Não gosto de moda, nem de “apertos”…

“Parece impossível. Ainda usas esses calções velhos e rotos? Não tens vergonha”? É isto que ouço de vez em quando cá por casa sempre que me veem com os calções azul marinho, bastante puídos na parte dos “glúteos” (aquilo a que vulgarmente chamamos de “rabo”, “nádegas” ou “cu”), de tal forma que já começaram a romper. 

“Não vês que tem um buraco e parece mal”? Como sou dos que têm dificuldades em me separar de uma peça de roupa que uso regularmente e com que me sinto confortável, respondo: “O buraco é para deixar entrar o ar. É uma “área de serviço” que precisa de ser bem arejada. Também serve para se “esgueirarem” os gases que saem do “tubo de escape”. Já estou na fase da vida em que a capacidade de “produção de metano” está no máximo e não pode ser retida. Tem de sair por algum lado” … aliás, se estão na moda as calças rotas, algumas com tantos rasgões e tão grandes em que pergunto a mim mesmo se “as calças serão feitas de pano com buracos ou de buracos com pouco pano”. Ora, porque é que os meus calções não podem ser tidos como estando na moda, até porque não há grandes diferenças entre calças e calções, a não ser no tamanho das “pernas”? Assim, já não teria de ser chamado à atenção e, pelo contrário, talvez mesmo elogiado por “andar na moda”. É tudo uma questão de conceitos …  

Enfim, o que acontece com estes calções, repete-se ainda naquele par de sapatilhas – para quem não sabe o que são, devo esclarecer que há também quem as trate por “ténis” … – rotas de lado e com um grande buraco na sola que mais parece um olho de elefante; ou com o par de sapatos “vela” a que me habituei porque calçam tão bem, que tenho a sensação de andar descalços. Entre eles, que nunca os sinto quando caminho, e uns novos que me apertam os calos e fazem sofrer o dia todo, está bom de ver qual é a minha opção. A minha e a de muitos outros como eu, que trocam a apresentação pela comodidade. E nas calças de ganga, na camisa e no blusão tão coçado. É verdade, tenho mais roupa no armário, mas repito quase sempre as mesmas peças. “Coisa de homens”, dizem elas com ar crítico. “Mania de mulheres”, pensamos nós, já que não o podemos dizer … Admiro-me com a capacidade de sacrifício de muita gente, especialmente das mulheres, ao “aguentarem forte e feio” as dores nos pés com aqueles sapatos novos e com “ponta em bico”, que apertam de tal forma os dedos dos pés, que chegam a “encavalitar” porque o espaço não é suficiente para todos, num sofrimento continuado, e mesmo assim ficam com eles calçados até ao fim do casamento ou qualquer outra cerimónia, em nome do visual que eles lhe conferem. É obra. Cá por mim, prefiro usar sapatos velhos a ter de me submeter a tal sacrifício. Era o que faltava. Não há nada como andar calçado com a sensação de estar descalço …

Não sou um cliente de modas, muito menos fiel seguidor e escravo delas. No vestir e no calçar a minha prioridade vai para o confortável. E isso quer dizer “largo”, bem “à vontade”, por forma a não me sentir apertado em qualquer parte do corpo, da cabeça aos pés. É que, se há coisa que detesto é sentir-me “apertado”, seja a que título for. Não sei como é possível alguém “enfiar-se” numa daquelas calças tão justas, tão justas, que até se notam as “pregas da pele”. Devem fazer cá uma ginástica em cima da cama, com as pernas ao alto e a puxar bem para conseguir fazer entrar um corpo XL numas calças tamanho S. Tal só é possível pela elasticidade do tecido, que se sujeita a tudo. Se gosto de ver? Claro que sim … mas só nas mulheres. Especialmente naquelas em que as “ondulações do corpo merecem ser realçadas, pois é nelas que a palavra anatomia faz todo o sentido e (às vezes) dá gosto ver …  A moda é um dos instrumentos principais que a indústria usa para nos fazer consumir mais e mais. Por isso tem de mudar todos os anos por forma a “sermos obrigados” a trocar de roupa, calçado e muitas outras coisas com regularidade, mesmo que os artigos que possuímos ainda estejam novos. Para os “manipuladores” das nossas vidas (e do nosso bolso, porque tudo tem a ver com isso), de um dia para o outro tudo deixa de ser novo, apesar dos nossos olhos verem o contrário. Mudam rapidamente de estatuto e viram “desatualizados”. E nessas mudanças impostas pela ditadura da moda, umas veze as roupas alargam e outras apertam. Ora, como não me dou lá muito bem com os “apertos”, aproveito e vou usando as que me agradam (apesar de largas) e fico à espera, até porque, mais dia menos dia voltam a estar na moda … “Diz-se que na moda, só é novo o que já está esquecido” …

Sei que os que me estão próximos preocupam-se com o meu visual. E, como defendem o “estar na moda”, quando uso as calças mais largas nos ditos “glúteos” me vêm logo com uma crítica (intencionalmente boa), de algo como: “Já te viste ao espelho? Olha bem para as calças que trazes e diz-me lá se achas que é roupa que se use? Das duas uma: ou te falta rabo ou sobram calças” …

A indústria da moda mantem uma fórmula que combina consumo desenfreado com exploração de mão de obra. A roupa não fala, mas pode transmitir informações (certas ou erradas) de que quem a veste é alguém atualizado, com dinheiro, e dando a ideia de prestígio e até ascensão social. A moda tornou uma grande parte das pessoas suas escravas, fieis seguidoras, que se sentem infelizes se não puderem usar o que os estilistas ditaram como moda para aquela estação. E a moda não se fica pela roupa, pois estende-se ao calçado, acessórios, penteados, cortes de cabelo, relógios, telemóveis, óculos, automóveis e até casas para além de uma infinidade de produtos e serviços que crescem em número e variedade a cada minuto que passa. Mas o grande perigo da moda é o consumo exagerado e sem necessidade, puro consumismo por vaidade, quando não transformado em doença.

É que vivemos numa época em que o importante nem sempre é ter dinheiro, mas parecer rico …

Leave a Reply