Crenças, rezas e responsos. Resultam?

Quando lhe paguei o salário este mês, a Teresa guardou-o numa pequena bolsa. Ao outro dia, logo pela manhã e sem estarmos à espera, apareceu cá em casa à procura da bolsa. Não sabia onde a deixara. Já correra tudo e… “foi um ar que lhe deu”. Nem nós a vimos nem ela a encontrou, apesar de corrermos os quatros cantos da casa. Desanimada, convenceu-se que lhe teria caído no caminho de regresso a casa e com ela perdera tudo, dinheiro e documentos. Foi-se embora abatida pela perda e resolveu fazer aquilo que uma das irmãs costuma fazer nestes casos: Atar a perna da mesa com um pano de cozinha enrolado feito corda, para “amarrar o diabo”. E procurou novamente. Acredite-se ou não, a verdade é que a bolsa apareceu pouco depois…

Já quando era miúdo, se desaparecia alguma coisa, a minha mãe dizia-me: “Amarra o diabo”. E eu fazia o que a Teresa fez, atando uma das pernas da mesa com uma corda. Não há dúvidas, resultava. Porquê? Não sei e ninguém me sabe responder. Esta é uma das muitas crenças populares que vão passando de geração em geração e que têm sobrevivido às desmistificações científicas. Há ainda muitas coisas por explicar ou não queremos aceitar as explicações. Já agora que falamos em formas de recuperar objetos perdidos, também existe uma oração chamada “Responso a Santo António” para ser rezada quando já não há esperança de voltar a ver o que se perdeu. E deve ser rezada assim: “Eu vos saúdo, glorioso Santo António, fiel protetor dos que em vós esperam. Já que recebeste de Deus o poder especial de reencontrar objetos perdidos, socorrei-me neste momento, a fim de que, mediante o vosso auxílio, eu encontre o que procuro… Alcançai-me, sobretudo, uma fé viva, uma esperança firme, uma caridade ardente e uma docilidade sempre pronta aos desejos de Deus. Que eu não me detenha apenas nas coisas deste mundo. Saiba valorizá-las e utilizá-las como algo que nos foi entregue para nosso uso e procure sobretudo aquelas coisas que ladrão nenhum nos pode tirar e que nunca iremos perder. Assim seja”.

Mas, não se ficam por aqui as rezas e outras crenças em relação à forma como recuperar objetos perdidos. Há quem torça um lenço e dê três nós, enquanto vai dizendo: “Amarro o rabo da macaca e, enquanto não achar o que procuro, não desamarro este rabo”. Será que há alguma macaca responsável pelo desaparecimento dos nossos bens? Uma coisa parece ser importante: Acreditar. Daí que cada um tenha as suas crenças. Ainda existem os crentes em São Longuinho. Para esses, a solução é um responso a este santo: “ Caro São Longuinho, patrono dos pobres e o ajudante daqueles que procuram artigos perdidos, me ajuda a encontrar o objeto que eu perdi (referir qual é o objeto) e que eu encontre melhor uso para o meu tempo e o use para ganhar para Deus, maior honra e glória. Conceda-me esta graça e o seu precioso auxílio para todos os que procuram o que perderam, principalmente aqueles que procuram encontrar e ganhar novamente as graças de Deus e a vida eterna. Amén.

Com tantas formas de resolver o mistério das coisas perdidas e, apesar de em miúdo ter solucionado alguns casos “amarrando o diabo” com uma corda presa à perna da mesa, ainda não consegui recuperar uns óculos de sol “novinhos em folha”, que desapareceram “por encanto”. Até parece bruxaria… Como estava a precisar de proteger os olhos que me têm andado a doer devido ao excesso de luminosidade, acabei por comprar uns há cerca de um mês, já que o dinheiro colocado na testa não os protege dos raios solares… Alguns dias depois, quando a minha cadela me deu sinais de que queria levar-me a passear, resolvi “estriar” os óculos pois a manhã estava muito luminosa.

Lá fui, agarrado à trela, enquanto ela me conduzia para a volta habitual. Lembro-me de ter chegado a casa, fechar a porteira, tirar a trela à Diana e atender o telemóvel. Através da janela da cozinha a Ana Maria estranhou ver-me de óculos escuros, mas não disse nada. Entrei em casa, tomei banho, almocei e quando procurei os óculos para ir trabalhar… “óculos de grilo”. Nunca mais os vi. Andei para trás e para a frente, refiz os passos que penso ter dado depois de chegar a casa mas, nada. Não os vi em nenhum dos locais onde presumi que poderiam estar. A Teresa “amarrou o diabo” mas, nem assim. As “lunetas” não se dignaram aparecer. Toda a gente cá de casa andou a ver os cantos e o resultado foi nulo. Para explorar as alternativas, leram o responso a Santo António. No entanto, não sei se por falta de convicção na solução se por algum erro de leitura que tenha impedido a mensagem de “lá chegar”, se por os óculos terem voado misteriosamente, não resultou. Nada de óculos escuros. Terá sido por serem escuros? Por terem caído no saco do lixo sem me aperceber? Nos gatos que passam pelo meu jardim a correr, fugindo da Diana, não vi nenhum de óculos… Certo, certo, certo, é que já se passaram quatro semanas e parece-me que só vai haver uma solução: Comprar outros, por muito que me custe. E custa… Fica-me aquele amargo de boca de ter para aí uns óculos novos em qualquer lado e, feito parvo, ir comprar outros. Só a mim? De maneira nenhuma, pois as pessoas perdem de tudo. Até já houve quem perdesse um bidé… Será que é mesmo perda? Ou será só esquecimento do lugar onde colocamos o objeto?

Se “amarrar o diabo” ou o rabo da macaca e ler o responso a Santo António ou a São Longuinho continuo a interrogar-me se resulta. Porque não sei. É que, no meu caso, quem “fez o trabalho” foram outras pessoas. Será que tenho de ser eu a “amarrar o diabo” ou o “rabo da macaca”? E se resultar? Vou ter de acreditar, por mais céptico que seja? Como o que eu quero é reaver os óculos, irei tentar e logo se verá. Provavelmente, tenho é de “arranjar a corda certa”…

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