O valor de um simples “Obrigado”

“A gratidão é a memória do coração” pelo que nunca nos devemos esquecer que, enquanto o coração não estiver agradecido, não seremos verdadeiramente felizes. Até porque, se olharmos bem, devemos ver que não é a felicidade que nos faz agradecidos, mas a gratidão que nos faz felizes. Apesar de que, estamos mais dispostos a pagar um prejuízo do que um benefício dado que, o homem vê no agradecimento um peso, um sacrifício, enquanto na vingança encontra o prazer…

Considero-me uma pessoa grata mas, ao olhar para trás, reconheço que nem sempre manifestei o meu agradecimento como devia, umas vezes por comodismo, outras por timidez, outras ainda por não saber como o fazer. Erradamente, até porque me sinto imensamente agradecido.

Começo por estar grato a Deus por tudo aquilo que tenho, em vez de me lamentar pelo que não tenho, e porque me concedeu muito, talvez mais do que mereço. Estou-Lhe agradecido por ter nascido em tempo de haver muito pouco. É que essa ausência de bens, de todo o tipo de coisas que hoje são vulgares, foi-me muito benéfica, porque me ensinou o valor dos bens úteis à vida, que ainda hoje faz com que me arrepie sempre que vejo o desperdício.

Até Lhe estou grato por não me ter dado tudo o que lhe pedi…

Ao pensar nisso, não posso deixar de estar grato a todos aqueles que me enxergaram melhor do que eu sou. Que bondade deles.

O que sou devo-o a muita gente, a começar pelos meus pais, a quem estou profundamente agradecido, por me darem a vida, educação e instrução (com grande sacrifício) mas, sobretudo, pelo exemplo.

Agradeço as críticas, mesmo as mais severas, sempre que foram imparciais e isentas, despidas de interesses pessoais.

Há imensas razões para estarmos gratos, até aos amigos, embora já tenha ouvido dizer que “aos amigos não se agradece”. Até entendo a razão e o sentido das palavras mas, por muita proximidade que se tenha com alguém, considero que o agradecimento faz sempre falta quando nele se põe um pouco do coração, em afeto e atenção. O “Obrigado” significa que a atitude que tomaram connosco nos soube bem, nos fez sentir melhores, mais felizes. É um reconhecimento e apreço por algo que faz a diferença para melhor, por algo que nos tocou.

Diz-se que, para nossa felicidade, deveríamos praticar a cultura do agradecimento, de manifestarmos gratidão por todas as benesses que recebemos, todos os dias. Com essa prática do estar grato, seríamos mais humildes, mais justos, mais generosos e, com toda a certeza, mais humanos.

Tudo isto vem a propósito de, num mesmo dia, ter sido confrontado com dois casos de agradecimento. Comecei por encontrar a D. Orquídea que já não via há algum tempo. Apoiada numa “canadiana”, já se movimentava bastante bem apesar da cirurgia que fizera recentemente. Depois de uma longa conversa disse-me que o cirurgião que a operara no Hospital de Lousada lhe “devolvera a vida”, a ela a quem um outro especialista já “condenara” ao dizer-lhe que não podia ser mais operada e, por tal, teria que se resignar, sofrer e aceitar a imobilidade como fim. Mas estava triste consigo mesma porque, na última vez que se encontrara com o cirurgião, não tivera a oportunidade de lhe manifestar o seu agradecimento . Fiquei muito impressionado com a assunção dessa dívida de gratidão e da vontade de o manifestar à pessoa em causa.

Pouco depois, ao entrar no Hospital de Lousada, fui abordado pela senhora Margarida, uma doente que estava connosco há quase três meses, dizendo que queria falar comigo. Como tem mobilidade reduzida e se movimenta em cadeira de rodas, aproximei-me e começou por me informar que dentro de dias ia ter alta e regressar a casa. Mas não queria ir embora sem me manifestar o seu “Muito Obrigado” pela forma como foi tratada no hospital por toda a gente, desde o recepcionista ao médico, durante o tempo que ali esteve internada, tendo já agradecido pessoalmente a cada um deles.

Ao longo de vários minutos não parou de dizer palavras elogiosas à instituição e ao pessoal, com a voz carregada de emoção e aquele brilho nos olhos, o que me apanhou de surpresa e deixou muito sensibilizado, nalguns momentos até comovido. Não por ter qualquer ação direta na sua recuperação, mas pelo reconhecimento dos serviços prestados pelas pessoas que ali trabalham e pela instituição no seu todo. É que, apesar de não o manifestarmos, um “Obrigado” sabe sempre bem a quem o recebe, mas muito mais a quem o merece. Todos gostam de ver o seu trabalho reconhecido, especialmente duma forma tão genuína e generosa, o que é sempre um estímulo adicional para continuar.

Se a D. Orquídea, apesar de ainda não lhe ter surgido a oportunidade para agradecer, já carrega em si o sentimento de gratidão, no caso da D. Margarida encontrou nas palavras certas a forma de pôr o agradecimento do coração.

Já Marcel Proust dizia que “devemos agradecer às pessoas que nos fazem felizes. São elas os jardineiros encantadores que fazem as nossas almas florescerem”.

Leave a Reply