de mim. Mas, como o carro continua a levar-me a todo o lado, nessa luta interior entre a vaidade e o bom senso este tem conseguido vencer fazendo com que o mantenha como parceiro. Mas é uma luta que nem sempre é fácil…

Muitas vezes, com o carro tentamos mostrar aquilo que temos (e somos) ou o que gostaríamos de ter (e ser), sendo o “fato” onde fazemos questão de nos “vestir”, independentemente de estar ajustado ou não à nossa condição. Quantos não compram carros tão sofisticados que não chegam a saber para que serve um grande número de comandos do veículo? Quando um dia perguntei a um amigo para que era um determinado botão no tablier do seu carro, respondeu-me: “Não sei e nem lhe mexo porque posso estragar…”

Construi a minha casa há quarenta anos e, ao fim de vinte cinco convenci-me que deveria realizar obras de fundo e torná-la bastante maior, com divisões mais espaçosas, tendo mesmo chegado a fazer um anteprojeto. Depois de vários estudos… fiquei por aí. Quando a minha mulher adoeceu verifiquei que cometera muitos erros ao projetar a casa, especialmente nos espaços de circulação, nas casas de banho e largura de portas, pelo que realizei algumas obras para a tornar mais cómoda e funcional. Tal como tem acontecido com o carro, também na história da casa o bom senso ganhou a batalha sobre a vaidade. É certo que ao longo dos anos caí na patetice de construir anexos e mais anexos como “acumulador de lixo” que sou. Sim, porque os anexos quase sempre servem só para isso. E não fiquem dúvidas pois, por maiores que sejam, arranja-se sempre “tralha” para os encher, ficando a faltar anexos para o muito “lixo” que fazemos questão de acumular…

Hoje dou-me por feliz por não ter feito crescer a casa como cheguei a projetar porque, apesar de manter as dimensões originais, tornou-se grande demais para as nossas necessidades. Se a tivesse aumentado, pior seria…

Projetei, desenhei, construi, aconselhei, comprei e vendi bastantes habitações, moradias ou apartamentos e raramente os interessados pediam para que fossem mais pequenas. Queriam sempre maior, mais espaçosa. É um desejo quase instintivo, embora costumo dizer que quantos mais metros quadrados tiver a casa, mais cara é. Mas, tal como com os automóveis, a competição com os outros, mais do que a necessidade, levou a exageros no tamanho e no luxo, que custaram muito dinheiro (que nem sempre se tinha) e hoje continuam a custar muito caro em impostos e manutenção, agora que o dinheiro encolheu e os filhos saíram de casa, fazendo-a parecer ainda maior…

E ainda há outro problema: Regra geral os filhos não estão interessados no “casarão” porque é grande demais, está desatualizado e nem querem assumir os encargos que tais “palácios” acarretam pelo que, muitas vezes, não se vislumbra futuro na família para a “casa da família”. Ainda há dias ouvi esse desabafo de alguém que está nessa situação, inconformado com tal realidade…

Os antigos tinham um ditado que dizia (e diz), “casa quanta caibas, terra quanta vejas”. Nós rejeitamos esse legado e invertemos a teoria, fazendo crescer a “barraca” muito para além das necessidades e da comodidade e agora “torcemos as orelhas” de arrependimento ao olhar para as contas do aquecimento, do IMMI, da eletricidade, do jardineiro, da manutenção e do trabalho que dão. E até há momentos em que se fica a pensar como seria cómodo viver numa casa pequena e acolhedora…

Esta necessidade das casas “encolherem”, deve ser fruto das “lavagens” que nos fazem, da “água” que os nossos governantes meteram e o resultado das “tesouradas” nos salários, nas pensões e nos subsídios. Ou ainda, que começamos a pôr um pouco de juízo na cabeça e vamos perdendo a “mania das grandezas”, tão desajustada da nossa realidade?…