Não TAP os olhos. “Porque o seu dinheiro voa” …

Andamos todos muito preocupados em “passar entre a chuva sem nos molhar”, isto é, ver se escapamos ao contágio por aquilo que os especialistas chamam de “novo coronavírus” ou “covid-19” e nem nos damos conta que o mundo continua a girar e os outros problemas da sociedade precisam de ser resolvidos, sendo que muitos deles nos dizem respeito de uma forma ou de outra. Distraídos e preocupados com a pandemia, nem percebemos que alguém vai tomando decisões importantes para todos nós, usando para o efeito precisamente o “nosso dinheiro”. E foi nesta (quase) apatia geral que fomos ouvindo notícias de que a “transportadora aérea nacional”, onde o estado já enterrou muito dinheiro para ser dono de metade, e estranhamente sem poder mandar em nada, precisava de mais uma injeção de mil e duzentos milhões de euros para não se afundar, ou melhor, para não deixar de “levantar voo”. E a quem veio pedir? Ao estado, claro está que, apesar de falido e com uma dívida que colocará um pesado jugo ao pescoço dos nossos filhos e passará de geração em geração muito para além dos seus trisnetos, arranjou maneira de ficar a dever mais. Os governantes defendem que o país não a pode deixar “ir ao charco”. Terão receio de que, na sua falta, vamos ficar apeados e só podemos andar de bicicleta? Provavelmente até dava jeito para acabar com a obesidade infantil …

O ministro das infraestruturas, no seu estilo “trauliteiro” de “ou vai, ou racha”, insiste que “é uma empresa indispensável para o país” e que “Portugal não pode perder esta companhia de bandeira”. E num tom bruto com tiques radicais, ameaçou com a nacionalização da empresa se não houvesse acordo com os privados. Porque, homem que é homem, é assim mesmo e não tem medo de arriscar (e perder) “o dinheiro dos contribuintes” para comprar mais uma boa parte da companhia falida. Aliás, os “pagadores do costume” nem reclamam … Não foi necessário nacionalizar, mas a alternativa não vá ficar muito mais barata. Para já, são mil e duzentos milhões de euros “a levantar voo” e “ainda a procissão vai no adro”. E depois? Logo se verá, porque “não há quem TAP este buraco”. Não tenhamos ilusões. Em 2019, no ano em que houve mais passageiros que o habitual, os resultados foram muito … negativos. E de que maneira! Mais de 100 milhões de prejuízo. Ora, se num ano bom deu no que deu, nos anos maus que aí vêm, vai ser o bom e o bonito, não? Talvez um “buracão” maior? E o povo? Que o TAP … O argumento do ministro, do governo e políticos de quase todos os quadrantes, perfeitamente alinhados, é de que “Portugal não pode perder a TAP”. Eu diria que “a TAP é que não pode perder Portugal”, porque é o seu principal financiador, seja para pagar viagens, seja para cobrir os prejuízos.

Lá vai o tempo em que eu cuidava de voar na companhia, mas não sei há quantos anos já não assento “o rabo num dos seus aviões e não é por isso que me vou sentir menos português. A concorrência hoje é grande e as agências de viagens selecionam em função do interesse dos clientes. É por serem melhores as propostas de outras empresas que com elas tenho viajado nos últimos anos. E vivo bem com essa “traição”. Ao ver um debate sobre esta “tomada” de mais uma parte da empresa pelo estado, que passa a ser dono de 72,5%, perguntava-me: – Qual é a minha vantagem em viajar na TAP? Tenho desconto pelo facto de ser português? Não! Tenho algum tratamento especial por ser português do norte (e contribuinte da empresa)? De maneira nenhuma. E há direito a uma bebida extra, a desconto nos aperitivos ou nas vendas a bordo? Zero, nada, nicles!!! Pelo contrário. Às vezes até me sinto discriminado quando a hospedeira de bordo me fala em inglês, como se eu tivesse cara de “beef” … Já me basta o Algarve …

Mas, sejamos positivos: nem tudo é mau. Com os privados reduzidos a uns míseros 27,5%, quem passa a mandar é o estado, se é que desta vez vai mesmo mandar! Então, existirão grandes oportunidades para “gestores públicos” a nomear pelo governo, seja este ou o que vem a seguir (ou até pelo partido que lá estiver no momento). E podem ser bancários, filósofos, médicos, escriturários, sindicalistas, atores ou artistas de circo de formação que, com toda a certeza, serão bons ou excelentes “gestores públicos”, altamente capacitados para gerir esta ou outra TAP qualquer, desde que sejam filiados ou simpatizantes …

Infelizmente, o historial de gestão das empresas onde o estado está metido não é nada bom, longe de outros exemplos que merecem ser copiados. Ainda hoje vi a notícia que anunciava a saída de um gestor português de topo, no próximo ano, do Lloyds Bank, em Inglaterra. A partir de 2008, durante a crise financeira, este banco sofreu grandes perdas, levando a que o estado inglês tivesse entrado no seu capital e injetado vinte e um mil milhões de libras. Sob a boa liderança desse português, seis anos depois o Lloyds Bank devolveu o total do valor ao estado e um adicional de novecentas mil libras, voltando a ser um banco privado. Estaria a aplaudir se o estado viesse a fazer o mesmo com a TAP, pois a sua missão não é gerir empresas de aviação, como não o é com bancos. E a que assistimos em relação ao BPN e ao Banco Espírito Santo? As injeções de capital foram reforçadas várias vezes, mas esse dinheiro dos contribuintes nunca foi nem será devolvido ao estado. Por incompetência? E à custa de quem? De nós, contribuintes. 

A TAP foi um sorvedouro de dinheiro e tudo indica que continuará a ser. Dizem que os mil e duzentos milhões de euros anunciados são só o início de uma injeção continuada e perdida para sempre (o próprio primeiro ministro já nos foi avisando para lhe dizermos adeus), como no Novo Banco, um buraco negro sem fundo que engole o dinheiro todo que lá se mete, sem devolver nada. Por isso lhe digo: “Não TAP os olhos, porque vamos todos pagar e voltar a pagar … já que não há dinheiro que o TAP” … 

Recebi hoje esta sugestão: “Com o investimento que os contribuintes portugueses fazem constantemente no Novo Banco, a ideia de tomar a maioria do capital ou nacionalizar a TAP fará sentido se a fundirem com aquele. E então, sim, haverá um grande slogan publicitário para pintar nos aviões, um argumento de peso para nos confortar: 

                NOVO AIR BANK – Porque o seu dinheiro voa”!!!

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