Um preço que temos de pagar…

Neste enorme tabuleiro de xadrez que é o mundo nós, cidadãos comuns, não passamos de peões para ser “comidos” em qualquer movimento das “peças” que dominam o “tabuleiro”. Somos a “carne para canhão” que alimenta guerras mas não faz parte da história. Não passamos de cobaias usadas nas mais diversas experiências, de produtos que vão desde medicamentos a alimentares, de pesticidas a cosméticos, de domésticos a industriais, sem estarmos conscientes das consequências do seu uso.

Como noutros tempos e com outros produtos químicos, a imprensa tem-nos “vendido” a teoria de que agora é o “glifosato” o alvo a abater, considerado pela OMS como “uma substância com potencial cancerígeno”. E levantam-se vozes de quem esteve calado durante quarenta anos a assistir à utilização deste herbicida, até agora tido como um milagre para a agricultura no combate a ervas perenes, aquelas que são mais difíceis de eliminar, acreditando piamente na ausência de perigo para a saúde pública proclamada pela Monsanto, a multinacional que criou o produto e teve o exclusivo da sua comercialização enquanto a patente foi válida. Sejamos francos e acabemos com a hipocrisia e a ilusão de que a utilização da maioria destes e outros produtos químicos não tem um preço a pagar, porque tem, e às vezes é demasiado grande para nós seres humanos. Mas isso é secundário perante os grandes interesses.

O DDT foi um dos pesticidas mais vendidos no mundo, ajudou a salvar milhões de pessoas e até serviu para nos matar os piolhos quando eu era criança. Até ao dia em que a bióloga americana Rachel Carson denunciou a poluição e os perigos do pesticida, no seu livro Primavera Silenciosa, ponto de partida para a criação dos movimentos de defesa do meio ambiente. Na sua luta, só anos depois da sua morte a poderosa indústria química americana foi vencida e o produto retirado do mercado. Mas outros vieram para o substituir como sendo melhores, mais inofensivos para tudo e todos, novas gerações de produtos e, não tenhamos ilusões, o tempo acabou e vai acabar por denunciar os perigos do seu uso. E a ganância é tal que, sempre que um produto como o DDT é retirado do mercado, os seus utilizadores compram-no “às carradas” para o armazenarem e poderem utilizar muito para além da sua proibição, indiferentes às consequências da sua aplicação em produtos agrícolas e nos efeitos para o ser humano. Vi isso quando foi proibida a comercialização do “aldrin”, um inseticida para combater especialmente o “alfinete” que ataca batatas, cenouras e outras culturas. Quando se soube que ia ser retirado do mercado, os agricultores que o costumavam usar acorreram aos locais de venda e compraram todo o produto que havia, esconderam-no e utilizaram-no ao longo de vários anos e enquanto tiveram, indiferentes às razões da proibição. E se fosse só com esse…

Hoje os produtos químicos entram na nossa vida (e na nossa boca) com uma intensidade e frequência tal, que nem nos passa pela cabeça a dimensão do problema. E, quem deveria estar vigilante, cala-se ou demite-se da suas funções e só quando acontece um caso mediatizado é que acordam (e nos fazem acordar). Por alguma razão se diz que “o ignorante vive feliz”. E nós somos e vivemos como tal… Senão, vejamos: Os médicos dizem que o peixe é bom para a nossa saúde e por isso o recomendam. E nós comemos… Só não sabemos é que muito dele, especialmente o de aquacultura, pode ser bom para nos arranjar problemas de saúde por conter doses elevadas de químicos perigosos, quer pelas águas onde são criados quer, especialmente, pelas rações com que são alimentados. Na Suécia, as peixarias informam os clientes quando o peixe é proveniente do mar Báltico, alertando-os de que só o devem comer uma a duas vezes por mês pelos riscos que representam para a saúde. Eles sabem como aquele mar é poluído, até com materiais radioativos da famigerada central nuclear de Chernobyl. E isso talvez explique a razão pela qual grande parte do peixe capturado nesse mar seja destinado à indústria de farinhas… para alimentar peixes de aquacultura… que nós comemos sempre que temos dinheiro para o comprar…. E vai dar tudo ao mesmo…

De vez em quando a comunicação social dá realce a um “produto perigoso”, como é o caso do “glifosato”, “vendo a árvore mas esquecendo a floresta” de outros produtos, tanto ou mais perigosos, que diariamente são utilizados na produção daquilo que consumimos. O drama, é que estamos “entalados” por um lado, pela grande força das multinacionais que controlam a produção e comércio de pesticidas e outros produtos e cuja influência sobre técnicos, políticos e países é mais que conhecida e, por outro, pela noção que, sem o controle químico das pragas e doenças, metade da população mundial poderá morrer à fome por falta de alimentos. Daí que, há quem opte pelo “mal menor”… o que para alguns, poucos, se torna num “bem maior”, o “preço a pagar”. E, quem paga, somos nós, os “carneiros”, não os “pastores”…

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