Encontrei na “loja” duma casa de lavoura uma daquelas caixas grandes onde os agricultores, senhorios e algumas pessoas com posses guardavam outrora o milho. Feita em madeira de pinho velho, resistia ao “caruncho” e a todo o tipo de bicharada, pelo que era excelente para guardar cereal. Ali se ia buscar milho para dar de comer às galinhas e uma ou duas “rasas” para o moleiro de Moinhos, no fundo da freguesia junto ao rio Sousa, moer e transformar em farinha a troco da “maquia”. Também se tirava algum grão para juntar à “lavagem”, os restos que sobravam da confecção na cozinha e com que se alimentava o porco. A dona da casa geria o consumo de milho por forma a durar o ano inteiro, porque a colheita e a renda só aconteciam uma vez por ano. As caixas eram como cofres, onde o milho estava conservado e em segurança. Como a madeira era rija, não apodrecia e, regra geral, resistia bem aos ataques dos roedores e outros inimigos. Os ratos que enfestavam as “lojas” das casas, como sabiam que ali dentro havia comida, tentavam abrir buracos na madeira mas, quase sempre, em vão.
O milho era a base da nossa alimentação e estava sempre presente à mesa na broa cozida em casa. Todos os dias se comia broa e caldo. Dia sim, dia sim. Daí a sua importância para nós, gente desse tempo.
Com o passar dos anos as caixas onde se guardava o milho foram desaparecendo. Por um lado, porque a área de cultivo de milho grão na região foi diminuindo até quase desaparecer e, por outro, com a proliferação das padarias. Os próprios caseiros das quintas, que têm as suas rendas expressas em “carros de milho”, deixaram de ter grão para pagar a renda ao senhorio. E assim, os tradicionais “carros de milho” passaram a ser substituídos por dinheiro. A (quase) extinção do cultivo de milho na região para a produção de grão, fez com que as caixas desaparecessem e a sua madeira fosse aproveitada para fazer móveis ou tapar buracos.
Enquanto estas caixas iam passando à história, começaram a surgir como cogumelos outras “caixas”, algumas chamadas de “bancos” (talvez porque uns quantos ali “alaparam o cu” e por lá ficaram sentados, a “engordar”), onde se guardava outro “milho”, fruto do trabalho de um sem número de “pintainhos”, crédulos de que tais “caixas” eram seguras… Acreditavam mesmo que podiam dormir descansados e que o seu “milho” não corria perigo. E dormiram… Mas, tal como nas antigas caixas onde se guardava o outro milho, apareceu também o “gorgulho” que atacou o “grão” pelo lado de dentro e ainda os “ratos”, outro tipo de ratos, em pragas cada vez maiores e mais insaciáveis, que não deram um minuto de descanso à “madeira” pelo lado de fora. Começaram por abrir “buraquinhos” que rapidamente passaram a “buracões”, por onde entraram os “roedores esfomeados”, atacando o “milho” sem dó nem piedade. E enquanto os “pintainhos” andavam pelo campo a “esgravatar” à procura de “grãos”, conseguidos com muito esforço (porque são raros em tempos de crise), os “ratos” apanhavam grandes “barrigadas de milho” e deitavam-se ao sol besuntados com o seu “óleo”, para se protegerem dos raios solares, normalmente em praias lindas de areia branca e em lugares chamados de “paraísos”. Como o tamanho dos buracos nas “caixas” era grande, apareceram também os “porcos” saídos não se sabe de onde, orientados pelos “passarões” do costume. E, ao verem tanta “comida” à descrição, ali “à mão de semear”, atacaram “à focinhada” os montes de “milho”, comendo, cuspindo, roubando e estragando como se não tivesse dono, como se não houvesse amanhã. Foi assim que algumas “caixas” que todos consideravam seguras caíram, com mais buracos que um passador. Nos “caixotes de lixo” da informação ainda se conseguem ver restos de madeira com marcas gravadas a ferro em brasa, onde ainda são legíveis as letras BPN, BPP, BES e BANIF…
Já há alguns anos que se fala também da existência de “buracos” na maior “caixa de milho” do país, conhecida entre nós como a “Caixa Geral”, local onde a maioria dos “pintainhos” guarda o seu “grão”, porque era tida como a caixa forte cá do “galinheiro”. E foi lá que, “grão a grão”, muitos foram “deixar à guarda” o produto do seu suor, confiantes na segurança do lugar. Seria impensável alguém imaginar que a “Caixa” pudesse vir a ter “buracos”, muito menos “rombos”… Mas, as notícias que têm saído como quem não quer a coisa, talvez para “apalpar o pulso”, visam preparar-nos psicologicamente para quando da oficialização de que ali há mesmo “buraco”. Será só uma questão de tempo até a notícia ser confirmada. Na verdade, só nos falta saber “qual o tamanho do rombo”. E isso quer dizer também que vão impor aos “pintainhos” (há quem diga que já foram há muito tempo promovidos a “patos”…) uma “entrega adicional de milho a fundo perdido”, para tapar aquele que pode ser o “grande buraco” e que, entendidos no assunto, consideram ser um “enorme buraco negro”… Ah, tal como noutros casos, nenhum dos “ratos” que deram cabo do “milho” foi, nem será apanhado. Por isso, será de todo impensável que se venham a apanhar os “porcos” e os “passarões”, mesmo que sejam vistos por aí com o focinho e o bico cheios de “milho”… Até porque, se não tiverem outra desculpa, poderão sempre dizer que não é seu, é de um amigo… Como dizem para aí, “porque será que eu não tenho um amigo assim”?