São precisos dentes para ferrar … e sorrir

Dizem que o rosto, para além de ser o espelho da alma, é o nosso cartão de visita. Mas, sem uns dentes saudáveis e sorriso bonito, não há um bom cartão. Por isso, temos de ter diariamente uma boa saúde oral para manter o “corta-palha” saudável e bonito. Caso contrário, a saúde dentária pode complicar-se e podemos ter de “botar fora” uns dentes que tanta falta nos fazem. Antigamente, era em casa que se tirava o dente, amarrado a uma porta que se fechava com força. Hoje, já são os especialistas com técnicas avançadas para os arrancar sem dor, às vezes um a um até se ficar totalmente desdentado. Depois, é preciso dar resposta à necessidade funcional, estética, psicológica e de saúde, o que tem solução nas chamadas próteses dentárias, a que normalmente chamamos dentaduras.  

Sabe-se que o uso de dentaduras já vem desde há cerca de 3.000 anos segundo os historiadores, sendo feitas de uma grande variedade de materiais, a começar por dentes roubados de cadáveres. Ao longo da história usou-se a madeira, o marfim, a porcelana, o ouro e diversos materiais sintéticos. Os egípcios ficaram para a história como os precursores no uso de dentaduras, que eram feitas amarrando um dente ao outro ou nas gengivas com ouro ou arames. Já os maias esculpiam dentes em pedra, conchas ou ossos e colocavam-nos no vazio dos dentes. No Japão, esculpiam as dentaduras em madeira e na Europa Central usavam dentes de animais. E em França, começaram por as fazer com marfim de hipopótamos, elefantes e morsas e mais tarde em porcelana. Foi em 1820 que um ourives, para evitar que as dentaduras apodrecessem, fez a primeira em ouro. 

É óbvio que as dentaduras mais famosas da história foram as utilizadas por George Washington, o primeiro presidente americano. Perdeu cedo todos os seus dentes e a partir dos 49 anos de idade passou a usar dentaduras feitas de latão e ouro, de marfim de hipopótamos, elefantes e até dentes humanos, chegando a ter mais de meia dúzia de dentaduras. Mas também ficaram célebres os “dentes de Waterloo”, uma célebre batalha em 1815 onde morreram mais de 50.000 soldados, quase todos jovens e com dentes excelentes. Ora, os “catadores de dentes” que seguiam os exércitos e avançavam sobre os cadáveres para lhes arrancar os dentes saudáveis, tiveram ali muita “matéria-prima” que despacharam em barris para a Europa e Estados Unidos. 

Mas os materiais para o fabrico das próteses dentárias (dentaduras) e a tecnologia de fabrico evoluíram muito, para além da qualidade técnica dos especialistas e é por isso que hoje temos uma variedade grande que permite a alguém que não tenha um único dente poder recuperar o visual. Para isso existe a dentadura total, parcial fixa, parcial removível, semiflexível, implante dentário e outras mais.

Mas as dentaduras têm proporcionado histórias muito diversas, que vale a pena explorar neste pequeno artigo. 

E começo por o advogado conceituado cá da terra que discursava em plena campanha eleitoral para umas eleições autárquicas, quando viu a placa dentária saltar-lhe da boca e voar até junto da primeira fila daqueles que assistiam à sessão de esclarecimento. Sem se atrapalhar, interrompeu o discurso, apanhou a placa, limpou-a e, exibindo-a perante a plateia, disse com um sorriso nos lábios: “Terceira dentição”!

Também são muitos os casos de pessoas que ao tomarem banho no mar, quando atingidas por uma onda, caem e engolem água e ao abrir a boca para respirar, a placa dentária escapa-se e cai na água do mar sem hipóteses de recuperação, deixando-as expostas com a ausência total ou parcial da dentição, um incómodo para quem acontece, uma cena cómica para quem assiste pois é a dentadura dos outros. Maria ficou sem a dentadura assim, numa onda inesperada e ficou a chorar com a mão a tapar a boca. A amiga animou-a e fez com que fossem ao longo da praia para ver se o mar lhe devolvia o que lhe roubara. Foi com um certo entusiasmo que ouviram dois jovens dizer: “Olha uma dentadura”! Disfarçando, desviaram a atenção dos jovens, agarraram a dentadura e saíram dali. Quando já no autocarro, ao tentar colocá-la na boca, Maria descobriu que não era a sua. Afinal fora um idoso que a deixara na praia de prevenção para o mar não lha roubar, coisa que elas fizeram …

Um casal de idosos pobres entrou num café e pediu um cachorro, que dividiu ao meio quando chegou. Enquanto o velhinho comia, a mulher só olhava. O empregado condoído com a cena, foi junto deles e disse: “Se quiser, eu trago outra sanduiche para a senhora”. E ela respondeu logo: “Não, obrigado, não se incomode. Eu só estou à espera que ele acabe para comer a minha metade, mas preciso da dentadura dele. Nós usamos tudo a meias”!

Mas a história mais complexa por causa de uma dentadura aconteceu em Israel. Em 1948 Israel tornou-se independente, mas os árabes moveram-lhe uma guerra que acabaria anos mais tarde com a divisão de Jerusalém. Porém, ao fazerem a divisão no mapa, houve alguns metros que ficaram como terra de ninguém, onde nem os israelitas, nem os jordanos podiam entrar. No limite do lado de Israel havia um mosteiro e um dia quando uma freira estava à janela, começou a tossir. Num acesso mais forte de tosse, acabou por cuspir a placa para a “terra de ninguém”. Querendo recuperá-la pela falta que lhe fazia, foi ao ministério e disseram-lhe ser impossível entrar lá. Mas, depois de muita insistência, comovidos com o caso, entraram em contacto com os representantes da ONU e estes com a Jordânia. Só depois de muitas conversações acabaram por chegar a acordo, tendo-se reunido junto ao local um representante da ONU, outro de Israel e mais um da Jordânia, para entrar na “terra de ninguém” e conseguir recuperar a dentadura da freira, num registo fotográfico histórico. Dizem que as dentaduras são falsidades expostas sempre que saem do lugar, mas a verdade é que em grande parte dos casos resolvem com eficácia um problema múltiplo. E, não conseguindo ser o mesmo que a dentadura natural, conseguem recuperar o visual da pessoa e o lado psicológico de quem está parcial ou totalmente desdentado, o que às vezes é muito mais importante que tudo o resto …

E, se pensarmos bem, o uso de dentadura tem a grande vantagem de podermos escovar os dentes e cantar ao mesmo tempo!!!  

Leave a Reply