Os topónimos são os nomes de um lugar, sítio ou povoação e as suas origens são muito diversas, a partir do latim, do grego ou do árabe, com nomes de pessoas, árvores, plantas, rios e até mesmo relacionados com o relevo e acidentes do solo e outros.
Foi assim que, ao longo de séculos, surgiram os nomes dos países, regiões, cidades, vilas, aldeias e lugares, que serviram de referência a gerações e gerações, num processo sempre evolutivo. Só que essa evolução natural virou há pouco tempo entre nós em obrigação legal, para fazer face às exigências da modernização tecnológica e não só.
Como consequência disso, nas zonas rurais, como é o caso de Lousada, os lugares e caminhos da nossa infância tiveram de ser promovidos a ruas, avenidas, becos ou vielas e batizados, com a atribuição dos chamados “números de polícia”, processo esse que trouxe incómodos e prejuízos a muita gente porque, a partir de certa altura os CTT deixaram de entregar a correspondência que não tivesse o novo endereço completo. Ainda hoje há quem esteja a ser penalizado por isso.
Se nos núcleos urbanos a maioria das vias já tinha designação, as grandes alterações verificaram-se principalmente nas freguesias rurais onde, regra geral, era o lugar e não a rua, que era rei e senhor. E foi aí que houve alterações significativas, algumas efectuadas com ponderação enquanto outras foram feitas de forma que não lembraria ao diabo.
Foi com agrado que vi que a designação de muitos dos lugares da minha meninice foi mantida, embora alterando o lugar para rua. Sinal de bom senso, de respeito pelo passado, de preservação das memórias e do seu significado para muita gente. Só não percebi porque é que alguns desses caminhos, que não passam de vielas, pomposamente passaram a chamar-se avenidas.
Em contraponto, foi com tristeza que vi desaparecer os nomes de muitos outros lugares da minha infância, referências do meu passado, para serem substituídos por nomes de pessoas sem qualquer sentido.
Pensava que a toponímica nominal era para honrar e perpetuar figuras que, por uma ou por outra razão, se destacaram na sociedade, cultural, social ou desportivamente. Mas não, alguns autarcas fizeram tábua rasa deste princípio, “apagaram” o histórico do lugar, batizando as “novas” ruas com nomes de pessoas que, na sua maioria, nada fizeram por ninguém, nalguns casos mesmo que o seu registo devia ser apagado da nossa memória coletiva tal foi o seu mau contributo à sociedade, talvez tendo como únicos critérios o facto de terem existido ou de serem da família.
Mas tudo isto vem a propósito de alguém que, esse sim, merece que o seu nome não seja esquecido pelos lousadenses, pelo muito que ajudou pessoas e empresas desta terra, no recato do seu gabinete.
Homem simples e de excelente trato, José Francisco Neto, mais conhecido por senhor Neto das Finanças, soube humanizar uma função e um cargo que, regra geral, é visto pela população com respeito e algum terror.
Recebia de igual modo ricos e pobres e para as dificuldades de cada um procurava encontrar a solução mais adequada à sua condição de contribuinte, protegendo-o o mais possível, sem esquecer a sua responsabilidade para com o estado.
Muitas empresas mantiveram-se em atividade porque ele soube encontrar o equilíbrio entre a ação fiscal e a precária capacidade de cumprimento daquelas, e muito mais contribuintes individuais encontraram nele a saída para o seu problema, dentro do quadro legal.
Trabalhou alguns anos mais para além da idade da reforma e, paradoxalmente, a doença que o vitimaria manifestou-se de forma violenta no seu último dia de trabalho, roubando-lhe o direito ao gozo de uma merecida aposentação.
Um grupo de cidadãos que o não esqueceram irão prestar-lhe no dia 7 de Julho o seu tributo, através de uma missa na Capela do Senhor dos Aflitos e de romagem ao cemitério, relembrando a sua pessoa e o Homem. Ainda bem que há quem tenha memória.
Embora pareça banalizada a toponímica pelo que atrás referi, ainda penso que o batismo de uma rua com o nome de alguém é uma homenagem e uma forma de honrar a sua memória, a memória, como dizia Camões, “daqueles que por obras valorosas se foram da lei da morte libertando”. E o senhor Neto das Finanças merece-o bem.