Precisamos de ir ainda mais além …

Dia sim, dia sim, os casos acontecem, uns a seguir aos outros, cada dia mais chocantes. E ficamos a perguntar-nos: como isto é possível? Um casal morava numa das freguesias do nosso concelho e, por razões pessoais, teve de se mudar para o Algarve, carregando consigo a família, os móveis e os trastes. Mas, para trás deixou uma pequena cadela, abandonada à porta de casa como “lixo sem utilidade”. E o pequeno animal, fiel aos seus donos, ficou por ali à espera que eles regressassem, acreditando que eles não a trairiam e iam voltar como sempre voltaram. Mas eles não regressaram para a vir buscar, dar-lhe de comer e até brincar, embora ela permanecesse junto de casa, esperando. Como se não bastasse o abandono, os vizinhos sempre que a viam escorraçavam-na à pedrada, umas vezes sem lhe acertar, mas outras atingindo-a com mais ou menos gravidade. Numa das ocasiões, um deles conseguiu encurralá-la e deu-lhe pontapés atrás de pontapés até se fartar, criminosamente, para descarregar a sua fúria, raiva e a maldade escondida no ser humano. Até que, alguém consciente, dando conta do caso, comunicou-o a um responsável da Associação Lousada Animal, tendo de imediato duas voluntárias se deslocado ao local para recolher aquele pequeno animal indefeso. E depararam-se com uma cadelita extremamente dócil, ferida de lado, que se sentava e dava a pata tremendo toda nos quartos traseiros. Como sempre, foi conduzida à clínica veterinária onde foi observada, e tratada, ficando para mais tarde uma intervenção cirúrgica. Mas há histórias tristes que acabam por ter um final feliz e esta é uma delas, pois, felizmente, ainda há muitos humanos que trazem ao de cima o seu lado bom. Colocada a sua história e fotografia nas redes sociais, rapidamente uma família se dispôs a adotá-la, “agradecendo por poder vir a fazer parte da vida da cadelita”. Como esta, há centenas ou milhares de histórias que, na comparação entre os ditos “animais de estimação” e os seres humanos, nada dignificam estes. 

Quem vai a um canil público ou um abrigo privado de animais, ouve histórias atrás de histórias como a do rafeiro preto que os pais deram ao filho porque ele pediu muito, para um mês depois ser largado bem longe porque sujava a casa, roía a mobília e molhava ao redor do bebedouro. E dava trabalho. E outro, quando começou a dar despesa no veterinário. E muitos outros por largarem pelo que não deveriam ter. E por razões absurdas, de quem arranjou um animal por impulso sem pensar na responsabilidade que se assume (ou deveria assumir) quando se adota um. E abandona-se, ignorando o sofrimento desse animal – porque eles sofrem como nós – enchendo abrigos públicos e privados. Por isso, ao entrarmos num canil, ouvimos uma multidão de cães a ladrar atrás das grades e os seus olhos dizem o que sentem: que precisam de uma casa, de um dono que lhes dê afeto e cuidados. E que não os traia. Porque se eles pudessem escrever as suas crónicas como eu, que diriam? 

Como sociedade, evoluímos muito no cuidar dos nossos animais, mas ainda temos muito caminho a percorrer. Ainda há quem pense que, por dar comida e água a um animal já o está a tratar bem. Será? Às vezes passava por um determinado local onde há um terreno vedado. Amarrado a um cadeado preso com uma argola a uma verguinha de ferro com seis metros de comprimento estava um cão. Podia andar de um lado para o outro nessa distância de seis metros, fazendo deslocar a argola e o cadeado que o prendia, mas nada mais que isso. Tinha alguma comida que o dono lhe deitava na pia, quando lá ia, dia sim dia não, ou de dois em dois, três em três dias ou mais. Ninguém mais. E tinha um bidão velho, ferrugento, como abrigo, para não apanhar com a chuva toda quando chovia. Imagino a solidão do pobre animal. Sendo uma criatura sociável, não gostava de viver sozinho. Mas o dono pensava que ele estava bem tratado, se pensava. Então, o que pensaria o dono se fosse acorrentado a uma parede, dia após dia, tendo de urinar e defecar a poucos metros do lugar onde dormia, convivendo dia e noite com o cheiro das fezes e da urina (e o olfato deles é muito mais sensível)? Em qualquer parte do mundo seria considerado desumano. 

Todos (ou quase todos) consideram bonito ter um animal de estimação. Como qualquer ser vivo, necessitam de cuidados e carinho. E depois? Muitos são maltratados e votados ao abandono em estado crítico, debilitados, com ferimentos graves ou completamente fragilizados. Então, há os que são recolhidos pelos serviços públicos, porque têm a obrigação, e por voluntários, porque têm vocação e devoção à causa. E recebem cuidados adequados e a chance de voltar a acreditar nos seres humanos. E os restantes?

Para irmos mais além, precisamos de duas coisas: por um lado, como os animais não podem falar nem comunicar, que cada um fale e comunique por eles, denunciando sempre que souber ou presenciar alguma cena de maus-tratos a qualquer tipo de animal. Por outro, os voluntários e suas associações precisam da ajuda de todas as pessoas comprometidas, através de doações em dinheiro, rações, tapetes higiénicos, medicamentos, produtos de limpeza, caminhas, etc. E há sempre lugar para mais voluntários. E, no caso da Associação Lousada Animal, de famílias de acolhimento temporário para animais recolhidos até à adoção, por não dispor de abrigo. É que, cada gesto de solidariedade representa uma nova chance para um animal que sofreu, mas que ainda merece conhecer o verdadeiro significado de cuidado e pertencimento. E que ainda há um lado humano entre os humanos …Dia sim, dia sim, os casos acontecem, uns a seguir aos outros, cada dia mais chocantes. E ficamos a perguntar-nos: como isto é possível? Um casal morava numa das freguesias do nosso concelho e, por razões pessoais, teve de se mudar para o Algarve, carregando consigo a família, os móveis e os trastes. Mas, para trás deixou uma pequena cadela, abandonada à porta de casa como “lixo sem utilidade”. E o pequeno animal, fiel aos seus donos, ficou por ali à espera que eles regressassem, acreditando que eles não a trairiam e iam voltar como sempre voltaram. Mas eles não regressaram para a vir buscar, dar-lhe de comer e até brincar, embora ela permanecesse junto de casa, esperando. Como se não bastasse o abandono, os vizinhos sempre que a viam escorraçavam-na à pedrada, umas vezes sem lhe acertar, mas outras atingindo-a com mais ou menos gravidade. Numa das ocasiões, um deles conseguiu encurralá-la e deu-lhe pontapés atrás de pontapés até se fartar, criminosamente, para descarregar a sua fúria, raiva e a maldade escondida no ser humano. Até que, alguém consciente, dando conta do caso, comunicou-o a um responsável da Associação Lousada Animal, tendo de imediato duas voluntárias se deslocado ao local para recolher aquele pequeno animal indefeso. E depararam-se com uma cadelita extremamente dócil, ferida de lado, que se sentava e dava a pata tremendo toda nos quartos traseiros. Como sempre, foi conduzida à clínica veterinária onde foi observada, e tratada, ficando para mais tarde uma intervenção cirúrgica. Mas há histórias tristes que acabam por ter um final feliz e esta é uma delas, pois, felizmente, ainda há muitos humanos que trazem ao de cima o seu lado bom. Colocada a sua história e fotografia nas redes sociais, rapidamente uma família se dispôs a adotá-la, “agradecendo por poder vir a fazer parte da vida da cadelita”. Como esta, há centenas ou milhares de histórias que, na comparação entre os ditos “animais de estimação” e os seres humanos, nada dignificam estes. 

Quem vai a um canil público ou um abrigo privado de animais, ouve histórias atrás de histórias como a do rafeiro preto que os pais deram ao filho porque ele pediu muito, para um mês depois ser largado bem longe porque sujava a casa, roía a mobília e molhava ao redor do bebedouro. E dava trabalho. E outro, quando começou a dar despesa no veterinário. E muitos outros por largarem pelo que não deveriam ter. E por razões absurdas, de quem arranjou um animal por impulso sem pensar na responsabilidade que se assume (ou deveria assumir) quando se adota um. E abandona-se, ignorando o sofrimento desse animal – porque eles sofrem como nós – enchendo abrigos públicos e privados. Por isso, ao entrarmos num canil, ouvimos uma multidão de cães a ladrar atrás das grades e os seus olhos dizem o que sentem: que precisam de uma casa, de um dono que lhes dê afeto e cuidados. E que não os traia. Porque se eles pudessem escrever as suas crónicas como eu, que diriam? 

Como sociedade, evoluímos muito no cuidar dos nossos animais, mas ainda temos muito caminho a percorrer. Ainda há quem pense que, por dar comida e água a um animal já o está a tratar bem. Será? Às vezes passava por um determinado local onde há um terreno vedado. Amarrado a um cadeado preso com uma argola a uma verguinha de ferro com seis metros de comprimento estava um cão. Podia andar de um lado para o outro nessa distância de seis metros, fazendo deslocar a argola e o cadeado que o prendia, mas nada mais que isso. Tinha alguma comida que o dono lhe deitava na pia, quando lá ia, dia sim dia não, ou de dois em dois, três em três dias ou mais. Ninguém mais. E tinha um bidão velho, ferrugento, como abrigo, para não apanhar com a chuva toda quando chovia. Imagino a solidão do pobre animal. Sendo uma criatura sociável, não gostava de viver sozinho. Mas o dono pensava que ele estava bem tratado, se pensava. Então, o que pensaria o dono se fosse acorrentado a uma parede, dia após dia, tendo de urinar e defecar a poucos metros do lugar onde dormia, convivendo dia e noite com o cheiro das fezes e da urina (e o olfato deles é muito mais sensível)? Em qualquer parte do mundo seria considerado desumano. 

Todos (ou quase todos) consideram bonito ter um animal de estimação. Como qualquer ser vivo, necessitam de cuidados e carinho. E depois? Muitos são maltratados e votados ao abandono em estado crítico, debilitados, com ferimentos graves ou completamente fragilizados. Então, há os que são recolhidos pelos serviços públicos, porque têm a obrigação, e por voluntários, porque têm vocação e devoção à causa. E recebem cuidados adequados e a chance de voltar a acreditar nos seres humanos. E os restantes?

Para irmos mais além, precisamos de duas coisas: por um lado, como os animais não podem falar nem comunicar, que cada um fale e comunique por eles, denunciando sempre que souber ou presenciar alguma cena de maus-tratos a qualquer tipo de animal. Por outro, os voluntários e suas associações precisam da ajuda de todas as pessoas comprometidas, através de doações em dinheiro, rações, tapetes higiénicos, medicamentos, produtos de limpeza, caminhas, etc. E há sempre lugar para mais voluntários. E, no caso da Associação Lousada Animal, de famílias de acolhimento temporário para animais recolhidos até à adoção, por não dispor de abrigo. É que, cada gesto de solidariedade representa uma nova chance para um animal que sofreu, mas que ainda merece conhecer o verdadeiro significado de cuidado e pertencimento. E que ainda há um lado humano entre os humanos …