Terceira idade

A melhoria das condições de vida em geral e dos cuidados de saúde em particular tem aumentado a esperança de vida e, por isso mesmo, tem promovido um crescente envelhecimento da população, prevendo-se que dentro de uma década os números passarão a ser muito preocupantes.

Entrar na terceira idade é entrar no princípio do fim da existência o que, por si só, já traz uma carga de infortúnios, como as limitações físicas, perda de audição, visão, memória, raciocínio e outras, havendo ainda os que são atormentados com aspectos transcendentais e espirituais. E o pior é que muitas vezes atravessam essa porta solitários, sem apoio nem amparo dos familiares.

O ritmo de vida atual afasta a família dos idosos, para quem passam a ser um fardo, alguém a quem não podem dar atenção, muitas vezes para quem não têm espaço, nem na casa nem no coração e, por isso, sentem-se marginalizados. Já Chateaubriand dizia que “outrora a velhice era uma dignidade, mas hoje é um peso”.

O envelhecimento da população associado à evolução da vida da sociedade e à alteração da estrutura da família tem como consequência um aumento da procura de instituições da terceira idade.

Quando um idoso tem família e é institucionalizado, tende a sentir-se revoltado, só e insatisfeito, afastado do seu meio e da suas ligações sociais. É verdade que, embora ainda raros, já há aqueles que por iniciativa própria se mudam para um lar, assumindo um resto de vida com autonomia dos filhos e uma não ingerência nas suas vidas. Na realidade, os lares são uma das grandes respostas às necessidades dos idosos nos dias de hoje, numa sociedade onde lhes falta espaço e valorização.

Vem isto a propósito dos lares a que estou ligado na Santa Casa da Misericórdia de Lousada e onde constato factos, comportamentos de familiares e utentes, presença ou esquecimento de uns e alegria ou desengano de outros. Há muitos e bons exemplos de filhos, outros familiares ou simplesmente amigos, que se preocupam com o bem estar do idoso, são visitas assíduas, um apoio constante. Deus os abençoe por essa dádiva.

Em contrapartida, alguns idosos são simplesmente “despejados” no lar pela família, muitas vezes depois de completamente “despojados” dos bens que angariaram ao longo de uma vida, e votados ao esquecimento. E a instituição que tome conta deles, que é sua obrigação. Sendo um princípio da Misericórdia de que “ninguém é descriminado na admissão pela sua condição económica”, somos confrontados com familiares a escamotearem os bens para que o ónus do custo passe para a Santa Casa. E depois de “despachado” para o lar, rapidamente se desligam, deixam de aparecer e remetem-no ao esquecimento, aliviados que estão do “fardo”.

Lembro-me daquela filha que ao ser-lhe comunicada a morte do pai e o dia do funeral disse não ter tempo para tal pois tinha de tratar do seu casamento ou dos herdeiros que nunca quiseram saber da mãe, mas que apareceram para brigar por uns brincos. Dizia-me um utente, já de idade avançada, marcado por estes abandonos: “Sabe, os filhos esperam algo de nós mas nós nada podemos esperar deles”. Não conseguindo substituir de todo a casa da família, os Lares são um porto de abrigo, a segurança no entardecer e o evitar de um dos maiores castigos do ser humano que é o envelhecer e morrer sozinho.

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