Tive de parar o carro perto da porta de entrada duma escola e dei comigo a observar o caos provocado pelo enorme movimento de carros, de pais e mães a recolherem os filhos para o regresso a casa. E pensei no quanto mudamos em relação à minha infância e de como somos agora tão diferentes dos japoneses onde os pais não levam os filhos à escola. São as crianças que começam desde os 6 anos de idade a ir sozinhas ou em grupo, quando muito acompanhadas por alunos mais adiantados. É assim que aprendem a ser responsáveis. Quando era criança também era a pé, sozinho ou na companhia dum vizinho que ia para a escola, em liberdade e com alguma responsabilidade.
O sistema de educação japonês é reconhecido mundialmente e o povo é famoso pela sua inteligência, saúde, educação e bem-estar. Mas o que é que torna essa nação tão diferente do resto do mundo? Uma das razões está no sistema de ensino, que é diferente e interessante. Defendem eles que as crianças devem aprender boas maneiras antes de conhecimentos. Assim, a escola nos 3 primeiros anos não as julga pelos seus conhecimentos, mas procura incutir-lhes as boas maneiras e desenvolver-lhes o caráter, sendo ensinadas a respeitar as outras pessoas e ser gentis com os animais e a natureza. Aprendem ainda o que é a generosidade, coragem, justiça, compaixão, autocontrole e empatia. Para eles, de nada serve o conhecimento se um ser humano não cultiva a generosidade e os valores morais antes de tudo mais. Não me parece que estas sejam as preocupações principais do nosso ensino básico nos 3 primeiros anos, nem sequer nos anos seguintes. Mas que fazem muita falta às nossas crianças e futuros adultos, não restam dúvidas! E só não vemos se não quisermos …
No Japão, antes de começar o ano letivo cada estudante recebe um calendário escolar com todas as atividades e se algum professor faltar, a aula não será suspensa e não haverá “furo” pois qualquer aluno está capacitado para a dar graças ao facto de ter o programa consigo. Em quase todas as escolas não existe equipa de limpeza. No Japão e noutros países asiáticos. Desde muito pequenos, eles são ensinados a trabalhar em equipa e a ajudar-se mutuamente. É por isso que, tanto professores como alunos, têm a responsabilidade de limpar a escola. Sempre! E é assim que o tempo e esforço gastos nas tarefas de limpeza faz com que as crianças respeitem o seu trabalho e o dos outros. Ponho-me a imaginar o que diriam ou até o que fariam alguns “papás” cá do burgo ao saber que os seus adorados filhinhos faziam a limpeza da escola! Coitados dos professores. Se mesmo sem isso já “levam no focinho” de alguns pais imbecis e destravados …
A educação começa em casa. Os pais ensinam seus filhos e dão ênfase ao respeito pelas pessoas da terceira idade. Fazem-no principalmente para honrar a sua experiência e sua sabedoria. Nesta cultura, o valor familiar é fundamental. Eles valorizam a família sobre todas as coisas. O amor, a confiança e o carinho, devem permanecer entre as diversas gerações, desde os pais aos bisavós. Além dos assuntos tradicionais, os estudantes japoneses ainda aprendem caligrafia japonesa e poesia. As duas classes ensinam as crianças a respeitar a sua própria cultura e as tradições seculares. Pelo contrário, cá entre nós, a “malta” acha que as tradições são “coisas de velhos” e não interessam a ninguém!
Quase todas as escolas japonesas exigem que os seus alunos usem uniforme, com o objetivo de eliminar barreiras sociais entre eles e promover um sentido de comunidade entre estudantes. E é curiosa a taxa de presença escolar: 99,9%!!! É que os estudantes japoneses não costumam faltar às aulas. Quem mais se pode orgulhar disso? Já para não falar na quase nula taxa de analfabetismo …
Quanto aos professores, são as pessoas mais respeitadas e admiradas da sociedade e por isso chamados de “senseis” (mestres), pois além de terem a responsabilidade de passar seus conhecimentos às novas gerações, têm ainda a difícil tarefa de ajudar a formar o caráter dos jovens. O governo assume que são de importância crucial e por isso capacita-os regularmente e paga-lhes excelentes salários. Diz-se até que são os únicos que não têm de fazer vénia ao imperador. Ora, se virmos bem, cá em Portugal os professores estão “muito melhor” que os seus congéneres japoneses. Ó se estão! O estado pede-lhes sempre muito, mas dá-lhes sempre pouco e assim fica equilibrado. Os pais dos alunos de vez em quando presenteiam-nos com alguns “mimos” com que eles não contam, mas que deviam estar à espera. Os alunos, sempre que chamados à atenção, prometem-lhes a “atenção” dos “papás”! Quanto à sociedade em geral, preocupa-se mais quando falta o picheleiro ou o eletricista (com todo o respeito que eles merecem)!
Por tudo isto podemos perceber porque é que o Japão, apesar de não ser um país com a dimensão da Rússia ou do Brasil, apesar de ter no seu território mais de 200 vulcões com 100 deles ativos, apesar de ter saído da Segunda Guerra Mundial derrotado e devastado com a sua economia no fundo, tem hoje um PIB (Produto Interno Bruto) que é 20 vezes maior que o nosso e que faz dele a terceira maior economia mundial, somente atrás dos Estados Unidos e da China. E tudo se deve à grande aposta que este país fez na educação, a causa principal do seu sucesso e do milagre económico.
A grande lição que o Japão nos dá é de que devemos começar sempre pela educação. É a base fundamental de qualquer sociedade e um dos seus grandes pilares. Assim o entenderam e puseram em prática os japoneses com o sucesso que lhes é reconhecido. Talvez devêssemos meditar sobre os seus méritos e, quiçá, aprender com eles, a começar por essa coisa de se ensinar “boas maneiras” às nossas crianças além de valores morais antes mesmo das ciências e da matemática, para no futuro termos uma sociedade de “boas pessoas”, cidadãos educados, responsáveis e solidários, se é que achamos que isso pode interessar ao nosso futuro comum …