Para qualquer animal, a sua maior prioridade é conseguir alimento necessário para sobreviver e evitar ser comido pelos predadores que lhe estão acima na cadeia alimentar através da fuga. Para isso precisa de ser bom corredor, voar depressa, saber esconder-se, nadar bem e ter sempre um olho a vigiar os perigos. É o instinto de sobrevivência a determinar os comportamentos que favorecem a conservação da espécie, onde ainda se inclui o acasalamento e construção de ninhos. Mas para nós, seres humanos, depois de satisfeitas as necessidades básicas de sobrevivência, que são semelhantes às dos outros animais, temos necessidades complementares que são próprias da evolução mental, tais como ser reconhecido, valorizado e sentir-se importante. Diz-se mesmo que a necessidade humana de ser importante é mais forte do que qualquer das necessidades fisiológicas, como alimentar- se ou receber amor. Com os outros animais não há essa preocupação pois o instinto de sobrevivência é-lhes suficiente. Mas, já nos seres humanos, o “sentir-se importante” é uma necessidade que nasce e morre connosco. Foi esse desejo que levou um pobre iletrado que trabalhava num armazém, a estudar livros de direito que encontrou no fundo de um barril de coisas descartadas e que havia comprado por 50 centavos, por boas razões. Seu nome era Lincoln e tornou-se no maior presidente dos Estados Unidos da América.
A história está repleta de pessoas que lutaram para ser importantes: George Washington queria ser chamado “O poderoso presidente dos Estados Unidos”; Cristóvão Colombo pediu o título de “Almirante do Oceano e Vice-Rei da Índia”; A rainha Catarina, a Grande, recusava-se a abrir cartas que não a referissem como “Sua Majestade Imperial”; e o escritor Vítor Hugo aspirava ver a cidade de Paris a receber o seu próprio nome, para o homenagear.
Nos dias de hoje, a importância de “sentir-se importante” é o que, em geral, move as pessoas, define os objetivos e redefine o encanto dos relacionamentos. A importância passou a estar mais no “ter” do que no “ser”. Porque é que que ela precisa ter o telemóvel melhor do que o seu? E o carro mais novo e maior? De ter o filho mais inteligente e o marido mais bem-sucedido, rico e apaixonado? Porquê? Para você perceber o quanto ela é melhor que você? E para quê? Para que é que alguém está sempre à procura de provar a sua superioridade, quase sempre em coisas fúteis? Essa necessidade de sentir-se importante é o que faz com que as pessoas comprem artigos de luxo, carros de marcas consagradas e exclusivos, joias únicas e caras, telemóveis de última geração e casas de luxo com tanta divisão que uma boa parte não chega a ser utilizada. Tudo isso não passa de manifestação de superioridade e afirmação perante os outros, expressa nas roupas que vestem, nos sapatos que calçam, nos restaurantes onde comem (e no que comem), em tantas coisas onde pretendem ser exclusivos, únicos, com acesso a bens, serviços e locais de uso e entrada só para alguns. E há quem faça mesmo tudo e de tudo para ser um deles …
Todos querem receber atenção e, se possível, atenções especiais que os ponham em destaque em relação à multidão. Os estabelecimentos comerciais e industriais, dos restaurantes às lojas de roupa e calçado, dos standes de automóveis às perfumarias ou joalharias, para terem sucesso tratam os clientes pelo nome próprio, elogiam-lhe o gosto e as escolhas, fazem-no crer o cliente mais importante informando-o “em primeira mão” do novo modelo que chegou e sobre o qual ele vai ter prioridade na aquisição. O cliente que sai da loja a sorrir e com o ego em alta, nunca vai de mãos vazias. Quem pode ir embora vazia é a carteira, mas o “banho de autoestima” vale bem o preço que se paga. É que, o ser tratado como importante, reconhecido como pessoa de bom gosto e valorizado pelo que faz, usa ou diz não tem preço, pois satisfaz uma necessidade básica de (quase) todo o ser humano deste tempo.
Está provado que até para a formação de gangues de rua o principal fator de motivação é a necessidade de se sentir importante. E apesar de isso acontecer de forma negativa, não deixa de ser uma afirmação de quem quer ver-se reconhecido e valorizado, ainda que seja por ser o maior bandido do bairro ou da cidade, algo que é designado pelos especialistas como “reconhecimento negativo”. Já alguém dizia que, “bem ou mal, o que é preciso é que falem de mim”.
Provavelmente, é essa necessidade de querer ficar na História em grande ainda que por razões negativas, que move Putin.
Tanto a compra como a venda de reconhecimento estão disponíveis no mercado em milhentos produtos e formas de vida, mas cada um de nós tem o poder de escolher se quer entrar nessa corrida à fama (boa ou má) a qualquer preço, seja nas redes sociais ou através de colunistas sedutores, seja por se ter o automóvel mais exclusivo – e caro do mercado – ou a vivenda mais luxuosa, vista e badalada nas revistas da especialidade, seja no acesso ao poder que transforma rapidamente a pessoa humilde em convencida e arrogante e que lhe confere quase sempre uma “auréola de divindade” para viver uma notoriedade transitória, que tantas vezes tem um custo financeiro e emocional demasiado pesado. Mas, já alguém disse que “mais vale viver um dia governando do que toda uma vida servindo” e há quem aposte nisso a todo o custo.
Buda avisou-nos sobre tudo isso: “Um homem será tolo se alimentar desejos pelos privilégios, promoções, lucros ou pela honra, pois tais desejos nunca trazem felicidade e, pelo contrário, só podem trazer sofrimento”. Mas uma coisa são estes e outros conselhos de uma vida simples e desprendida e outra coisa é essa atração terrível de se ser o mais badalado do bairro, cidade ou país, adulado (e nem sempre com a melhor das intenções) e idolatrado pelo maior número de fãs como se isso fosse durar para sempre e possa colocar alguém num pedestal bem acima do cidadão comum, onde ganha o direito exclusivo e único de apanhar em cima umas “cagadelas dos pássaros”. E os cemitérios fazem o resto, “enterrando” toda essa importância com “o corpo do delito” …