Será que somos todos iguais?

Por esse mundo fora vendem-se imensas teorias, umas verdadeiras outras falsas, algumas mais ou menos lógicas e outras mais ou menos estranhas. Há as que são óbvias e têm aplicação prática, mas também as que não passam disso: Teorias. Uma das que nos vão impingindo é a de que nós, seres humanos, somos todos iguais. É bonito e fica bem, como slogan promocional da igualdade, mas está longe da realidade. Gostava de ter razões para crer, mas não tenho. E já nem alimento as ilusões de sonhador. Por isso, considero que não passa de mais uma teoria. Diria mesmo que não é mais que uma “teoria da treta”. Seria bom que fosse verdade, porque todos nascemos iguais: “Nus”. Mas rapidamente deixamos de o ser, conforme o “berço” em que se nasce, o “biberão” em que se mama, a “mesa” em que se come, a roupa que se veste. 

Mas somos todos iguais perante a lei? Claro que somos … e isso quer dizer o quê? Somos todos iguais perante a Justiça? Somos … mas quem não tem dinheiro para pagar a um batalhão de advogados pode com mais facilidade “bater com os costados na cadeia”. Somos todos iguais no acesso à Saúde? Dizem que somos … mas quem não tem “cacau” para não ter de ficar à espera da cirurgia que precisa com urgência ou não conhece alguém que conhece outro alguém, que também conhece alguém no hospital, pode já não vir a precisar dela …

Podemos dizer que somos todos iguais, independentemente da raça, religião, sexo, partido, clube ou nível de estupidez natural? Somos … em teoria. E só em teoria. Ou querem-me convencer que nenhum destes fatores é discriminatório? Por se ser preto e não branco, do partido X que está no poder e não do partido Y que está na oposição, não é motivo para se colocar A à frente de B, C à frente de D, sem ter em conta as suas capacidades e qualificações? 

A este propósito estou a lembrar-me de uma personalidade do norte do país que, em tempos, foi escolhida pelo governo de então para dirigir os destinos de um organismo público que tutela a região norte. E liderou esse organismo até ao dia em que, involuntariamente, a boca lhe fugiu para a verdade. Quando questionado se, na admissão de pessoas para esse organismo não dava preferência maior a uns do que a outros, respondeu: “No caso de ter de escolher entre alguém que é do meu partido e outra pessoa que não é, escolho sempre… o do meu partido”. E, pelas pressões sofridas por parte da oposição, povo e, sobretudo, da imprensa, ao governo não restou outra saída senão indicar-lhe… a porta de saída. 

Uma afirmação destas é “politicamente incorreta”? É. Mas todos o fazem, todos os partidos dão prioridade aos seus correligionários e simpatizantes por mais incompetentes e estúpidos que sejam, mas ninguém o pode dizer em público, muito menos reconhecê-lo. Daí que, quem milita no partido político que no momento está no poder deixa de ser igual aos outros. Passa a ser, nas palavras de George Orwell,  “mais igual do que os outros”. Com mais “direitos”, com “via verde” para chegar à fala com governantes nos mais variados níveis. E tem acesso exclusivo aos “tachos” através da “porta do cavalo” …

São tantas e tão variadas as provas de que não somos tratados como iguais, que faz fé o que se pratica e não o que a Lei diz. E no dia a dia acontece isso tantas vezes, que nem sequer reparamos que também damos o nosso “contributo” para essa realidade. 

Se um pelintra saca alguma coisa dum supermercado, ainda que seja por fome, dizemos que é ladrão. Mas, no caso dum gestor, político, banqueiro ou outro “gabiru” “meter a mão no prato” e gamar alguns milhões, é um “gajo esperto”, “inteligente” e “fino”. Nessas escandaleiras que a imprensa divulgou e o país pagou, a todos aqueles que “desviaram” milhões, o que são eles de facto? E já alguém lhes disse com todas as letras que são LADRÕES? Claro que não. Até em coisas simples em que, sem nos darmos conta, tratamos as pessoas de forma desigual. Diria mesmo que discriminamos. E não faz sentido. Se alguém humilde vai a nossa casa, come do que há, sem haver lugar a “almoço melhorado” nem a atenções especiais. No entanto, se é o “senhor fulano de tal”, o almoço é reforçado com aperitivos, entradas e já não será um prato qualquer, mas algo mais requintado, mais elaborado. E até se abre a garrafa de vinho de marca destinada a momentos especiais. O estômago dessa pessoa simples é diferente do estômago do “senhor fulano de tal”? 

Porque vulgarizamos um e reverenciamos o outro, se ambos são pessoas, iguais nos seus direitos? Ou será que não é bem assim e não são mesmo iguais? O curioso é que até fazemos isso com os próprios animais, de que é exemplo o João. Ofereceram-lhe um cão “rafeiro” e ele deu-lhe “vida de cão”. Comia o que havia e só quando havia. E, se tivesse de comprar ração, era da mais barata porque era cão vulgar. Mais tarde vieram a oferecer-lhe um “mastim inglês” com “pedigree”, que é como quem diz, com o certificado de pureza racial (como os nazis desejavam para si). Então, para esse cão, passou a adquirir uma ração especial e até alguns suplementos alimentares, porque era … “um cão de raça”. Coitado do “rafeiro”, que foi tido como animal de segunda classe, quando não de terceira. Porém, o “mastim inglês”, foi tratado com honras de “senhor fulano de tal”, com outros direitos e, provavelmente, com menos deveres. Que raio de igualdade …

É um facto que somos todos diferentes: altos, baixos, feios, bonitos, gordos, magros, louros, morenos, alegres, tristes, inteligentes, menos inteligentes e por aí adiante, goste-se ou não se goste, por mais que isso não seja “politicamente correto”. Mas há algo que, só por si, é mais que suficiente para justificar a minha descrença na teoria da igualdade. Diz respeito à diferença entre gente bem ou mal educada, pessoas que respeitam os outros e pessoas que não os respeitam, pessoas que têm direitos e deveres e pessoas que só acham que têm direitos. E não falo em instrução, mas em educação. Havendo vários níveis de educação, quando não existem as coisas mais básicas, mais elementares numa pessoa, é difícil, senão impossível, tê-las por iguais e, como tal, conviver com elas. Ser bem educado não é uma questão de etiqueta ou maneirismo, mas de que as pessoas sejam capazes de viver segundo as regras mais elementares e essenciais da sociedade, desde o tipo de linguagem usada entre elas, a forma como se usa e respeita os espaços comuns a todos nós. Ser educado é respeitar os outros e os seus legítimos direitos porque a nossa liberdade acaba onde começa a deles. Mas, quantas vezes não damos de caras com alguém que invade o nosso espaço e ofende os nossos princípios? Será que esses devem ser respeitados e tratados como nossos iguais, se nem sequer aceitam os princípios do respeito comum? Será que aí, alguém continua a defender que “somos todos iguais”? Em teoria, sim. Mas só em teoria. Senão, não passa de uma “Teoria da Treta” …

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