Como eu gostava de não ter razão…

Há um ano atrás escrevi nesta página um artigo que terminava com uma previsão expressa no ditado: “… vão buscar lã, mas vão sair tosquiados…” E se há coisas onde não gostaria que o tempo me desse razão, esta era uma delas.

Como qualquer ser humano, também sou ganancioso. Se dissesse o contrário, estaria a mentir a mim mesmo. Existe em mim o desejo de ganhar dinheiro, muito dinheiro e depressa, se possível sem grande trabalho. Por alguma razão vou jogando no euromilhões (já não me contento com o totoloto ou o totobola, só dão “trocos”), para ver se acontece um milagre. Se bem que, pelas estatísticas, é mais fácil sermos atingidos por um raio do que ganharmos o euromilhões. Mas vou tentando, “investindo” algumas moedas…

Também já fui aliciado a ganhar dinheiro fácil por diversas vezes e ainda hoje não sei qual a razão porque não cedi. Nos anos setenta, um colega passou a semana da Agrival a “massacrar-me” para investir na D. Branca, a “Banqueira do Povo”. “Excelente negócio”, dizia ele, “pois paga juros a 10% ao mês”. Para me convencer, mostrou-me um cheque do que dizia serem os juros do mês anterior. Não alinhei mas não sei se foi por medo, se por não acreditar no negócio, se por ele ter partido para outras bandas… Soube mais tarde que se tornara num dos angariadores da “Banqueira”…

Mas, aquilo que eu previ aqui há um ano sobre investimentos com juros de 10% ao mês (mais de 200% ao ano!!!) aconteceu. “Rebentou a bomba” e está para aí muita gente “a arder” e “com as calças na mão”. Por isso, aqui “assenta como uma luva” aquela expressão: “Eu bem avisei que era boi, mas eles insistiram em querer ordenhar…!!!”.

Não, não venho cobrar por isso e muito menos criticar aqueles que hoje vivem momentos de incerteza e preocupação sobre se irão ou não reaver o dinheiro investido. Não sou dos que dizem “é bem feito, foram gananciosos” ou outra coisa do género. De maneira nenhuma pois poderia também ser um deles.

Diz o ditado que “quando a esmola é grande, o pobre desconfia”. E devia desconfiar mas, como no ilusionismo, a atenção ficou concentrada na ilusão, neste caso nos juros altíssimos, bloqueou e não viu mais nada, nem mesmo a voz da razão. E nem quis ouvir até porque, “quanto maior é a mentira, mais fácil é acreditar nela”.

Tal como na D. Branca, estes casos terminam sempre da mesma forma: Com a falta de novos investidores e a impossibilidade de pagar os tais juros ou com a intervenção das autoridades. Pela imprensa, e pela voz do povo, sabe-se que intervieram estas, se bem que já havia investidores a queixarem-se de atraso nos pagamentos.

Existe uma cortina de silêncio que não deixa ver toda a extensão e gravidade do fenómeno, e percebe-se porquê. Em primeiro lugar há os que são dominados pelo sentimento da vergonha, de não quererem ser ridicularizados pelos amigos (?) e não só, que não deixarão de criticar “como é que caíste nisso”, como se eles fossem mais inteligentes. Depois, há os que estão no “negócio” há anos, guardaram os juros que receberam e por isso já estavam a “jogar em casa” e com ganhos. Estes, também vão ficar caladinhos, para que ninguém (a começar pelas Finanças) lhes venha perguntar pelos lucros não declarados… E há os mais recentes, que ainda não tiveram a oportunidade de receber juros, e os que os foram deixando lá com o capital para que “rendesse” mais, que vivem na esperança de voltarem a ver a cor do seu dinheiro, tantas vezes as economias de uma vida de trabalho e que, em nome dessa esperança, continuam em silêncio e à espera.

O drama coloca-se mais para uns do que para outros, não se sabendo quantos são os “investidores” nem os montantes envolvidos, sendo que se fala de grandes quantias só nos concelhos de Lousada e Felgueiras, o centro nevrálgico deste negócio de capitais, dizendo-se que há mesmo quem tenha contraído empréstimos para aplicar o dinheiro num “sonho”, que pode “virar” pesadelo.

A “bomba” rebentou há poucos dias, pelo que há que aguardar para ver as consequências. É preocupante para muita gente, a começar pelos “angariadores” que deram a cara perante muitos clientes, a troco de um percentual nos juros. E agora? Quem é o responsável?

Ao que me dizem, parece que já existem por aí outros esquemas mais ou menos semelhantes, com “promessas” de juros ainda mais altos, e que estarão a fazer “o seu caminho”, encontrando na ganância inata dos seres humanos o terreno fértil para crescer. Como é possível, apesar deste “estoiro” e dos avisos?

Uma palavra para todos aqueles que, fruto de tais investimentos, se encontram em situação difícil. Que isto lhes sirva de lição de vida para não voltarem a “apostar” em falsos profetas. E que não sejam tentados a atos tresloucados (já soube de um caso) pois não é solução para nada. Há que enfrentar as consequências e seguir em frente, de cabeça levantada.

Que uma perda de dinheiro neste investimento, ilegal e falhado, não se transforme também numa perda maior. Se para a perda do dinheiro há sempre a possibilidade de se vir a ganhar outro ao longo da vida, já para a perda desta não haverá tempo nem meios para a conseguir recuperar…

E, GRANDE, não é aquele que nunca caiu, mas sim aquele que foi ao chão e se conseguiu levantar, por maior que fosse a pancada…

Leave a Reply