Gerir o que é de todos custa a quem?

A gestão dos dinheiros públicos deveria ser a mais difícil, a mais criteriosa, a mais cuidada e a mais responsável, fosse ela de um ministério ou de uma junta de freguesia, de um instituto ou de uma empresa pública, enfim, de qualquer entidade que seja suportada com o dinheiro dos contribuintes, o nosso dinheiro. Infelizmente na nossa história e, em especial na recente, o país é pródigo em casos que comprovam o contrário, que afinal é “muito fácil, mesmo muito fácil” e está acessível a qualquer “pilha galinhas”, fazer um “figurão” a gerir o dinheiro de todos. É que, (quase) não há responsabilidades no exercício de tais funções e os donos da massa, os portugueses, já nem perguntam se foi bem ou mal aplicada, em que é que foi “esbanjada”, pois já lhes saiu do bolso e lá não voltará. Só alguns ousados polícias, procuradores e juízes se vão batendo ainda contra este sistema de “não gestão” e de “impunidade”, remando contra a maré, mas até esses se devem cansar ao serem alvo de quem os devia proteger…

Todos conhecemos empresas públicas sustentadas com o nosso dinheiro onde a “gestão” deixa muito a desejar, sem que os gestores sejam penalizados e responsabilizados pelos seus atos porque nós, os “camelos”, cá estaremos para pagar a fatura. E são tantas as faturas… Esta conversa foi só para me fazer regressar ao tempo em que era um dos responsáveis do Clube Automóvel de Lousada e da organização de muitas provas e eventos desportivos que mereceram a adesão de milhares e milhares de espectadores, um dos principais indicadores de que os objetivos haviam sido alcançados. Para que a adesão dos aficionados fosse grande, fazíamos questão de apostar forte nos meios de comunicação social – o que nem sempre era fácil por sermos um Clube regional – não só para a promoção dos eventos como para os fazer chegar ao maior número de pessoas possível. E se não descurávamos nenhum órgão de informação, a verdade é que a nossa grande aposta, especialmente nas provas mais importantes, era na televisão, quer nas transmissões diretas quer na sua inclusão nos programas desportivos.

Considerando a importância das provas que faziam parte dos Campeonatos da Europa de Autocross e de Ralicross, fizemos sempre um grande esforço para conseguirmos que tivessem transmissão em direto, concretizando alguns acordos com a RTP enquanto foi possível. Foi dessa forma que as imagens televisivas a partir do Eurocircuito levaram o nome do Clube e o de Lousada aos quatro cantos do país e até da Europa através do Eurosport. E tudo correu sempre bem, excepto numa prova de Autocross. No momento em que se deveria iniciar a transmissão houve uma avaria nos “feixes” e o programa não foi para o ar. Apesar dos técnicos terem feito um grande esforço para reparar a avaria, o certo é que a corrida se desenrolou do princípio ao fim sem passar na televisão. Que desilusão a nossa… Quando eu e o Jaime Moura abordamos o realizador Tomé no camião da RTP para percebermos o que se passara e saber se era possível exibir a reportagem noutro dia ele, muito cordialmente, respondeu-nos: “Não sei e já não é comigo. Sei dizer-lhes que temos aqui duas horas de gravação excelente, que dão um ótimo programa. Aconselho-os a falarem com o Adriano Cerqueira”. Ora, esse “senhor” era o “manda chuva” da RTP na altura e estaria no Salão Automóvel no fim de semana seguinte, a decorrer na Exponor. Por isso, lá fomos falar com ele a Matosinhos ainda antes da abertura da exposição. Explicamos-lhe o que acontecera e pedimos para ver se era possível transmitir a gravação. “Não, passou à história” respondeu com alguma rudeza. Insistimos e, apesar dos vários argumentos por nós invocados, manteve a negativa.

Já farto da sua prepotência e arrogância, o Jaime disse-lhe: “Vocês fizeram a transmissão da Rampa da Falperra e, quando houve um acidente, permitiram-se continuar a transmitir mostrando somente árvores, publicidade e a estrada com a corrida parada durante duas horas, sem passar um único carro. E agora, não podem gastar uma ou duas horas de “ tempo de antena” a transmitir a nossa corrida, que tem carros em competição o tempo todo”? Com uma “grande lata”, não teve vergonha de responder: “Que quer? É que eu sou de Braga e pertenço à comissão organizadora da Rampa da Falperra”. Apesar de não querermos acreditar no que estávamos a ouvir, o Jaime ripostou em desafio: “Sendo assim, aceita fazer parte da nossa comissão organizadora para que tenhamos assegurada a transmissão televisiva na próxima prova”? O sorriso cínico aflorou-lhe no rosto quando rematou a conversa: “Não meus amigos, já faço parte de uma. Arranjem outro Adriano Cerqueira…” e virou-nos as costas.

O triste de tudo isto é que andou uma equipa da RTP que chegou a ser de quase oitenta pessoas (eu disse OITENTA PESSOAS…) a trabalhar durante quatro dias para que, o fruto do seu trabalho “pronto e empacotado”, fosse simplesmente atirado para o caixote do lixo por quem “geria o que é dos outros”… É que o “dinheiro” jogado fora não era dele mas dos contribuintes, de todos nós. Assim, “gerir é fácil”… mas, para nós, muito “difícil de (di)gerir”…

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