Falava-se sobre as vantagens e inconvenientes de ser homem ou mulher e, apesar de estarem três mulheres cá em casa e eu ser o único do sexo oposto, no meio da conversa assumi uma vontade: se um dia vier a reencarnar e puder escolher, não quero ser mulher. Claro que tive de me haver contra a argumentação da “oposição”, o que não foi nada fácil pois, como se sabe, é difícil combater a sua dialética. Nada tenho contra as mulheres. Pelo contrário. Devo até confirmar que continuo a gostar muito do sexo oposto e não alinho em modernices nem “mudo de clube”. É um gosto para a vida. Para debate tão desequilibrado tive de usar argumentação forte, mas não as convenci. Reafirmaram que querem voltar como mulheres. Quem sou eu para as contrariar…
As mulheres acham-se sonhadoras, vaidosas, apaixonadas, bonitas e meigas. Muitíssimo mais do que nós. Fica-lhes bem defender a classe. Deve ser por isso que “enfeitam” carros nas exposições ou aparecem sempre que há promoção de chocolates, perfumes e outras coisas doces e bem cheirosas… E nós? Somos feios, brutos, desarrumados, forretas e chatos, e passamos a maior parte do tempo a pensar em sexo (como sendo obsessão masculina). Eu sei que a sociedade é mais tolerante com elas, talvez por serem tidas como o sexo fraco. Começa por lhes facilitar a vida ao terem sempre alguém que lhes abre a porta, as deixa passar à frente e até paga as contas, um “encargo” que fica ao nosso cuidado. Veja-se que, quando são traídas, o homem é um canalha, mas se o traído for o homem, é promovido a “corno” enquanto “o diabo esfrega um olho”. Ou seja, o homem é sempre o mau da fita, o bode expiatório, seja culpado ou inocente…
Eu gosto de ser homem porque entendo um jogo de futebol e não faço perguntas estúpidas como “o que faz aquele senhor vestido de preto com apito na boca”. Além disso, três pares de sapatos são mais do que suficientes para viver sem stress e nem tenho de experimentar vinte peças de roupa na loja para comprar só uma … ou nenhuma. E, além disso, para fazer uma viagem de cinco dias só preciso de levar uma mochila… se for sozinho. Se acompanhado da mulher, não sei se três malas grandes serão suficientes… Às vezes penso que devem levar nas malas alguma mobília de casa…
A conduzir, deteto quando um pneu está furado e sei como trocá-lo, sem que isso seja um drama nem tenha de telefonar à minha mulher para o vir substituir. O que já fiz muitas vezes, por não ser problema, coisa que por regra não fazem, pois é “um problema”. Aliás, não deixa de ser curioso que os homens são muito breves a falar ao telefone e estacionam num espaço pequeno. E a mulher? Precisa de falar muito tempo, uma necessidade inata, e de muito espaço para estacionar, uma dificuldade inata.
Não me gostava de ver como mulher, porque são complicadas. Muito complicadas mesmo. Em casa, sofrem do complexo da limpeza, que cada coisa tem um lugar e uma posição única que não pode desviar-se um milímetro sequer. E, na verdade, estão sempre a “descobrir” que “a jarra não está no sítio dela”, a toalha não está bem dobrada e mal posicionada no toalheiro e o culpado é o homem. Deve ser um martírio sofrer desta “doença” … Para nós, “está tudo bem” e “não se passa nada”. Quando saem, têm de controlar e esmiuçar o mundo à sua volta, especialmente “as outras”. Como vestem, o que calçam, se estão gordas (satisfação) ou magras (inveja). Deve ser um trabalho cansativo.
E como são mordazes com os “machos”, ao afirmarem que, ser virgem, só é defeito nos homens… ou então, ao insinuarem que
“os meus filhos, tenho a certeza que são meus, mas o meu marido não pode dizer o mesmo” …
Nós somos muito simples, diretos e práticos. Tomo banho em cinco minutos, o único creme meu na casa de banho é o de barbear (entre tanta frascaria) e não preciso de me maquilhar para sair à rua. Aos trinta anos ainda era solteiro e não andava preocupado com isso nem ninguém se importava. Mas mulher de trinta anos já é tia, solteirona e ninguém a atura. E todos ligam, olham e importam… Saio de casa de mãos nos bolsos, sem nada. Mulher não consegue sair à rua sem levar a sacola às costas, com tanta tralha que mais parece uma oficina de reparações ambulante. Ah, e ninguém fica a olhar para o meu decote enquanto conversamos. Mulher pode dizer o mesmo? Não creio…
Elas já se dizem satisfeitas por não precisarem de rapar os pelos da cara todos os dias. Ora, nós andamos muitíssimo mais agradados pois não precisamos de rapar os pelos … da cara para baixo, que é muito mais doloroso. Aliás, não gostamos de fazer sacrifícios em nome da beleza. Daí colocarmos uma grande distância entre cera quente e as partes íntimas… e nem temos complexos que nos obriguem a ter de fazer reduções ou aumentos de algumas partes sensuais do corpo…
Reencarnar em mulher dá-me pavor. Só o facto de pensar que viria com a obsessão da limpeza, das dietas, de que ninguém reparava em mim quando corto o cabelo ou uso um vestido novo e ter de pedir desculpa por estar tudo desarrumado sempre que alguém vai lá a casa, fico com os cabelos em pé. Como se homem se preocupe com isso. E acham que resolvem tudo com choro. É a estratégia crónica para conseguir o seu objetivo, ao tocarem a sensibilidade do homem. Depois, dizem que eles são brutos e insensíveis… Algo não bate certo.
Em sua defesa disseram que, quando forem velhinhas, serão vovós simpáticas e elegantes, em contraste connosco, que não passaremos de velhos tarados e chatos. Já nem questiono estes argumentos de desespero, porque são elas que têm problema com cabelos brancos e rugas (que para nós são charme). E com tampas de sanita…
A mulher é complexa, difícil de entender. Para ter sexo é preciso levá-la a jantar fora, oferecer-lhe flores, ir ao cinema ou dançar, levá-la às compras, dar-lhe uma prenda, elogiá-la, mimá-la, referir o penteado novo, a elegância do vestido, sussurrar-lhe ao ouvido e mil e uma coisas mais. Já o homem, só precisa … de um sítio.
E há o estatuto. Quando nos referimos à humanidade, “o homem” é a referência. Podem dizer-me que isso é fruto da sociedade machista em que vivemos, mas não tenham ilusões. A sociedade foi machista (e muito), ainda o é e, quando um dia reencarnar, vai continuar a sê-lo. Provavelmente, ainda mais. Deixem que os islamitas sejam maioria na Europa (quem sabe, em Portugal) e não é preciso esperar muito… Até por isso. Se reencarnar, quero voltar “macho”.
Mas, para concluir, uma preocupação séria: desde a minha infância, em que a mulher era marcadamente secundarizada, verificaram-se avanços notáveis da nossa sociedade no caminho da igualdade de direitos, embora ainda longe de ser atingida. Não sei quanto tempo mais será preciso para tal acontecer, se é que chegará a acontecer. É necessário um esforço continuado e, mesmo assim, em qualquer momento desse percurso tudo pode ser revertido e “voltar à estaca zero”. Já aconteceu noutras sociedades, vai voltar a acontecer e nós não somos diferentes nem estaremos imunes…