Longe vá o agoiro…

A coruja é uma ave fascinante, de grande beleza, se bem que, para muita gente, ainda seja tida como de “mau agoiro”. Simboliza a sabedoria, o misticismo, o mistério, talvez por ser uma ave da noite que tem a capacidade de ver no escuro (há para aí muitas “aves da noite”, que têm outras “capacidades”, tanto na escuridão como à luz do dia …). Mas, quando eu era miúdo, ninguém gostava de ouvi-la piar à noite. É que, na tradição popular, o piar da coruja era tido como um sinal de mau agoiro, o pronúncio de que algo de ruim ia acontecer. Acreditava-se mesmo que, sempre que piava três vezes, alguém da terra ia morrer. Era como se, entre os seus predicados, estivesse o de adivinhar a morte de quem quer que seja. E, à distância de décadas, tenho de reconhecer que às vezes até tinham razão todos aqueles que acreditavam em tal presságio. Pela mesma razão que até um relógio parado está certo duas vezes ao dia, também qualquer coruja que pie todas as noites, algum dia vai acertar na morte de alguém. Pela certa. E então, todos aqueles que têm a convicção, só se vão lembrar do dia em que a coruja piou e algo de ruim aconteceu ou alguém morreu, ignorando todos os outros dias em que piou em vão…

As superstições são crenças populares, resultado do encontro entre o Homem e o sobrenatural, o que não tem explicação. As forças ocultas são vistas como capazes de interferir na vida humana. O pensamento científico e lógico e todo o conhecimento, não foi capaz de eliminar esta agonia perante certos fenómenos e encontraram-se respostas que se acreditam verdadeiras, por mais estranhas que pareçam. E o curioso é que praticamente toda a gente, mais ou menos informada, acaba condicionada por uma ou outra superstição, mesmo sem se aperceber. Entrar com o pé direito, fazer figas, não passar debaixo de um escadote, ver um gato preto, não abrir um guarda chuva dentro de casa ou não sentar treze pessoas à mesa. Quem não cedeu a uma destas crendices? Quase todas as pessoas dizem que isso não passa de superstições e até fazem chacota. 

Mas, apesar de dizerem não acreditar, quando são confrontadas com as situações, pelo sim, pelo não, não arriscam e fazem como os outros. É o futuro que está em causa e mais vale prevenir que remediar …

Ora vejamos: num casamento, a tradição (e a crendice) ainda é o que era. A noiva deve usar uma coisa nova, outra coisa velha, outra ainda emprestada e uma azul. Para quê? Para ter sorte. E, para atrair o dinheiro, deve colocar uma moeda no sapato. Ao que parece, pelo número de divórcios e gente endividada, a receita não resulta lá muito bem. Além disso, os noivos só se devem ver na cerimónia e o noivo não pode ver a sua prometida com o vestido de noiva antes do casamento. Dá azar!!! Vendo ou não vendo, o “azar” é cada vez mais frequente … O número de crendices aumentou em relação ao enlace, mas “os desastres” não são culpa das superstições …

Assim como se acredita que certas ações tais como feitiços, conjuras, rezas, maldições e outros rituais podem influenciar a nossa e a vida dos outros, também se crê que, se a orelha esquerda estiver quente e vermelha, alguém está a dizer mal de nós e se for a direita, estão a dizer bem. Para parar essa vermelhidão, temos de ir dizendo nomes de pessoas até acertarmos. Se quisermos contra-atacar, mordemos o dedo mendinho da mão esquerda e aquele que está a falar mal de nós, morderá a própria língua … 

As superstições continuam a existir em todas as sociedades e cada povo tem as suas crenças e costumes. Se os americanos temem o número treze e o mau olhado, para os chineses o número quatro é azar, enquanto na Lituánia assobiar em casa atrai os demónios. Mas são tantas as crendices, que vão de gatos pretos ao sal, de aranhas a vassouras e suas posições, de trevo de quatro folhas a atirar moedas para uma fonte, de ferraduras ao cruzar de dedos e muitas outras mais, que levadas a sério, tornariam a nossa vida insuportável.

Também acabo por ter as minhas. Sem querer, raramente deixo o volume da televisão com 13 de intensidade. Eu, para quem o treze é um número igual aos outros …

De manhã, a alergia matinal faz-me espirar meia dúzia de vezes ou mais, sem ter ninguém para me dizer “santinho”. Ora, a acreditar na crença popular, a minha alma já se separou do meu corpo. Quer isso dizer que me tornei “um desalmado”. Vejam lá no que dá espirrar … 

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