A moda, os desfiles e eu. Ou não?

Ora, não sendo eu um apreciador da moda, sempre que sei e posso, gosto de ver o desfile da Victoria’s Secret. Não por usar lingerie, nem pelo balançar do traseiro das esguias modelos da casa, mas, “porque sim”. Só não consegui ver em direto porque a internet veio abaixo de tão sobrecarregada! E vá-se lá imaginar porquê! Também fiquei sem saber se essa visualização intensa foi maior por parte das mulheres, para estarem a par das últimas tendências da moda, ou dos homens, não com as mesmas intenções de interesse em relação à lingerie – a não ser, eventualmente, para ficarem a saber como a retirar mais depressa – muito mais interessados em apreciar a “paisagem” que é sempre agradável à vista. Por essa “capacidade de atração”, por ser “politicamente correto” e inclusivo, a marca, além dos seus “anjos”, fez desfilar ainda gente mais madura, como a cinquentonas Carla Bruni, Eva Herzigova e Kate Moss e, no final, a quase octogenária, Cher. É que, para dar resposta às críticas de que são alvo as grandes marcas nos últimos tempos por só fazerem desfilar na passerelle as chamadas “boazonas”, discriminando as baixinhas, fortes, gordas, deficientes, feias, narigudas, lésbicas, transexuais, travestis, gênero neutro e outras, passaram a incluir no “cardápio” todos os tipos de mulheres que, bem vistas as coisas, são a maioria. Por isso, hoje todas as boas marcas aderiram à chamada “inclusão” e metem nos desfiles gente que outrora nunca desfilaria, a meias com as tais “boazonas que são sempre a atração principal. Todas estas inclusões no mundo das passerelles, deram-me uma ideia: agora que eu estou reformado e afastado da vida ativa, pensei que poderia candidatar-me a modelo “inclusivo”, embora não seja um desejo íntimo. Se é pela idade, a Cher está praticamente no mesmo patamar etário, tal como umas quantas mais que se têm divertido nos últimos desfiles de moda. Porque não eu? Também tenho o direito a divertir-me. E aquele meio parece ser bom para isso. Sei que não tenho prática nenhuma destas andanças, mas tudo isso se aprende, haja vontade e estímulo. Não faltam para aí escolas de modelos, formações, cursos “on line” e estamos sempre a tempo, como o fez a sul coreana Choi Soon Hwa. Trabalhou como auxiliar de ação médica durante muitos anos até que, quando já tinha 72 anos, uma doente lhe disse que tinha todas as condições para ganhar a vida como modelo. E foi assim que passou a praticar em casa a arte de desfilar na passerelle, sozinha e sem ter nenhuma orientação particular de profissionais. Já tinha 80 anos quando se candidatou e foi aceite no Concurso Miss Universo da Coreia do Sul, aproveitando o facto de terem acabado com o limite máximo de idade para participar, até aos 28 anos, e com o não acesso a mães solteiras. Surpreendentemente, ganhou o prémio de melhor vestido. No meu caso, ninguém me disse que tenho condições para ganhar a vida ou divertir-me como modelo e podem também ficar descansados que não vou ganhar o prémio do melhor vestido …

Sei bem que os desfiles femininos são mais apelativos “à vista” do que os masculinos e têm muito mais mercado. Se têm! Tal como não me parece que as modelos “inclusivas” tenham a capacidade de atração de outras, como os “anjos” da Victoria’s Secret, e não só para homens.

Vou ter de aprender a movimentar o corpo e a posar, pelo que tenho de me inspirar no portfólio dos consagrados e nos tipos de poses de modelos masculinos que ficam ótimas e funcionam bem. Caminhar encarando a câmera, como se fosse apanhado de surpresa ou desviar o olhar, com passada vigorosa, alongando o pescoço e com o queixo para a frente, é das situações mais comuns que preciso treinar. Além disso, tenho de praticar os outros tipos de pose: na ação, relaxada, do olhar, do sorriso, das mãos, do estilo livre, dramático, sexy e sensual e a pose do casal a trabalhar com outro modelo. Espero que, quando vier a desfilar, não me rasguem as roupas, como fez a marca italiana Avavav na semana da moda de Milão em 2023 e, muito menos o que fizeram no desfile de 2024, quando entregaram ao público baldes de lixo pelo que, quando o desfile começou, as modelos foram recebidas com restos de papel, cascas de banana, garrafas e latas quebradas, ovos e até alguns líquidos. Até a criadora da marca não escapou e levou com um bolo na cara enquanto estava a agradecer ao público. A marca deixou ainda todos perplexos ao mostrar modelos que corriam pela passarela como se estivessem a fugir de alguém e com roupas malvestidas e descosidas. Ora isso já eu faço muitas vezes. Mas o expoente máximo disso aconteceu em Paris, onde uma passagem de modelos fez furor ao mostrar os homens de túnica bem curta e sem cuecas, com o “instrumento” à mostra. Se a “moda pega” por cá …                   

Só cá para nós, andei a treinar aqueles passos largos de como quem vai com pressa para apanhar o comboio, de olhos focados lá à frente, braços e mãos relaxados, a balançar e estava quase a apanhar-lhe o jeito. 

Mas, ao saber que 86-60-86 deixou de ser a fórmula perfeita das supermodelos da Victoria’s Secret, a marca das asas de anjo por onde passaram Cindy Crawford, Kate Moss, Linda Evangelista, Carla Bruni, Claudia Schiffer e a portuguesa Sara Sampaio, desisti dessa ideia, em protesto por acabarem com o conceito das “boazonas” e dos corpos perfeitos. É que não é justo, pois os homens, e as mulheres também, perderam algo com que sonhar …