Será que gostaria de ser grande?

Há momentos em que gostava de ser um homem grande. Não grande em importância ou fama, boa ou má, mas grande no tamanho, na altura, mesmo que não fosse “grande coisa”. Mas essa crise ataca-me a “mona” só nos momentos em que precisava de mais um palmo para ter visibilidade sobre a multidão, nada mais. Fico frustrado quando há um evento ou algo ocorre e quero ver o que se passa mais à frente, mas meia dúzia de “cabeçorras” colocadas à minha altura, tapam-me a visibilidade, como que propositadamente. Parecem maiores do que na realidade são. Não queria ser grande para ter pés grandes, pernas grandes e tudo o mais grande (e imagino que um homem assim deve ter mesmo tudo grande). Ser grande tem vantagens e inconvenientes. E se estou interessado nalgumas vantagens que isso me proporciona, já não digo o mesmo dos inconvenientes. Não são interessantes nem simpáticos e não são assim tão poucos: num espetáculo, homem alto é odiado por todos os que lhe estão atrás; quando é preciso retirar algo sem escadote do armário mais alto, ele é a “muleta” mais à mão; tanto no vestir como no calçar, fica muito mais caro, pois gasta mais pano, mais cabedal, porque nunca veste menos que XXL ou até XXXL; não encontra roupa nem calçado que lhe sirva com facilidade e tem de ir a casas especiais, que também devem ser especiais no preço; para ele, a cama tem de ser feita por medida senão, tem de dormir com os pés de fora; e, nas muitas situações em que as cadeiras são para gente normal, quando sentado, fica com as pernas encolhidas, em posição incómoda e ridícula. Imagino como será viajar de avião em classe económica, com pernas dobradas e os joelhos a empurrar o queixo para cima. Só pode usar um furgão como meio de transporte, para não ter de baixar a cabeça ou andar às turras ao tejadilho. Está fora de questão o uso de automóveis desportivos, a não ser que sejam descapotáveis ou com teto de abrir para viajar com a cabeça de fora. Caso contrário, resta-lhe como solução tirar o banco do condutor e sentar-se no chão do automóvel. E em dias de vento forte, tem muito mais dificuldade em segurar-se de pé, apesar dos sapatos parecerem duas raquetes de ténis. Tive dois colegas com mais de dois metros de altura, medindo um deles quase dois e dez. Causava-me impressão estar perto dele. Olhava e via um homem sem cabeça. Só quando levantava a minha inclinando o corpo para trás, é que me dava conta de estar completo. “Afinal, também tem cabeça”, pensava para mim.

Mas o que mais me impressiona num homem grande é que, por regra, tem de namorar com mulher pequena. Ou, pensando melhor, mulher pequena faz questão de namorar com homem grande. Talvez para compensar a “falta” com as “sobras”. Ou deve ser a física a funcionar: os polos opostos atraem-se. Um casal destes faz lembrar a história do gigante e do anão ou, traduzido na gíria popular, “a sorte grande e a terminação”.Dizem para aí que, num relacionamento como este, há “excedentes” que seriam desnecessários, pela mesma razão que, um bom carpinteiro, não usa “pregos galiota” para “pregar” madeira de forro…

Quando era miúdo dizia-se que um “homem grande” não precisa de escada para vindimar ou apanhar fruta. No entanto precisa de ter dois olhos no alto da cabeça, pois está muito mais sujeito a bater com a testa nas padieiras das portas do que alguém como eu. Apesar de ter passadas maiores e mais largas, não é sinónimo de correr mais do que um homem normal. E, se tem a cabeça num lugar mais alto que qualquer outro, não sendo sinónimo de “maior estatura moral” nem de inteligência maior, significa que, quando cai, o tombo é maior …

Dos meus colegas “grandalhões”, o tamanho foi decisivo para que um deles fosse atraído para o basquetebol. Dizia ele que tinha como vantagem o facto de “morar” mais perto do cesto. E morava. “Só por isso” é que, na disputa com ele, eu não apanhava uma.

É sabido que, de há um século até aos nossos dias, há um acréscimo na altura média dos adolescentes, de geração para geração. De tal forma que, num estudo efetuado entre os alistados no serviço militar no Brasil, verificou-se um aumento de oito centímetros na média no espaço de … dez anos.

A razão para se ser mais alto do que o normal é (quase) toda genética, embora as questões ambientais contam um pouco. Por isso, os pais baixotes não podem esperar que o filho “saia” uma “estaca”. Pode até acontecer, mas não é comum … e nem estou a desconfiar. A Holanda é tida como o país onde mais se tem crescido. De tal forma que a altura média dos holandeses é de 1,84m, enquanto entre as mulheres se situa em 1,71m, ultrapassando os americanos. Claro que, além da genética, importa uma boa nutrição, o controle das doenças comuns da infância, melhor qualidade de vida e exercícios físicos e desporto.  

Confesso que também não gostava de ser “baixinho”, chamado “roda vinte e três”, apesar deles dizerem que “têm uma visão privilegiada das mulheres com saia curta”, “de quando abraçam a namorada ficam com a cara enfiada entre o melhor de dois mundos”, “que numa briga de homens têm mais facilidades de golpear o opositor no saco dos berlindes” e que “como são leves, quando morrerem qualquer um lhes pega no caixão”.

Tamanho não é argumento. O importante é o uso que se faz dele. E, pensando bem, não sendo grande, também não sou pequeno. Não sendo alto, também não sou “baixinho”. Não calçando o quarenta e oito, também não calço o trinta e seis. Sinto-me bem como sou, chego onde quero e vejo até onde preciso ver. E, mais importante, tenho “a medida certa” para não ter dado grandes “tombos”, a suficiente para me ter levantado “sempre que caí”, o que é bem mais importante do que pensar que se vai estar sempre “lá em cima” ou “em baixo”. Aliás, o ditado popular até diz que “no meio é que está a virtude”. Embora eu não seja propriamente um homem virtuoso …

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